Por: Colorado Teus
Saudações,
Começo hoje uma série de textos e reflexões a respeito do sistema mágico-religioso “Umbanda Sagrada”. Esse tipo de assunto é muito delicado, pois há muitas linhas diferentes de Umbanda, cada uma com fundamentos próprios, crenças diferentes, objetivos diferentes e tudo mais. A divergência dentro da Umbanda é tanta que, dentro de uma mesma linha, mesmo que se siga uma estrutura ritualística central, há muitas diferenças de um terreiro para os outros. Porém, meio a todas essas divergências, há alguns fundamentos que valem a pena serem levantados, principalmente aqueles ligados a questões de magia e entendimento dos processos espirituais. Acredito que muitas pessoas irão discordar das minhas linhas de raciocínio; para essas pessoas, peço, por gentileza, que escrevam nos comentários suas questões, pois, assim, acrescentarão em muito ao desenvolvimento de nossos conhecimentos.
Enquanto eu escrevia uma série de textos sobre a Umbanda para o Queremos Querer, me deparei com alguns problemas de rigor nas pesquisas que fazia sobre o tema, quase nunca conseguia compilar as informações num nível de conhecimento aceitável para a minha lógica.
Ao meu ver, existem muitos problemas em tentar transmitir a Doutrina Umbandista (principalmente pela internet), e o primeiro e mais importante é: existe uma Doutrina Umbandista? Como fundamentar a Umbanda? Existe algum conjunto de dogmas que vale para todos os terreiros? Existe uma ideia central por trás dessa egrégora?
Obviamente, para ser uma egrégora o grupo necessita estar fundamentado em uma ideia central, mas qual é ela? Seria a primeira manifestação de Zélio de Moraes? Seriam as manifestações de diversos médiuns que incorporaram espíritos que se diziam da Umbanda mas nunca tinham tido contato com o Zélio?
Esse assunto é extremamente complicado uma vez que não há como provar a veracidade das informações transmitidas por todos os espíritos e nem das diferentes ‘linhas’ que foram surgindo ao longo do tempo. Seria a Umbanda Sagrada a verdadeira Umbanda? Ou a Umbanda Branca? Ou a Umbanda Esotérica? ou qualquer outra linha que tenha surgido?
Mas e se forem todas corretas ao mesmo tempo?
Se pensarmos na Umbanda como a religião fundada por Zélio de Moraes juntamente ao Caboclo das 7 Encruzilhadas, em que “Aos menos evoluídos ensinaremos, com os mais evoluídos aprenderemos e a ninguém renegaremos” e “A Umbanda é a manifestação do espírito para a prática da caridade”, quase todas elas seriam verdadeiras, mudando a-penas a FORMA com que cada uma faz isso.
Os símbolos, rituais, regras, formas de preparação fazem parte do exoterismo¹ de cada casa, são apenas, como eu disse, as formas com que as pessoas usam para tentar chegar aos propósitos de aprendizado e caridade. A parte esotérica, a principal, fica num espaço em que não entra nenhum símbolo, paramento ou assentamento, fica no interior de cada pessoa e nas realizações que ela consegue materializar. Porém, é comprovável empiricamente que a parte exotérica ajuda e muito na organização e equilíbrio energético do médium/consulente, assim, muitas pessoas acabam confundindo o meio com o fim e ficam brigando para ver qual pai/mãe de santo é melhor (quem tem mais guias, quem recebe a entidade mais evoluída, quem tem mais assentamentos, quem tem mais tempo de Umbanda, quem buscou o fundamento com o sacerdote africano mais respeitável, quem tem mais paramentos etc.).
Para ficar bem claro meu ponto de vista em relação a isso, em momento algum eu disse que a organização mágico/religiosa não é importante, é fundamental, mas não é o objetivo em si. Quer complicar ainda mais a questão? Onde entram os Orixás nessa história? O que são Orixás?
Algumas linhas de Umbanda fundamentam todos os atos religiosos nos Orixás, enquanto outras sequer aceitam a existência de tais seres com as capacidades que dizem ter os Orixás. Como eu perguntei anteriormente, tudo na Umbanda necessita estar ligado com o que foi passado pelo Zélio em si ou aceita-se a entrada de novos conhecimentos, uma vez que o próprio Zélio não tivera ligações diretas com os cultos de nação antes de fundar a Umbanda?
