Você tem medo do Escuro?


Por Adriano Camargo Monteiro
É importante compreender isto para se libertar das dicotomias absolutas, absurdas e fatalistas, do dogma, do “tabu” e do senso comum: luz e trevas não são os clichês que as massas temerárias e temerosas costumam achar; afinal, vivem de achismos…
A luz não é o bem; a escuridão não é o mal. Não existe o bem absoluto na luz nem o mal absoluto nas sombras. A escuridão nada tem a ver com o Diabo dogmático nem com o mal cinzento que assola o mundo, esse mal global que faz parte dos produtos midiáticos que as pessoas “compram” com audiência e assiduidade. Mas há (des) gosto para tudo… O mal do mundo é pura e simplesmente o mal das pessoas, criado por pessoas, disseminado por pessoas e “usufruído” por pessoas que adoram esse grande circo de aberração chamado “civilização”. Além disso, o mal pode ser algo um tanto relativo. Enfim, isso é o que se apresenta…

A escuridão está muito além do bem e do mal dos seres humanos. A escuridão representa aquilo que está oculto, significa mesmo o próprio Oculto, o Mistério, aquilo que é “proibido”, que é secreto, escondido como um tesouro a ser descoberto. Não existe malignidade alguma nisso. Assim, a iniciação (psicoespiritual) das trevas é a mais importante, pois o Mistério das Sombras é o mais secreto. Nas sombras, o iniciado se recolhe para desvendar tudo o que está oculto, para acessar conhecimentos “proibidos” profundos. Nesse sentido, luz significa consciência, e trevas significa subconsciência, o repositório de todo conhecimento oculto, esquecido e abandonado pela Luz, ou seja, pela consciência ordinária, de vigília, pela personalidade que se manifesta no dia a dia. No plano mundano global, vulgar e banal das coisas, luz é a ignorância que se vê e trevas, a ignorância inconsciente.
Por meio da introspecção nas sombras interiores, o indivíduo pode então confrontar os elementos mais profundos, “perigosos” e “proibidos” de sua subconsciência (trevas) e trazê-los assim para a consciência ou mente consciente (luz), assimilando os conhecimentos mais secretos de seu Daemon (Eu Superior, Logos Individual, etc.). A luz verdadeira, portanto, é a consciência desenvolvida e expandida após essa imersão nas trevas, é o conhecimento assimilado e consciente, percebido sobre o fundo negro no qual essa luz brilha e pode ser vista.
Pelo que precede, a luz sem as trevas jamais poderia ser percebida. Sem o contraste entre luz e escuridão nada poderia ser visto (ou seja, nada poderia se manifestar). Para que a luz possa se manifestar e iluminar, a escuridão é necessária. Em sentido filosófico e metafísico, luz e trevas, dia e noite, representam manifestação e não-manifestação, consciência e subconsciência, inteligência e imaginação, razão e intuição… Em termos de individualidade humana, luz é atividade, intelecto, mente racional; trevas é inatividade, repouso, introspecção, reflexão intuitiva, imaginação e instintos (quase sempre, elementos negados, rejeitados, reprimidos e menosprezados por imposição dos dogmas e dos preconceitos sociorreligiosos).
Podemos ilustrar essa questão com alguns exemplos: no ser humano, a escuridão é o subconsciente repleto de forças primais que trazem experiências interiores e sabedoria; é o útero psicomental do qual nasce a consciência superior; os seres vivos nascem da escuridão do útero de suas mães e quando “morrem” voltam para as trevas da terra e do submundo (simbológica e mitologicamente falando); os minerais e pedras preciosas se formam na escuridão da terra; as plantas brotam também do interior escuro da terra; o cosmos nasce da escuridão do caos; e as estrelas surgem na matéria escura do espaço e a encrustam com seu brilho visível, porque sem a escuridão elas não poderiam brilhar; e o dia e a noite intercalam-se na manifestação do tempo em nosso mundo, do mesmo modo que a vigília e o sono em nossa vida.
Portanto, as trevas não são o mal (como se conhece), e a luz não é o bem (como equivocadamente o achismo acha). Essa coisa dicotômica não existe, pois a luz e as trevas são gradações que manifestam em toda existência.
Todo aquele que nega e menospreza a escuridão está negando a própria luz que jaz nas profundezas de si mesmo, na caverna escura, que é o abrigo protetor do tesouro, da joia brilhante que é a gnosis, que é a luz do conhecimento, a consciência do Eu Superior.
E, então? Você tem medo do escuro?
Adriano C. Monteiro é escritor de Filosofia Oculta, articulista, editor da revista eletrônica Sitra Ahra e autor da Tetralogia Draconiana: http://www.viadraconiana.tk

