“É como se no Brasil desse para fazer uma obra Alquímica, em que você coloca na mesma panela um monte de ingredientes e você trabalha aquilo e no fim há uma metamorfose e surge uma coisa preciosa para fora”
Com esse pensamento e outras metáforas interessantes, Roberto Gambini apresenta nesta palestra sua perspectiva a cerca da essência do povo brasileiro, do sujeito à nação. O cientista social e analista junguiano entende que nosso país precisa tomar consciência da diversidade, da imensidão e da riqueza das terras brasileiras e deve resgatar a essência indígena. Pautada na coletividade, nossa cultura deve ser geradora de colaboração.
Estamos nos deslocando para o que éramos antes de sermos interrompidos, atualizando tudo que foi conquistado pela contemporaneidade. Esse retorno nos permitirá identificar nossa antiga meta: viver com simplicidade.
É nossa missão retomar uma energia que “brota da terra e conduz sem erro para sermos o que tínhamos que ter sido desde o começo”. Amparados pela simplicidade, devemos reaprender a viver com pouco. Saber ter vida interior, ou seja, uma subjetividade atuante, expressa e livre. Devemos “saber ver a beleza desde o pequeno até o infinito”.
O resgate da alma indígena e as concepções tribais de sociedade, que englobam a ausência de propriedade privada e papéis bem integrados socialmente se mostra a alternativa ao maior desafio do Brasil: a injustiça.
É impossível separar as problemáticas socioeconômicas das problemáticas psicológicas e culturais. Elas andam juntas e a transmutação deve ocorrer internamente assim como externamente.
Injustiça essa que não é de nossa natureza, uma vez que os povos indígenas traziam consigo a capacidade de comungar coletivamente a natureza. Desigualdade e exclusão são provenientes da sociedade de classes, pois apenas o modo de produção que permite que pouquíssimos tenham exacerbados privilégios, e uma massa enorme não tenha acesso aos bens elementares.
Considerando a perspectiva alquímica, existe um conceito chamado multiplicatio, ou multiplicação. Tudo vem e provém de um. Considerando essa máxima hermética, a multiplicatio diz respeito ao processo de aumentar a potência da pedra filosofal. Aquela que tudo toca e transforma em ouro é uma metáfora para nossa consciência mais elevada. Quando transcendemos a esfera do ego e equilibramos nossas polaridades, acessamos camadas mais profundas do Self.
Tal mergulho nas águas do inconsciente é transformador e, ao retornarmos ao mundo exterior, aqueles que foram tocados pela luz, acabam iluminando os outros também. A Multiplicatio é o processo alquímico em que permite que a luz seja disseminada, sendo luz, aqui entendida como discernimento, como consciência.
Para Gambini, quem se conscientiza, ganha uma força e dela se obtém o poder da multiplicação. Instruir as crianças, expô-las a uma mentalidade que valoriza nossos raízes seria uma opção para a mudança. Isto permitiria não só a construção de uma nova identidade social, mas comportaria a construção de uma história “que pode correr livre e sem ser distorcida”. Só assim seria possível resignificar em nosso imaginário nosso complexo de inferioridade, ou de vira-latas, como diria Nelson Rodrigues.
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Ricardo Assarice é Psicólogo, Reikiano, Mestrando em Ciências da Religião e Escritor. Para mais artigos, informações e eventos sobre psicologia e espiritualidade acesse www.antharez.com.br ou envie um e-mail para contato@antharez.com.br
Imagens:
“A Primeira Missa no Brasil” de Victor Meireles (1860)
Criança Patajó (esquerda), bebê moderno mexendo num iPad (centro) e indíos Kuikuros (direita)
Respectivamente: “Multiplicatio”, encontrado na Coleção Alquímica de Manuscritos de Manley Palmer Hall e “Multiplicatio”, encontrado em Philosophia Reformata, de Johann Daiel Mylius (1628)
Respostas de 2
eu nunca sei realmente, olhando pro nosso passado, se podemos dizer que nossas RAIZES são indígenas… adoraria se fosse. E se fossem de fato, talvez não estivessemos tão influenciados pelas “necessidades” fisicas e materiais que fazem nossa sociedade lutar ferrenhamente pela manutenção de privilégios, que sabemos hoje que as estruturas tribais não tinham…
meu ponto é: nossas raizes são mesmo indigenas?
ou o correto seria dizer que nossas raizes são sim as raizes dos europeus que destruiram (e ainda destruimos) as culturas indigenas?
por mais que idealizemos uma sociedade pautada nos valores do povo Gê ou Tupi, ainda acho q nós somos hoje uma sociedade que não esqueceu nada – fazemos exatamente a mesma coisa desde o começo: sobreviver a todo custo, mesmo que para isso, tenhamos q destruir os outros.
neste ponto, estamos “corretos” com nossas raizes
Resgatar nossas origens só se for a volta da Monarquia que a República destruiu. O Brasil tem que acabar com a miséria e esse complexo de vira latas de venerar índios que são donos de terras milionárias espalhadas pelo país.