Se formos seguir o próprio ensinamento do primeiro dia, citado anteriormente, a Umbanda deve sim estar aberta à entrada dos ensinamentos de qualquer origem, desde que tragam aprendizados. A ninguém renegar significa não virar as costas pro negro, pro amarelo, pro vermelho, pro branco, pro mendigo, pro milionário, pro bruxo, pro mago, pro feiticeiro, pro anjo, pro demônio etc. Isso significa total abertura para os conhecimentos das diversas áreas.
Acredito que, pelo conhecimento trazido pelos participantes das giras, a Umbanda acabou se ligando cada vez mais aos cultos de nação, até porque, de lá vem um pouco do pouco de magia (que é um procedimento muito usado para ajudar no processo de manifestação do espírito) que temos nesse país. Assim, além da anexação do culto aos Orixás na religião de Umbanda, também houve uma ‘africanização’ dos objetos, nomes e signos utilizados em seus centros.
E isso não tem nada de errado se usarmos como premissa as duas primeiras frases citadas de Zélio de Moraes.
Nesse ponto entraríamos em um novo problema: qual sistema africano utilizar? As fontes são confiáveis?
Meus amigos, estudar nomes, pronúncias, atuações ou qualquer coisa sobre Orixás é muito difícil. O que temos no Brasil hoje sobre os cultos afro é resultado de um empilhamento de conhecimentos de várias tribos provenientes de várias regiões diferentes da África, com pessoas que tinham divergências de crenças e outras que inventaram um monte de coisas, e, sendo a “cereja do bolo”, uma maioria analfabeta que só transmitia o conhecimento para quem queria e da forma que queria. Ou seja, qual a chance de que isso que temos hoje é um conhecimento puro?
Usei a palavra “puro” e não “verdadeiro” justamente porque ainda existe a discussão se algo é verdadeiro se, e somente se, for de uma tradição e não tiver sido mexido. O conhecimento não pode se transformar de acordo com que o próprio ser humano se transforma? Ou é uma mistura de transforma sem mudar a essência?
É possível criar uma tradição? Ou tradição é algo que, por ser bom, durou e dura bastante tempo? Notem o quanto a palavra tradição está ligada às palavras ‘hegemônico’, ‘puro’ e/ou ‘dominador’. Essas palavras indicam algo ruim? Não necessariamente, podem ou não conforme o caso. Mas quanto menos mediunidade o dirigente tiver, mais ele necessita se apegar à tradição.
Ao mesmo tempo, quando se faz um rito com cada detalhe conforme diz a tradição, o fator dúvida é eliminado pelo pensamento ‘para o rito fazer parte da tradição precisa ter dado certo para muitas pessoas’. E a eliminação da dúvida é um passo muito grande na realização mágica, que exige confiança. Paradoxalmente, a dúvida é o que move o ser humano, é a dúvida que coloca a pessoa em movimento para buscar novas ideias e evoluir, sair de sua própria tradição em errar.
Concluindo essa reflexão, pensar em uma tradição pura e imutável seria ir contra a ideia do constante aprendizado apresentado por Zélio de Moraes; fechar a cerca, ou doutrinar, seria de fato paralisar o crescimento da religião, porém, ao mesmo, tempo, isso é viável enquanto ajuda aos médiuns a se equilibrarem e conseguirem boas manifestações do espírito para a prática da caridade (uma vez que precisa da confiança). A Umbanda vive hoje esse paradoxo que a maioria dos praticantes ainda não conseguiu neutralizar, até porque acredito que a dose certa de ‘tradição’ e de ‘evolução’ em seu fundamento varia de pessoa para pessoa; sendo assim, deveríamos, mais uma vez, seguir o velho conselho que quase todos os pretos velhos nos dão durante os atendimentos: “Harmonize a coroa com o coração, não deixe um atrapalhar ao outro”. Dessa forma, vêm surgindo diferentes tradições dentro da Umbanda e, por mim, não há problema nenhum nessas diferentes sistematizações enquanto os praticantes souberem diferenciar o que é o ‘meio’ e o que é o ‘fim’.
