desde que ninguém saiba… é pecado?


A princípio não venho aqui defender este raciocínio e muito menos implicar que de fato exista o pecado. Muito pelo contrário. Meu intuito é justamente refletir acerca deste ponto na vida do ser humano, coisa que parece numa rápida observação ter definido os princípios morais e éticos destes ao longo da história.

Pecado, se for analisado pela palavra, nada mais é do que aquilo que fazemos e que entra em desacordo com a divindade maior, em desacordo com os princípios regentes desta divindade que todos nós sabemos que é a religião no final das contas e não a divindade. Essa transgressão, dependendo do dogma tem resultados muitas vezes eternos e irreversíveis, principalmente se você estiver morto. Ao longo do tempo o peso de ter pecado com toda certeza diminuiu consideravelmente, visto que antes nem era a divindade que agia para corrigir o dano, eram as mãos do clero que ateavam fogo numa grande fogueira para churrasco dominical. Acredito que não seja necessário listar aqui as inúmeras transgressões que tornavam o indivíduo apto a ser torturado das formas mais perversas possíveis. Vale ressaltar que os dez mandamentos eram só uma forma de ver a coisa toda, se observarmos num contexto histórico e não cabalístico, onde esses mandamentos coordenavam os princípios morais e éticos de um povo numa época e que perdura por milênios até hoje. O fato da religião mais popular do mundo ser a que prega que pecado exista com toda certeza tem tudo a ver.
De algum modo o pensamento da condição de pecador e de não pecador vem por uma simples via: ele cometeu ou comete algo pelo qual ele mesmo se recrimina. A culpa é o principal elemento da condição de se sentir pecador. Em suma e tendo em mente o controle de massas, a noção de pecado é muito válida para ensinar a quem não tem facilidade em aprender que existem limites no que se faz, e que anarquia só é bonita mesmo na teoria. Pecado assim, antes de mais nada, é um cabresto e funciona sem que se necessite de atestado médico. Mas antes que se imagine que esse cabresto fora desenvolvido com o intuito de tornar nossas vidas mais pacífica pensemos que o único objetivo era que um povo controlado rende mais do que um povo disperso em passeatas e manifestações ou em suas diversões mundanas. Claro que esse não é o único motivo, isso nem parece um motivo na verdade. O real motivo era subjugar todos aos caprichos de uma divindade, ou melhor, de um dogma conduzindo o povo a permanecer subservientes e caridosos para com a instituição religiosa vigente. Isso ainda ocorre até hoje e não parece que será diferente nunca.
O curioso de fato nessa história é que o estado de pecador não atinge somente os crentes, os fieis. Estranhamente este modus operandis foi incutido no inconsciente de todos ao longo da história de uma forma tão bem feita que até mesmo os contraventores mais típicos – satanistas de Orkut, fãs das missas negras hollywoodianas, etc. – destas religiões supracitadas sofrem calados. O que mais indica isso que afirmo é o fato de que todo argumento destes é trabalhado com o intuito único e exclusivo de denegrir tais religiões. Isso no fundo parece mais efeito dos sentimentos feridos destes, da culpa incrustada no âmago reprimido destes seres. Claro que todo movimento determinado como certo por meio da “força” gera mais cedo ou mais tarde um movimento contrário. O curioso é notar que os dois lados disputam uma piscina de lama no final das contas.
De um modo rápido implico que independente da existência ou não de um Jesus na história da humanidade, este em nenhum momento conduz os seres humanos ao estado de pecador. As suas poucas palavras, todas elas não escritas por ele, denotam a vida reta e justa por um paraíso na terra entre os filhos de D’us. Sua sapiência demonstra que o amor é antes de mais nada algo transcendente e que torna o indivíduo mais apto a perceber a divindade que sempre está com este. Contudo o dogma eleva os pregadores – pastores, padres – à posição de juízes desta suposta divindade que nos observa. Eles parecem que gostaram do ato de apontar o dedo e “incriminar” diante das posturas celestes o indivíduo. Sendo assim o paraíso na terra já deve estar sitiado e com taxas mil de pedágio só para alcançá-lo. É assim que volto meu olhar para o resto de toda a criação e riu calado.
Sendo assim, se ninguém sabe… ainda é pecado? Por tudo que exemplifiquei aqui o pecado detém sua força no próprio pecador. Este é quem mais investe em seu próprio tormento. E é este tormento que levará mais cedo ou mais tarde os contraventores citados anteriormente subirem ao púlpito de um templo cristão qualquer para contarem suas histórias: “Pessoal! Eu já fui satanista, mesa preta e branca, macumbeiro, voodoozeiro e ladrão. Quase matei, estuprei. Bati em velhinhos no asilo e já fui pra prisão. Hoje estou salvo! O espírito santo me libertou!” Curiosamente haverá um levante da plateia: “Aleluia Irmão!”. E este, neste exato momento encherá o peito de esperança pelo ticket vip do paraíso e provavelmente uns descontos nos pedágios. E levará o pregador às lágrimas incontidas: “Vamos agora orar pela alma deste filho de deus que hoje está livre das impurezas do mundo!”. É sempre assim… e este sentará junto a uma plateia cada vez maior no templo de adoração. Impelidos vez ou outra a doarem seus suados dinheirinhos nos saquinhos da congregação.
Por hora e para dar um ponto final a isso aqui o estado de pecador é uma escolha. Isso não significa em momento algum que estamos agora livres para fazer o que bem entendemos ou que a culpa sumirá em seguida. A liberdade é uma coisa complexa que muitas vezes parece não existir diante de tantas regras. O importante antes de mais nada e antes de qualquer outra direção na discussão é perceber que divindade alguma se importa pelo erro cometido por alguém. Deuses para serem de fato deuses estão além das condições humanas. Estes pouco se importam conosco. E é por isso que mesmo após o dito espírito santo da transformação descer sobre a cabeça de quem quer que seja, durante o sono à noite este não dormirá em paz. A culpa vai voltar à superfície em algum momento por agora não ter mais os gritos da plateia a disfarçarem sua presença. E com a cabeça pesada este viverá eternamente num verdadeiro inferno. Isso significa que a religião de algum modo percebeu essa condição do ser humano e soube aproveitar muito bem: a situação de que o ser humano uma vez em meio à culpa se torna o animal mais domesticável que existe. Portanto, antes de se considerar um pecador, olhe para o espelho e seja mais digno e mais verdadeiro aceitando o erro cometido e procurando atitudes reais para saná-lo.
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um adendo: certa vez num parque encontrei um fiel com uma bíblia na mão. Após algum tempo de conversa ele afirmou que no momento em que um assassino recebe o espírito santo, este não tem mais pecados. Foi quando perguntei a ele: o que a família que sofreu pela morte de um ente querido acredita que ele seja de fato? E agora complemento: o pecado sanado só tem valor de fato para a igreja. Na realidade isto não muda nada no que de fato importa. E pelo resto da vida este será culpado pelo erro que cometeu até um dia perceber que pra se redimir de fato com o que fez terá de encarar o erro de frente e não por meio de uma limpeza do nome diante do criador… Como se de fato estivéssemos recebendo estrelas pelo bom comportamento. Eu ainda vejo D’us rindo loucamente em algum canto do universo, rindo sem parar. Rindo muito por todas essas tolices ignóbeis que estes insignificantes seres humanos pensam. Rindo e assim sem conseguir escutar os lamentos dos culpados que nunca se cala, que nunca acaba. E isso sim é de fato um inferno…

