x dólares, 1 voto

O âmago do sistema político americano é marcado pela corrupção resultante da dependência que os candidatos ao Congresso têm do dinheiro do financiamento de campanha que vem de grandes doadores, que são uma ínfima porcentagem dos cidadãos. Essa é a questão central dessa palestra mordaz proferida pelo jurista Lawrence Lessig:

Muitas coisas poderiam ser ditas sobre as falhas do atual sistema democrático em boa parte do mundo, mas nada as resume melhor do que o fato de que, em 2010, somente 132 americanos foram responsáveis por 60% do total de dinheiro investido nas campanhas eleitorais de ambos os partidos que têm reais chances de vencer as eleições. Apenas dois, como sabemos: Republicanos e Democratas.

Existe uma crença semi lendária de que na democracia cada pessoa tem direito a um voto – o famoso “1 pessoa, 1 voto”. Porém, se formos deixar a ingenuidade de lado e analisar como a democracia realmente se comporta nos dias atuais na maior parte do mundo, teremos uma equação um tanto mais nefasta – “x dólares, 1 voto”. A principal diferença entre uma república e outra não é exatamente a quantidade de partidos ou a ideologia deles, mas simplesmente o quanto se deve “investir” (x dólares) em cada eleição para termos a certeza de que o vencedor será um “governante amigo”.

Como obviamente estes “x dólares” não são um valor muito pequeno ou corriqueiro, principalmente nos EUA, daí tiramos que a democracia atual praticada no mundo é quase um jogo de cena, um teatro que encobre o grande negócio eleitoral que se dá por debaixo dos panos. Um negócio que visa beneficiar, principalmente, as grandes empresas e as grandes fortunas. Por isso não é nenhuma novidade que os banqueiros ganham rios de dinheiro quando a economia vai bem, mas quase nunca perdem dinheiro algum quando tudo vai mal: eles pagaram muitos, muitos dólares, para que o sistema se mantivesse exatamente desta forma… Há uma excelente razão para o “conservadorismo” deles.

Mas, se nos EUA, onde a Justiça ainda é capaz de mandar políticos corruptos para a cadeia, o negócio eleitoral já é tão nefasto, imagine noutros países onde a Justiça funciona raramente, e onde deputados condenados só perdem o mandato por pressão do povo, e não exatamente pela vontade dos políticos?

Esquerda, Direita? Republicanos, Democratas? PT, PSDB? Esqueçam tudo isso… Não há ideologia que sobreviva neste grande negócio eleitoral que muitos ainda insistem em chamar “política”.

E o Brasil? Ora, o que importa para o negócio eleitoral brasileiro é manter o povo cada vez mais afastado das decisões de Brasília. Enquanto a política se reduzir ao “x dólares, 1 voto” ou “x reais, 1 voto”, os grandes corruptores continuarão rindo à toa, e o PMDB continuará onde sempre esteve, barganhando favores, ministérios, e defendendo os “direitos” daqueles que podem colocar suas malas de dinheiro à mesa.

E isso tudo só mudará por duas vias: a via da Reforma Política, ou a via da Revolução. Um dia, aqueles que pagaram (e ainda pagam) pelo “travamento” da Reforma no Congresso ainda podem se arrepender amargamente, pois é na Revolução que as cabeças são cortadas…

“Para cada mil cortando os galhos do mal, há um a atacar sua raiz”

Henry David Thoreau

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Respostas de 12

  1. “Tem gente que passa a vida travando a inútil luta com os galhos, sem saber que é lá no tronco que tá o coringa do baralho”

    Disse o filósofo.

  2. Lembrei das manifestações de julho. Seria luta contra os galhos?

    @raph: Em grande parte sim, exceto quem compreendia que a Reforma Política era o primeiro passo. Por um breve momento achei que a presidenta iria encarar o desafio de frente, com a proposta da Constituinte Exclusiva para a Reforma do Sistema Eleitoral (antes de criticarem, procurem saber exatamente do que se trata), mas infelizmente ela desistiu em menos de 48h…

    1. Levando em conta o que já vi definido por essas eleições, eu diria que foi com as folhas.

  3. Ta, tudo bem… mas daí a dizer que não existe esquerda x direita no Brasil é algo muito leviano. Só porquê o PT deu um giro grande à direita quando chegou ao poder, não quer dizer que o resto dos partidos de esquerda tenham simplesmente desaparecido. Assim como os Democratas americanos não são a esquerda de lá, não faz sentido considerarmos o PT a esquerda daqui. Só são mais à direita que os tucanos, assim como os Republicanos estão mais à direita do que os Democratas.

    @raph: Sim, eu quis dizer que entre os partidos que tem alguma chance de vencer as eleições, e que abocanham cerca de 95% do financiamento privado das campanhas, as ideologias estão em segundo (ou décimo segundo?) plano.

    Citando o exemplo das eleições presidenciais deste ano:
    (primeiro mês) http://g1.globo.com/politica/eleicoes/2014/noticia/2014/08/dilma-aecio-e-campos-obtem-99-das-doacoes-presidenciaveis.html
    (segundo mês) http://g1.globo.com/politica/eleicoes/2014/noticia/2014/09/em-dois-meses-de-campanha-dilma-arrecada-o-dobro-de-aecio-e-marina.html

    E analisando somente o financiamento para a eleição ao governo de SP:
    (primeiro mês) http://g1.globo.com/sao-paulo/eleicoes/2014/noticia/2014/08/alckmin-e-skaf-obtem-95-das-doacoes-de-campanha-em-sp.html
    (segundo mês) http://g1.globo.com/sao-paulo/eleicoes/2014/noticia/2014/09/em-2-meses-de-campanha-alckmin-e-candidato-que-mais-arrecada-em-sp.html

    Abs.