Vai dar certo!
¹ Minha ideia sobre ‘exoterismo’ e ‘esoterismo’ é um pouco diferente do que se vê, usualmente, nos meios hermetistas. Explicarei melhor em textos posteriores, mas, por enquanto, tenham como referência a palavra ‘exotérico’ como o externo e fisicamente perceptível, e ‘esotérico’ como o interno e intransmissível.
Respostas de 13
Neste contexto, apresento o livro chamado: Umbanda: Transtorno de identidade de uma religião violentada por Jorge Caetano Júnior. Neste trabalho, tenta-se tecer a história da Umbanda, as diferenças entre suas vertentes e o reconhecimento da importância de cada seguimento, porém tenta dar posse ao que o autor chama de Umbanda Tradicional. Livro muito interessante neste para trazer outros pontos de vista e com pesquisas históricas bem interessantes.
@colorado teus: essa reflexão surgiu justamente de algumas conversas que tive com um pessoal da Umbanda Tradicional. Algumas questões relevantes foram de fato levantadas, mas a ideia da ‘tradição’ é justamente algo que critico nesse texto, pois muitos lá dentro acham que, por manterem tal tradição, são a linhagem pura e correta da Umbanda. Nada contra essa linha, eu gosto bastante na verdade, só não acho que esse pensamento seja construtivo para a religião em geral. Valeu pela indicação!
Olá.
Uma vez vi um terreiro de Umbanda que se intitula como “Tenda Holística”.
A qual tipo poderia talvez ser identificado?
Obrigado.
@Coloradoteus: as tendas holísticas de que já ouvi falar eram casas com bastante ligação à cultura oriental, tinham um trabalho ‘espiritualista’ ligado a Reiki, mestres ascensos etc. Mas não conheço muito bem, não sei se há um eixo central que organiza. Vou procurar saber, qualquer coisa respondo esse comentário.
“empirismo”
peço que os amigos não se ofendam, essa não é minha intenção, e vou usar como desculpa o fato de ser ariano e por demais sincero… mas não vou me espantar se aparecer uma Umbanda-Seicho-Rastafariana… é o código aberto… e com esse comentário não desmereço nem o Seicho no ie e nem a cultura rastafari.
só devemos tomar cuidado, pois estamos falando de algo importante que é a evolução espiritual de cada um de nós. Trabalhamos sempre para progredir, mas também podemos regredir se não soubermos devidamente onde estamos pisando e o que estamos fazendo.
Em relação ao que o senhor e outros seguidores da umbanda chamam de “nação” tenho que discordar profundamente, meu colega. Percebo um preconceito imenso nas suas palavras em relação ao Candomblé, preconceito esse que já presenciei muitas vezes em palavras de outros adeptos da umbanda que tentam justificar sua pretensa sabedoria com arrogância e soberba em relação a uma religião que consideram primitiva e de pessoas analfabetas.
@Coloradoteus: não há preconceito nenhum em falar que pessoas são analfabetas, isso só significa que essas pessoas que mantiveram vivas as tradições (e eu valorizo muito isso) não liam ou escreviam, logo, não há bons registros escritos para fundamentar os diversos aspectos dos cultos (é basicamente tradição oral, os registros escritos importantes ficam fechados aos dirigentes de cada terreiro e são passados apenas para os pais/mães de santo). Seria preconceito se alguém dissesse que eles são ignorantes ou primitivos (aliás, a palavra primitivo, para muitos, é elogio e não ofensa). Os registros mais sérios ficaram apenas na forma dos contos, mas um Babalorixá me disse que o conto e sua interpretação não representa 1/3 do que alguém em sua função deve saber, e que o mais importante não entra no papel de maneira alguma.
As pessoas analfabetas que o senhor julga @(não é um julgamento, é um dado, 99% dos brasileiros, até o século XX eram analfabetos, e raríssimas exceções desse 1% eram negras) terem repassado os conhecimentos dos cultos e liturgias tradicionais dos orixás eram os próprios escravos e sua descendência, e se elas mantinham o culto em um quase aspecto de segredo, isso se deveu à demonização e criminalização das reuniões religiosas que, pasme o senhor, se realizavam 300 anos antes do surgimento da umbanda e continuam vivas até hoje.