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Respostas de 33

  1. Muito interessante o seu texto. Vc concordaria com a as afirmações de que “as trevas buscam a luz ” ou de que ” a luz dissipa a escuridão” no sentido de que aquilo que está oculto/inconsciente/não-manifesto precisa manifestar-se de alguma forma e de que seria melhor que se manifestasse por intermédio da luz (logos), ao invés de permanecerer oculto (inconsciente) e manifestar-se assim mesmo, porém de forma equivocada (compulsões, neuroses, taras sexuais e etc) ?

  2. Adriano. Esse texto é no mínimo conveniente. Mas pra dizer a verdade eu adorei ele! Basicamente fala de uma forma resumida (e muito bem formulada, à propósito!) um pensamento que venho desenvolvendo nos ultimos 18 meses. Você entretando usou alguns termos e conceitos que desconheço. Teria livros pra indicar à esse pobre leigo nos meios espirituais/filosóficos/psicológicos? Desde já estou grato.
    Sou fascinado por essa escuridão introspectiva. Pode me chamar de Sith.

  3. Podemos fazer suposições sobre o medo do escuro (em seu sentido literal, mas que se aplica a sobre o que quero discorrer). O maior perigo para um mamífero está na noite, quando os predadores noturnos que usam de seus sentidos adaptados a escuridão, saem para caçar suas presas. As estratégias variam entre subir em árvores, se esconder em cavernas, etc. Ora, como um ser desprovido de qualquer aparato natural ou artificial pode não ter medo nessas situações? Medo, nesse caso, é uma simples reação de defesa.
    Os seres humanos resolveram esse problema com a descoberta do fogo, que entre outros, servia para espantar predadores e dar o mínimo de visibilidade a noite.
    Do mesmo modo, qualquer um que não esteja preparado para ter a mínima noção do que acontece nas trevas, não deve se aproximar delas antes de se preparar. E isso, de fato, não se chama medo e sim prudência.
    Porque apesar do mundo novo que se esconde à noite, existem muitos predadores escondido nela.

  4. Belo texto Adriano! Gosto muito desse seu ponto de vista que desfaz a questão das dicotomias, e propõe a gradação como uma maneira mais abrangente para se observar o universo. Não sejamos seduzidos pelo marasmo da petrificação dogmática do conhecimento e da percepção, pois esta, pelo que nos tem aparentado, é a verdadeira ilusão.

  5. O escuro, o negro,o sombrio, é só aquilo que resolveu reter toda a luz dentro de si mesmo, como um buraco-negro (metaforicamente falando, claro). É que as pessoas estão acostumadas com os exemplos de “Portadores da Luz” estilo “Estátua da Liberdade”: colocando a tocha bem a mostra e divindo a luz com todos à volta… acontece que a cada dia que passa, muitos percebem que não precisam emitir luz as outras pessoas, pois cada pessoa é uma estrela também, com luz própria e não um planeta dependente de alguma luz de fora. Isso pode fazer com que uma pessoa se volte para dentro, como uma supernova que implode, retendo toda sua luz e toda a luz que a ela chegar… cada vez com mais sede de luz, cada vez com mais sede de conhecimento e experiências, assimilando e devorando isso, para transmutar em outra coisa: sabedoria… enfim, o mais perfeito exemplo de escuridão: um buraco-negro…Interessante que há uma teoria (não comprovada) que diz que a singularidade reagrupadora de um buraco-negro poderia ser uma singularidade explosiva que “vaza” no tecido espaço-tempo criando outro “universo”, como foi nosso Big-Bang (conceito parte da teoria dos multiversos)…
    Belo texto!

  6. Vejo que está acontecendo um redespertar para essa visão, o fim dessa dicotomia, da mesma forma que está acontecendo um redespertar para o feminino. Afinal, ” inatividade, repouso, introspecção, reflexão intuitiva, imaginação e instintos” são características do feminino.