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Respostas de 12

  1. Muito bom o texto. Parabéns.
    Esse adendo representa de forma clara o que eu nunca conseguia entender na religião católica e evangélica, como uma pessoa que tinha cometido atrocidades só pq se converteu tava livre de seus crimes.
    Nas sessões espiritas que participo um irmão de luz falou uma vez que existem 3 perdões:
    O divino; o da pessoa(s) a que se fez mal e o próprio (que vem da alma).
    Ele explicou que o primeiro é o mais fácil de conseguir pois todo bom pai perdoa o filho ( mas isso não que dizer que ele não coloque de castigo);
    O segundo e difícil mas pode se conseguir, afinal algumas pessoas acabam deixado a dor de lado e perdoam;
    O ultimo perdão que é mais difícil, pois nosso consciente pode perdoar mas nossa alma guarda e sofre até o dia que passa para o outro lado e lá toma real ciência de seus atos e o que isso causou para outras pessoas.
    Abraços
    Andre

  2. Eu gosto de duas ideias acerca do pecado:
    A primeira vem da etimologia e diz simplesmente que “pecar é errar o alvo”. Isso pressupõe que havia um alvo, um objetivo a ser alcançado.
    A segunda vem do espiritualismo e diz que “somos ao mesmo tempo o juiz e o escravo de nossa própria causa”. Isso significa que o maior tribunal e o maior julgamento já ocorrem dentro de nossa própria consciência. E não há como fugir. Quanto maior o amor, mais dolorido é pecar. Porém, aqueles que erram o alvo e não se importam, é porque ainda estão nos primeiros degraus do amor, o grande objetivo!
    Abs
    raph
    @DjPes: Tinha respondido isso no face… mas vou colocar aqui minha observação sobre isso que você colocou Raph:
    pecar é desobedecer… é errar o alvo de fato, mas quem estabeleceu o alvo? O problema do termo pecar ou pecado é a forma como foi utilizado e não como poderemos encará-lo. Pra mim num contexto geral o que se implica como pecado é em suma perca de tempo. Pecado é tomar pra si que algo está determinando tipos de erros. E em consequência teremos tipos de correções.
    É interessante renovar os significados, mas muitas vezes isso só mascara a função básica de algo. O estado de ser pecador é antes de mais nada submissivo. Não há como de fato aplicar novo significado ao termo, já que para pecarmos, algo antes de mais nada está observando os atos e avaliando os mesmos, em suma é superior e comanda.
    Assim sendo a segunda implicação que vem do espiritualismo como foi colocado não parece ao meu ver falar de pecado. Fala antes de mais nada de consciência. Atos geram resultados. Ser consciente é aceitar para si a responsabilidade para com tais atos. Se implicarmos na questão consciência como implica-se na do pecado, este, pecador, antes de mais nada já delegou sua responsabilidade para alguma entidade superior, para que ela julgue por ele, livrando-se da responsabilidade de avaliar por si mesmo.
    Portanto pecar é aceitar que até para corrigir o erro o indivíduo já não serve mais. Ele precisa antes de mais nada reaver com a instituição ou a entidade maior sua posição de outrora – a de não pecador – por meio da redenção. E só assim ele estará apto a aceitar a consequência e renovar sua vida. Ser consciente, entretanto, é não precisar desse subterfúgio para corrigir o erro, ou mesmo perceber que cometeu o erro. Ser consciente é implicar que somos nós mesmos os responsáveis pelo ato como pela percepção do mesmo e pela correção. Ser pecador é delegar essa responsabilidade a qualquer outra coisa além de si mesmo e esperar calado o resultado, já que nem pra isso se serve mais.
    abraço pra ti também