@Coloradoteus: Nós da Umbanda somos muito gratos a isso, dedicamos uma das 7 linhas para a linha dos ‘Baianos’ justamente em agradecimento a isso.
Sugiro pesquisar sobre o culto de “nações” mantido nas casas matrizes da Bahia, que se aproxima muito e possui pouquíssimas modificações em relação a religião organizada pelos escravos, com “colagens” de diversos cultos regionais da Nigéria e do Daomé, e que funciona muito bem, obrigado, até hoje nas casas descendentes das matrizes. Taxar o conhecimento transmitido pelos antigos do Candomblé como de pureza duvidosa é, para dizer o mínimo, pretensioso. O culto aos orixás que se vê hoje na África possui pouquíssimas similaridades ao culto realizado no Brasil, graças as guerras e reconquistas territoriais que são históricas naquele continente e modificaram irreversivelmente a crença original nos orixás, voduns e nkisis. Logo o que temos no nosso Candomblé brasileiro, embora seja uma mistura de cultos e liturgias de diversas tribos e locais, se aproxima muito mais do culto “original” aos orixás do que o que existe em muitos locais da África em que as cerimônias dedicadas a estas divindades ganharam um aspecto quase folclórico e desprovido de espiritualidade. Peço desculpas se minhas palavras soam duras, mas na condição de adepto do Candomblé me sinto na obrigação de defender a pureza e o caráter de resistência cultural e religiosa da minha crença.
@Coloradoteus: Agradeço pelo comentário. Acredito que você tenha se sentido um pouco ofendido justamente porque há muitas feridas da perseguição aos membros do Candomblé, da mesma forma que existem nos da Umbanda. Mas entenda que nenhum comentário foi no sentido do julgamento, pois fundamentos das duas religiões são diferentes e cada uma tem suas razões para isso.
Eu conheço pessoas que acham ridícula a transmissão de conhecimento religioso por livros ou artigos como esse. Outros que até mesmo defendem que o único conhecimento válido é o que se recebe intuitivamente durante os rituais. Para essas pessoas, pai de santo bom é o simples, sem estudo, mas com muita experiência (independente se são alfabetizados ou não).
o comparativo é grosseiro mas vejo a Umbanda como um “programa de código aberto”. vc precisa conhecer a linguagem, e acrescer ou retirar, aquilo que pretende ou não, cultuar ou trabalhar. Porquê? Oras, como um programa que ainda não atingiu o ápice de sua função… de tudo aquilo que ele é capaz de proporcionar… o código deve ficar aberto até que alguém seja capaz de apresentar sua “versão definitiva” – Aquela que atenderá a necessidade de todos os que utilizam o programa.
ainda existe a hipótese de a Umbanda não ser uma “religião” e sim um “berço empírico de uma futura religião ainda a surgir”. e me desculpem talvez a franqueza excessiva, mas mesmo essa discussão por aqui pouco nos renderá em esclarecimentos, uma vez que os médiuns e pais de santos são apenas os “cavalos” ou “aparelhos”… os verdadeiros empíricos… os verdadeiros “programadores” estão no outro “Plano”. Nós não trabalhamos o código e tolo é aquele que acredita que sim. O código aberto é tratado pelas egrégoras espirituais.
@Coloradoteus: permita-me discordar levemente. Se tomarmos cada linha da Umbanda separadamente, há estruturas bem consolidadas para um tempo-espaço específico, que funciona e tem bastante precisão. Se olharmos como um todo, de fato eu diria que o código está em aberto. Porém, é aqui que entra a diferença entre um mago e um médium. O médium simplesmente tenta manifestar, da forma mais neutra possível, aquilo em que se conecta em outro plano. O mago, além de médium, precisa entender o que está acontecendo para ter domínio sobre o máximo de fatores que poderiam atrapalhar a manifestação. O treinamento magístico existe sim em muitas casas hoje em dia, apesar de atingir menos que 5% dos participantes. O Vô Rubens Saraceni é um grande exemplo, ele decodificou todo um sistema mágico que é muito bem estruturado; vou falar sobre esse sistema em textos futuros. Valeu.