  7. Os olhos verdes que piscam no escuro de céu
    Filho da luz, fui nascido da lua e do sol!
    Nas noites mais negras do ano eu mostro minha voz;
    Estrelas, estrelas
    As estrelas elas brilham como eu!
    As nuvens vagueiam no espaço sem lar nem raiz
    0 ódio não é o real é a ausência do amor
    No fim é um grande oceano, mãe, mãe filho e luz…
    Estrelas, estrelas
    As estrelas elas brilham como nós!
    As trevas da noite assustam escondendo o segredo da luz!
    Da luz que gargalha do medo do escuro
    Que é quando os meus olhos não podem enxergar!
    Dia , noite,
    Se é dia sou dono do mundo e me sinto filho do sol
    Se é noite eu me entrego às estrelas em busca de um farol
    Estrelas, estrelas,
    As estrelas elas brilham como eu.
    As trevas da noite…
    By Raulzito

  8. Simples, claro e objetivo. Parabéns!
    Isso devia ser ensinado na escola. Ou melhor, deviam parar de enfiar goela abaixo aquela montanha de besterias que “ensinam” por lá.

  9. Podemos substituir a errônea dicotomia:
    trevas = mal vs. luz = bem por
    desequilibrio = mal vs. equilibrio = bem
    pergunto..

  10. Levando em consideração Lucifer como doador de Sabedoria Divina, Logos, Hermes, Thoth, Prometeu…apesar das milhões de lendas de “senhor infernal das trevas e o cacete a quatro”, pode-se colocá-lo na Esfera de Tiphareth, certo ?

    1. hehehe
      é verdade, a maioria das pessoastem medo inclusive do que pode sair das trevas de sua mente, da manifestaçao da Sombra.

  11. Hahahaha! Lendo o início do seu texto, não pude deixar de concordar com a frase de Sartre: “O inferno são os outros…”

  12. Tudo bem a questão das dicotomias ja está superada, a luz é necessaria tanto quanto as trevas e o diabo sem duvidas não existe, no entanto negar a existencia do mal é impossivel, obviamente não do mal dogmatico mas do criado pelos homens. Curiosamente bons pensamentos produzem campos de força com tonalidades claras e vivas, ja maus pensamentos produzem campos de força com tonalidades escurecidas e sem vida tendendo ao preto… A diferença entre fraternidades brancas e negras sempre existiu nos conceitos iniciaticos, as brancas visam o bem comum, as negras o prazer pessoal…cuidado leitores nem tudo que reluz é ouro…

  13. helios pra mim e o Deus do empecilio cognitivo das 6 as 6, pq eu consigo me antenar psicoligcamente de noite.

  14. Li o texto e pensei no medo do escuro como também o medo daquilo que está oculto em nós mesmos, das partes de nós que não conhecemos e que queremos manter afastadas inclusive de nós mesmos, de um medo do “eu” que está fora de controle, de faces de nossa personalidade que achamos melhor não encarar.

  15. Gostei muito do assunto em questão, realmente não existe luz sem escuridão, desejo aprender mais sobre estes assuntos, vou frequentar mais este blog, traz muito conhecimento e luz sobre diversos assuntos que são tabus no cotidiano das pessoas e que precisam de coragem para estuda-los, agradeço por estes ensinamentos, Wilson

  16. “(…)trevas é inatividade, repouso, introspecção, reflexão intuitiva, imaginação e instintos (…)”
    Tenho que me preocupar se minha vida se resume a isso?!
    Outra dúvida que tenho é referente a imaginação. Não quero me expor aqui relatando tudo. Mas queria ver alguns textos que relatam sobre a imaginação, sua importância, significado, etc…
    Sobre o escuro, sempre preferi andar na rua de noite do que de dia. Acho que é devido as estrelas e ao menor numero de “pessoas”.

  17. Muito conveniente ler isso hoje.
    Sinto-me impulsionada a conhecer o “oculto” desde minha infância e hoje estou tentando me livrar desse medo. Ler o TdC tem me ajudado muito nesse embate.
    Meu muito obrigada a todos que fazem o TdC!

  18. Um perfeito texto para se refetir, principalmente pra quem é adepto do rosacrucianismo e maçonaria!!Chega de obscurantismo intelectual!!!! – marcio “osbourne” silva de almeida – joinville/sc

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