  3. Como li esses dias em algum texto do site: não existe bem ou mal apenas a vontade de cada um. Então talvez o tal pecado não exista….

  4. Pecado é uma palavra mágica que faz com que os de mentes fracas deixem de cumprir o que se proporam fazer.

  5. Texto sensacional!!!
    Parabéns!!!
    É exatamente a minha concepção de pecado… costumo muito dizer que, espíritos que não evoluíram muito ainda permanecem no nível 1 do desenvolvimento, dos que têm MEDO de tudo e tem grande gana por GANHAR E TER coisas materiais. Essas, além de serem presas fáceis para os “pastores” de plantão, só conseguem ser boas e honestas com outras pessoas (e algumas até que conseguem ser consigo mesmas) com alguma religião que lhes sirva de “muleta”. Já vi inúmeros fanáticos cristãos, evangélicos e católicos, que, quando se deparam com um pensamento ou situação que abale ou coloque em xeque a veracidade de sua religião, transformam-se instantaneamente, ficando agressivas e hostis em relação à “ameaça”. Como uma típica reação de auto-preservação, de defesa.

  6. Talvez ser capaz de “pecar” e não sentir, ou perdoar-se rapidamente, possa ser visto como algo ruim ou “involuído”.
    Mas o mundo geralmente funciona em espirais. Aquilo que é o mais básico volta, depois de toda a estrada, e vira o mais alto e primeiro. “Os primeiros serão os últimos”, de fato. Não porque os primeiros são piores que os últimos. Mas porque os últimos são os primeiros explicados e entendidos.

  7. Gostei, foram palavras, muito fortes e bastantes profundas, sem desvio eu concordo com todos os seus argumentos…

  8. O livro Demian, do Hermann Hesse, traz uma passagem interessante que acredito que tem a ver com esse tema: um trecho que questiona a história bíblica do bom e do mau ladrão crucificados ao lado de Jesus. Diz que o bom ladrão, arrependido de sua vida de crimes, escuta da boca de Cristo que estará junto a ele no paraíso. Aí vem o questionamento: que valor tem esse arrependimento à beira da morte? Segundo o personagem do livro, o mau ladrão, que se manteve na responsabilidade de todos os seus atos, seria uma pessoa muito mais íntegra e confiável diante de uma situação extrema (no caso, a crucificação), pois não ignorou tudo o que viveu até então, e o bom ladrão seria o fraco, que ao menor sinal de problema, abandonaria tudo. Bom pra refletir sobre essa idéia de que basta se confessar e pagar uma penitência que estará tudo resolvido… mas não pensam que todos aqueles “pecados” cometidos não serão apagados tão facilmente.

  9. Texto excelente e ótimo para refletir, colocou em palavras todos os meus pensamentos sobre o “pecado”. O “pecado” nada mais é do que um eficiente instrumento de controle de massas. E o mais incrível é que ele foi tão efetivamente embutido na mentalidade das pessoas ao longo dos tempos, que hoje até mesmo os que não seguem uma religião são inconscientemente adeptos do sentimento de pecado e culpa.
    Mas a triste realidade é que o “fluxograma” do pecado é muito mais confortável para algumas pessoas do que aceitar o fato de que senão elas, ninguém mais é responsável pelos próprios atos. Para estes, é muito mais confortável acreditar que há uma divindade antropormórfica observando tudo o que fazemos e distribuindo “estrelinhas de comportamento”, do que encarar uma realidade onde vivemos sob a responsabilidade de exercer nossa vontade – e de que é a nossa vontade, e não o julgamento de um ser superior, que vai reger nossos atos e as consequências destes.
    A grande verdade é que viver por si só, sob os próprios preceitos e responsabilizando-se pelos próprios error, é muito mais difícil do que seguir qualquer religião…

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