concordo com vc quanto ao papel do mago… sim pois toda vontade que se faz servir diferente da que se faz serva, é uma inteligência a serviço da religião e, muito mais do que receber as instruções exotéricas, ele preocupa-se com a instrução esotérica a ser passada aos “filhos de santo”…
mas existem conceitos desprezados no plano material sem o qual, a unificação das idéias e dos dogmas, gerará sempre mais e mais vertentes e “Umbandas com denominações distintas”:
-o conceito de a religião como um ser vivo próprio e orgânico (com seu tronco, inúmeros galhos, folhas e frutos);
-o conceito do Ori no Candomblé, o qual deveria ter um correpondente no plano físico, pois o que está acima é como o que está abaixo. e todas as coisas que estão acima e cujo reflexo não se fez material é ainda um porvir de algo sublime e ainda não nascido para nós.
-ainda o que provavelmente seja um tabu discutir, mas que se trata de uma Escritura de toda a tradição, que deve ser aceita e “inicialmente” inquestionável por toda nação umbandista até que o elemento “orgânico” desta religião se solidifique plenamente e se faça relevante a nível de contribuição para elevação espiritual das massas… (a exemplo do catolicismo, budismo, kardecismo…etc).
há um materialismo muito arraigado e isso ainda em mais da metade dos que se dizem umbandistas… são décadas de uma cultura que entende que ao sinal de qualquer dificuldade corre a “receber” “incorporar” seus guias para que esses ou retirem a pedra do caminho ou faça com que o sujeito a evite… mulher, dinheiro, emprego, saúde, me ajude, me salve, me cure, me,me,me…. isso MATA qualquer religião e da raiz à copa, a árvore míngua… grande parte dos umbandistas se doam com o intuito de depois receber… entendendo que o seu “merecer” é uma obrigação a ser atendida pelo plano espiritual. e é aí que o filho de umbanda CAI… que muitos se tornam evangélicos ou qualquer outra coisa… pq não viram atendidas as suas necessidades… sim é necessário uma doutrina única e inquestionável (isso inicialmente)e o Ori espiritual, deve ter um corresponde material na figura de um líder como a figura papal dos católicos. Isso para que o umbandista devidamente esclarecido do seu papel e do papel de sua religião, não chore as “pitangas” posteriormente… hoje cada pai de santo fala uma coisa e de acordo com suas convicções determina o que deve ou não ser passado ao umbandista sem a atenção do que “individualmente” cada pessoa está a buscar.
@Coloradoteus: esse panorama está mudando bastante com os colégios de magia, mas realmente ainda é bem forte. Aqui no meu terreiro luto muito com as pessoas que inicio para deixarem de lado o conceito Xavierista de caridade e para aprenderem a pensar na própria estabilidade antes de pensar em ajudar o outro (isso é essencial para sair do pedantismo). Mas dentro da Umbanda Sagrada tenho visto uma coerência bem grande, cada vez mais cristalizada, a respeito da magia e do entendimento de como se dão os processos. Claro que vão surgindo novos autores que enxergam além algumas partes, mas isso só acrescenta (e é totalmente coerente com o próprio fundamento da religião).
Salve Colorado!
Primeiramente, fico muito agradecido e digo isso de coração mesmo, pelo simples fato de ver novamente alguém dentro desse site (site que confio para estudos) falar sobre a Umbanda, que é o culto ao qual eu decidi ser adepto.
Falando brevemente sobre mim, estudei o raso de várias religiões para encontrar alguma em que eu mais me identificasse logo após retomar aquilo que chamo de fé e que havia perdido completamente em tudo por alguns anos.
Achei o culto umbandista super interessante pelo fato de ser um tipo de culto mais prático e menos teórico, e creio que principalmente essa foi a razão principal que me levou a me tornar umbandista.
Após me tornar adepto da Umbanda, curioso e filósofo que me considero, decidi estudar sobre a religião, fiz diversas leituras das mais variadas vertentes, me questionei muito se o terreiro que frequento seguia a maneira certa de “fazer Umbanda” e cheguei a quase desistir de frequenta-lo. Isso tudo deveu-se ao fato abordado no texto de que essa ou aquela Umbanda é a correta e as outras não, fato perigoso de ser abordado em livros e pesquisas, principalmente para um médium novo que está começando a descobrir o que é Umbanda e descobre que seu terreiro tem diferenças em relação a “essa ou aquela” isso pode ser realmente perigoso para um iniciante.