  4. Concordo com o texto até a parte da revolução.
    Todas as revoluções(menos a revolução interna, deixando bem claro. A revolução alma é o melhor que pode acontecer para alguem) já feitas foram apenas troca de poder. Não se iludam com esse papo bonito de “poder do povo”. A pessoa que chega ao poder- pq revolução é isso, colocar uma pessoa que teoricamente é todo bondade, amor e qualidades positiva no poder- sobre uma nação, se corromperá e começara a pensar só em si e nos seus companheiros, deixando as pessoas de lado morrendo, neste pensamento podemos citar várias revoluções que só causaram mal a humanidade-Napoleão, URSS, China, diversos países africanos, Cuba etc-.
    A saida é tentarmos diminuir o poder do estado e sempre controlarmos este tamanho. É sabido que as melhores condições de vida para as pessoas foram sempre nas nações que menos tinham governo. Como exemplo podemos citar os EUA do final do século XIX e inicio do XX.

    1. Revolução faz mal? Então voltemos ao Antigo Regime. Ou à Rússia dos Czares.

      O problema é como é feito. Manifestação “contra tudo que está aí” que é maléfica, porque não tem pauta, ninguém sabe pra onde vai, e todo mundo vira massa de manobra.

      A questão não é trocar um e colocar outro no poder, mas sim mudar o sistema. E dizer que ter menos governo é ter mais condição de vida… Quem entra no lugar do governo, automaticamente? Os Bancos. Isso já está consolidado. Revolução tem que atingir o sistema financeiro, não “trocar quem está no poder”. Isso que o artigo disse.

      Esse papo de Estado Mínimo é só pra confundir as pessoas.

      @raph: Sim, os melhores índices de desenvolvimento humano do planeta atualmente se encontram quase todos nos países nórdicos (Escandinávia). E lá o Estado é grande e os impostos altíssimos; a diferença é que lá o Estado é bem mais eficiente e consideravelmente menos corrupto. Abs.

  5. Este texto desconsidera a principal e mais benéfica característica do sistema político norte-americano: O federalismo (federalismo de verdade, não o pseudofederalismo do Brasil). Lá nos EUA a maior parte dos impostos pagos ficam nos condados e nos Estados, apenas uma parcela vai para o governo federal. Se nas disputas das eleições federais apenas 2 partidos concorrem seriamente não é tão incomum em Estados e condados serem governados por outros dos 127 partidos que existem por lá. Lá governa-se a cidade e o Estado antes de se pedir qualquer coisa ao governo federal, lição que brasileiros jamais aprenderão. Entretanto parece haver nos EUA movimentos que querem retroceder o federalismo, aumentando as competencias e interferencias do governo federal, especialmente entre democratas e outros esquerdistas, a consequencia disto sera o agravamento deste quadro bipartidário plutocrata que rege as eleições federais no país.

    @raph: Mas a questão do financiamento privado sem regulamentação contamina todo o sistema, desde os deputados, senadores, a prefeitos, governadores e presidentes. Obviamente que a eleição presidencial é onde esta questão se torna mais evidente, mas ela é somente o reflexo do que ocorre no sistema como um todo. É claro que o sistema político dos EUA ainda assim continua tendo diversos méritos, mas já não é nem sombra do que foi no passado – na verdade a palestra do Lessig é toda voltada para “trazer a democracia de volta ao que ela foi um dia”. Ou seja, sob certo ponto de vista, é um discurso totalmente conservador.

  6. O que fomenta todo esse esquema é o poder do Estado. Como o Estado, através de lobbys, dá aos políticos muito poder sobre a economia, o apoio aos candidatos é um investimento muito mais importante que qualquer atitude empreendedora. Ao invés, por exemplo, de um empresário ter que melhorar processos pra abaixar preços e enfrentar a concorrência, é mais barato investir em um burocrata pra criar uma lei pra que a concorrência sofra e ele seja o único beneficiado. Portanto, tirar a contribuição privada de campanha, no Brasil, só vai beneficiar quem faz caixa 2 e não vai resolver esse problema: as empresas estatais brasileiras vão continuar com seus desvios de dinheiro pros partidos e a economia vai continuar a mesma porcaria que já está, pois como nos provou a URSS e a China comunista, o planejamento central das economias só gera escassez, miséria e fome. Não acreditem nesse papo de Estado forte: cachorro que tem muitos donos sempre morre de fome…

    @raph: Mauricio, acho que você não entendeu. O problema do financiamento privado dominado por grandes empresas ou bilionários (no caso específico dos EUA) não tem nada a ver com Esquerda e Direita, com Estado grande ou mínimo, com Socialismo ou Neoliberalismo, tem a ver com a essência da Democracia. Ainda que o caixa 2 dificilmente deixe de existir, ficará muito evidente se uma campanha está gastando muito mais do que declara, como já ocorre atualmente – bastaria fiscalizar, e esta fiscalização poderia ser feita inclusive pelo bom senso do eleitor. E, somente para constar, nestas eleições para a presidência do país, neste ano de 2014, o PT arrecadou de empresas 6x mais que PSB e 3x mais que PSDB, sendo que os 3 juntos abocanharam cerca de 95% do total de doações privadas. Com agravantes como o fato da JBS-Friboi haver doado a TODOS os 3 (assim como Eike Batista já havia feito em 2010). Ou seja: estamos cada vez mais distantes de uma “democracia plena”.

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