Vou fazer uma analogia simples naquilo que desejo expressar com esse comentário, espero que ao bom entendedor sirva para que eu não delongue o assunto:
Usando a igreja católica como exemplo, para que fique mais claro já que quase todos são doutrinados primeiramente por ela antes de terem a chance de decidirem por si qual religião lhe é mais afim;
O rito católito é basicamente composto pela missa e todo aquele enredo manjado ao qual quase todo mundo conhece, existe os tipos de símbolos e rituais como a cruz, confissão, dízimo, Pai-Nosso, bíblia, Ostia e tudo mais. Tudo isso é de praxe em praticamente qualquer ICAR, diferindo apenas o padre que faz a missa e a parte física da igreja.
Assim a igreja católica em si tem toda uma semelhança ritualística e dogmática, o que muda é a cara do padre, algumas peculiaridades como o tipo da batina, as cores que pintam a igreja, qual santo esta onde e de que modelo é a “caixinha das oferendas”. O que muda também é a intenção de cada padre, tem o padre sério, o padre que ta cagando pro negócio, o padre que come as desquitadas do bairro e até o padre que curte um “coroinha” mas isso são coisas de “pessoa” e não de religião”
E em um centro espirita isso também é semelhante, os livros do Kardec, os passes, a doutrina e o que muda é o cara que está lá na frente e a parte física, além das intenções pessoais de cada um.
Acredito que na Umbanda ou mesmo no Candomblé acontecem as mesmas coisas, com a exceção de que Umbanda e Candomblé não tem um livro doutrinário específico a seguir, tem o pai de santo sério, o que ta cagando e assim por diante.
A grande questão é que a Umbanda, o Candomblé, o Espiritismo, a ICAR ou A IURD ou seja lá qual for a instituição religiosa, todas tem um mesmo objetivo principal em si, a RELIGAÇÃO, e isso é o que deve interessar acima de tudo ao adepto ou praticante dela, seja o fiel ou o pregador. Toda a parte física, toda a briga de doutrina certa ou errada ou o quanto cada um acha que contribui mais que o outro ou que entende ou é mais evoluído que o outro é mero detalhe, e acredito eu que as entidades tem dó de ver as pessoas discutindo, brigando e se matando por questões desse tipo. Enfim, quem sabe mais ensine, quem sabe menos aprenda e quem quiser de verdade, chegaê que tamô junto.
Desculpe o tom de brincadeira e o palavreado, mas o que mais eu percebo é o quanto as pessoas gastam tempo e energia com as partes menos importantes que qualquer que seja a religião tem a oferecer e esquecem daquilo que realmente move a fé no mundo, a religação com o divino.
Agradeço mai uma vez por abordar um tema que fica tão esquecido no país em que ela mesma nasceu, a nossa querida Umbanda.
Um grande Abraço, axé!
@Coloradoteus: valeu pelo depoimento, só a acrescentar!
Fico feliz em ler o seu texto e os comentários, saber que há pessoas interessadas na evolução da Umbanda, discutindo em um bom nível. Vejo que vc segue a codificação que o Rubens trouxe à luz no Código de Umbanda. Isso é uma coisa que eu venho pensando há um bom tempo, então peço ago para fazer algumas considerações.
Na época que o Rubens Saraceni estava trabalhando na feitura do Código, ele deu uma palestra no lugar onde eu trabalhava como cambono, todos acharam interessante a maneira como Pai Benedito organizara as linhas de Umbanda, dando uma finalidade aos Tronos{Fé, Conhecimento, etc), introduzindo um segundo Orixá, que ele denominou Cósmico. Achei essa denominação inapropriada. No caso do Trono da Lei, a introdução de Egunitá como Orixá “Cósmico” me pareceu uma solução meio que tirada da cartola. Um Orixá sem tradição na Umbanda e pouco conhecido até no Candomblé. O Rubens associou-a à deusa Kali do induismo. Vi uma explicação no Yahoo, que não achei convincente, associando Ogum a Agni e Egunitá à Kali. Pelo pouco que conheço do induísmo esses deuses não são consortes.
Por outro lado a classificação exposta por Matta e Silva e Roger Feraudy no livro que eu considero seminal “Serões do Pai velho” são iguais mas completamente diferentes do Rubens. E ainda tem a vantagem de se “encaixar” nas sefiroth da cabala. Aqui mesmo no TdC vi um gráfico muito interessante colocando as linhas de Exus no centro da Árvore.da Vida, a disposição corresponde quase que exatamente à exposta por Feraudy. O MDD tb fez aqui uma associação dos Orixás com as 10 sefiroth tb condizente com a disposição tradicional.
Me parece que o “modelo” do Rubens pega mais pelo lado humano e prático, enquanto o dos autores tradicionais seria mais universal, ou cósmico. Talvez uma classificação não exclua a outra. É inegável o valor do trabalho do Rubens na Umbanda, mas essa é uma questão que vem me intrigando há um bom tempo
Um abraço
@Coloradoteus: Há um problema de misturas de ‘sistemas de referências’ ao se comparar a Teogonia da linha do Matta e Silva e a do Rubens. O significado da palavra ‘Orixá’ para os dois não passa nem perto. Se você quiser entender a estrutura da U.S. perante a Árvore da Vida hermética, precisa entender o conceito dos Tronos, que formam uma Árvore da Vida em Briah (naipe de copas, mundo das energias e emoções). Os tronos são regidos por 2 Orixás, ou seja, são os seres que administram a entrada (Universal) e a saída (Cósmico) das energias em nosso planeta. Esses regentes são chamados de “Orixás Maiorais Planetários”, que se diferem dos Orixás Intermediários, Intermediadores e Pessoais, que são outra história.
Essa questão também me intrigava bastante, até que um de meu guia (Vô Pedro) resolveu me ajudar. Ele disse que eu estava buscando pelas associações através das características mundanas, lendas e mitos dos Orixás, mas esse sistema não faz parte do fundamento da Umbanda Sagrada, e sim do Candomblé e das Umbandas com um pé mais africano (mais uma vez reitero, não digo que esteja certo ou errado, mas são diferentes). Na U. S. a correlação é feita por Geometria Divina (ou, como diz o Vô Rubens, por escrita mágica simbólica), e foge levemente do esquema que já foi apresentado aqui no TdC. Na verdade, o que difere é Hod, que a Árvore da Vida apresentada aqui no TdC está como Exu. Porém, Exu não é um Orixá de Briah de acordo com a Umbanda Sagrada, e sim de Atziluth (é um Orixá da Cosmogênese); a linha dos espíritos Exus, de acordo com a U.S., responde ao Trono da Lei (Geburah), mais especificamente, são regidos por Ogum. Assim, a peça que faltava no ‘quebra-cabeças’ ficou sendo Hod, mas eu descobri, através de Geometria Divina, que é o Trono da Evolução. Demonstrarei tudo isso no futuro, mas há muito chão até chegar lá.
De resto fica simples: Trono da Fé (Tiferet), Trono do Amor (Netzach), Trono do Conhecimento (Chesed), Trono da Justiça (Binah), Trono da Lei (Geburah), Trono da Evoluçaõ (Hod) e Trono da Geração (Yesod). Note que essas 7 sephirot correspondem ao círculo de Ruach na Árvore (lembrando que Binah fica na posição da setenária, onde fica Da’ath na árvore com 10).
O Tarot da Umbanda Sagrada é bem diferente do Tarot dos Orixás ou do Tarot que seria da Umbanda Tradicional ou Esotérica. Codificar esse Tarot foi meu tcc do sacerdócio, se um dia a Lei liberar eu posto por aqui e abro pras discussões.
Valeu.
Salve
Agradeço sua gentileza em elucidar esses pontos. A primeira parte da sua exposição foi fácil de deglutir, pq fiz uns seis cursos lá no Belém. Qto a 2a., confesso que não tenho conhecimento suficiente para opinar. Mas vou estudar.
Me permite propor outra questão?
Vc não acha que as festas da Umbanda poderiam ir se adequando a um calendário mais astrológico, à maneira dos celtas, dos egípcios, etc, mesmo sem detrimento do calendário católico, que é tradição do nosso povo?
@Coloradoteus: Eu pessoalmente acho que poderia, mas não acho que seja profundamente necessário. Quando vamos fazer uma modificação na estrutura de todo um sistema mágico, temos que ter uma boa noção do que isso afeta. Primeiro precisamos ter clareza ao responder essas perguntas: qual a principal energia que se utiliza nas giras e festas de Umbanda? Os umbandistas chamam de Axé, mas, cabalisticamente, o axé é a energia no nível de Nephesch? Ou de Ruach? Para cada fase lunar temos um tipo de Axé? O que podemos fazer de diferente em cada signo que a Lua ocupa?
Certa vez perguntei sobre isso para meu preto velho e ele disse que as entidades conseguem isolar um espaço mágico quando vão fazer seus trabalhos, e dentro desse espaço mágico conseguem utilizar-se de qualquer axé, independente da fase e do signo da lua; mas completou que quando se está na parte certa dos ciclos é muito mais fácil trabalhar. Então perguntei ‘Como vocês conseguem qualquer axé?’ e ele disse que possui instrumentos mágicos em que guarda concentrados de cada energia diferente, como se fossem cápsulas de diferentes remédios.
Depois de pensarmos ‘com o que estamos trabalhando?’, precisamos organizar o calendário astrológico para termos o domínio sobre a ‘pureza’ dessa energia. Precisaríamos de um calendário lunar? Solar? Consideramos as fases, os signos ou fases+signos? Teria por base um calendário como o da bruxaria? Ou o judaico? Ou africano?
Resumindo, são muitas variáveis, muito mais do que eu citei aqui; o pior é: para cada escolha que fizermos, haverá um grupo de ‘mimimi’ porque queria outra, ou porque seu sistema de crença nos Orixás é diferente… O sistema signo/Orixá também é bem complicado, já vi até Oxóssi/Vênus e Xangô/Júpiter para você ter noção.
Bom, que pelo menos fique a reflexão, grande abraço.
Salve
Venho lendo o que vc tem postado, ainda estou digerindo. Realmente o trabalho de se adaptar, ou ajustar o conhecimento das diversas tradições é hercúleo e, às vezes, leva a conclusões meio esdrúxulas. Creio que a Umbanda é uma das correntes espirituais que mais tem condições de progredir nesse caminho. Estamos do lado direito do cérebro, onde a linguagem é não verbal, a lógica é não linear, o conhecimento é simbólico, as certezas são meio incertas.
Continue firme no caminho.
Forte abraço.
Grato! como é edificante as dúvida e mais ainda as respostas! gratidão!
Olá Colorado, poderia me responder uma questão?
Associando os quatro elementos base, quais dos quatro correspondem com cada Orixá?
No caso, no terreiro que frequento, os sete tronos base são: Oxalá, Xangô, Iansã, Ogum, Iemanjá, Oxóssi e Oxum.
Encontrei algumas referências diferentes umas das outras, gostaria de saber na sua opinião quais são as que você ou sua casa seguem
@Coloradoteus: a associação seria por “elemento preponderante”, pois cada Orixá tem um pouco de cada. Na Umbanda Sagrada se trabalha com 4 elementos primários e 3 secundários (vegetal, mineral e cristal). Dentre os 14 principais temos Yemanjá/água, Omolu/terra, Obaluayê/terra, Nanã/terra-água, Oxum/mineral-água, Oxumarê/água-mineral, Oxalá/cristal, Logunan/cristal-ar, Ogum/ar-fogo, Iansã/ar-fogo, Oxóssi/Vegetal, Obá/terra-vegetal, Xangô/Fogo-ar, Egunitá/Fogo-ar. Os que são bi-elementais estão com os elementos em ordem de preponderância.
Essa de conhecimento puro acho meio nada a ver,pois cada um aprende de um jeito,portanto cada um ensina de um jeito,e no fim é tudo a mesma coisa,e essa da confiança ter um paradoxo com erro para se chegar a um aprendizado,na verdade não é um paradoxo,é um o caminho do outro,a teimosia que leva ao aprendizado,o que está em cima é o que está em baixo,o único erro que existe apenas enquanto erro e não finalidade é o ego,que é o que faz os julgamentos,e no caso,é o que nos livra deles….