Em outubro de 2001, a jovem Aline Silveira Soares saiu de Guarapari, no interior do Espírito Santo para a cidade de Ouro Preto, em Minas Gerais. Com apenas a roupa do corpo e alguns trocados no bolso, seu objetivo não era visitar as esculturas de Aleijadinho ou passear pela arquitetura colonial considerada pela UNESCO como um dos patrimônios da humanidade. Além de ser o mais belo monumento ao ciclo do ouro colonial, Ouro Preto também é uma cidade universitária, sede da Universidade Federal de Ouro Preto e coalhada de repúblicas estudantis, muitas delas com décadas de existência e tradições. Uma dessas tradições é a Festa Do Doze, que em todo 12 de outubro reúne alunos e ex-alunos da UFOP para beber e curtir nas repúblicas e ruas da cidade. Era para essa festa que Aline seguia, acompanhada apenas de uma amiga, Liliane, e sua prima Camila Dolabella.
8 anos depois, em 3 de julho de 2009, Camila Dolabella entrou na sala do júri do Fórum de Ouro Preto para ser interrogada. Após ter amargado quase um ano na prisão, em 2005, e ter visto dois habeas corpus serem negados, Camila finalmente estava sendo julgada pela acusação de homicídio qualificado. A vítima seria sua prima Aline, que segundo a promotoria, teria sido assassinada por Camila, Edson Poloni Aguiar, Cassiano Inácio Garcia e Maicon Fernandes, todos os moradores da república Sonata, onde as jovens se hospedaram para a Festa. A causa do crime seria um jogo de RPG, que Aline teria perdido, sendo punida com a morte… mais especificamente uma morte ritual, de acordo com preceitos satânicos.
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O Caso de Ouro Preto está fadado a fazer parte dos anais do direito no Brasil. Não só pela violência do assassinato: Aline Silveira foi descoberta na manhã de 14 de outubro morta, nua, sobre um túmulo no cemitério Nossa Senhora das Mercês, com 17 facadas no corpo. A causa da morte seria engorjamento, uma facada fatal no pescoço. Mas o que se destaca é a completa incompetência, ignorância, má fé e os abusos perpetrados por aqueles que deveriam ser os fiadores da justiça no caso: o Ministério Público e a polícia de Ouro Preto.
Desde o começo a marca da investigação em Ouro Preto foi a combinação de inépcia e sensacionalismo. O caso caiu nas mãos do delegado Adauto Corrêa, na época sendo investigado por atentado violento ao pudor e coerção no curso de processo. Corrêa, este exemplar da probidade administrativa, não demorou para arranjar suspeitos para o crime. Logo arrolou como acusados em seu inquérito a prima de Aline e três jovens estudantes da república onde ela tinha ficado temporariamente hospedada. Em uma inovação do procedimento policial normal, o principal elemento incriminatório apontado pelo delegado não era a arma do crime, mas sim livros e postêres encontrados na república Sonata. Incluindo aí livros de RPG.
O RPG, ou role-playing game, foi inventado em 1974, nos Estados Unidos. Uma evolução dos então populares jogos de estratégia de tabuleiro, o RPG basicamente consiste de um grupo de jogadores que, trabalhando em conjunto e usando regras de jogo pré-definidas, tenta superar desafios propostos por um Mestre, responsável por narrar a história e organizar cada sessão de jogo. Com sua popularização, o jogo passou dar cada vez maior ênfase a interpretação, diminuindo o foco na estratégia e privilegiando o desenvolvimento de personagens. Uma das características principais do RPG é seu caráter cooperativo: os jogadores e o Mestre devem trabalhar em conjunto para criar uma boa história e garantir a diversão de todos. RPG não é competitivo, o que o tornou um jogo ideal para ser aplicado em processos educacionais em todo mundo. RPG também não é um jogo possível de se “perder” (uma vez que não há competição) e tampouco possui laços com satanismo.
Nenhum desses fatos importou para o delegado Adauto Corrêa. Desconhecendo os fundamentos do jogo de RPG, movido por intolerância cega e, talvez pressionado para apresentar resultados o mais rápido e espalhafotosamente possível (afinal de contas, até outro dia o principal réu nas páginas policiais era ele próprio) Corrêa decidiu que Camila, Edson, Cassiano e Maicon eram os responsáveis pelo crime. Corrêa estava suficientemente seguro de sua conclusão para poder se dar ao luxo de passar por cima e deixar de lado toda uma série de evidências, investigações e exames que seriam necessários para propriamente determinar o responsável pelo assassinato de Aline.
Corrêa, por exemplo, não levou em consideração o fato de que Aline mal tinha tido contato com Edson, Maicon e Cassiano. Apesar de estar hospedada na república deles, todos testemunhos concordavam que ela só dormia por ali, passando a maior parte do tempo pela cidade ou em festas em outra república, a Necrotério. Lá, testemunhas afirmaram que Aline passou tempo, isso sim, aos beijos com Fabrício Gomes, na época mal-afamado na cidade por um suposto envolvimento com o tráfico de drogas. Mais ainda, Fabrício Gomes e Aline Silveira teriam sido vistos em frente ao cemitério onde a jovem seria encontrada assassinada na manhã seguinte. Quando Camila Dolabella alertou o delegado Adauto Corrêa sobre o ocorrido, adicionando que Fabrício teria sido visto no dia seguinte à morte de Aline vestindo uma camiseta manchada de sangue, a resposta não foi promissora. Corrêa simplesmente anunciou que não queria saber de mais detalhes, pois ele já sabia quem eram os culpados.
Aline Silveira Soares foi localizada nua, com os braços abertos e pernas cruzadas, ao lado de roupas cuidadosamente arrumadas no chão, entre elas uma blusa coberta de esperma. O corpo tinha sido propositadamente arranjado dessa forma, fato evidenciado por uma trilha de sangue no local. Analíses toxicológicas revelavam traços de maconha no sangue da vítima. A investigação sob o comando de Adauto Corrêa não encontrou digitais dos suspeitos no local ou na arma do crime, econtrada próxima ao corpo. Também não comparou o esperma encontrado em Aline com o dos acusados. Na verdade isso seria impossível, uma vez que os policiais negligenciaram a coleta de material genético antes que ele fosse contaminado ou se deteriorasse. Tampouco foram localizadas drogas na posse dos acusados ou na república Sonata. Mas nada disso importava ao delegado Adauto Corrêa. Ele podia se dar ao luxo de desprezar evidências materiais e os testemunhos que contradiziam sua teoria. Afinal de contas, seu faro investigativo encontrava provas contra os quatro acusados em vários elementos considerados corriqueiros por um olhar não treinado. O fato de que Maicon Cassiano chegara a república Sonata naquela noite sem camisa, era evidência clara de que ele estaria fantasiado como um personagem de RPG. E, logo, era assassino. Embora não houvesse nada que indicasse que os acusados tinham passado pelo cemitério das mercês naquela noite, objetos tinham sido encontrados no local que poderiam ter servido num ritual. E se tinha havido ritual, os acusados tinham participado, afinal, para o delegado, eram todos obviamente satanistas. Outro elemento contundente contra os réus foi o fato de que eles terem limpado a república durante o curso investigação. Ignore-se que isso ocorreu quase uma semana após o crime, e que a polícia não tinha dado nenhuma instrução para que nada fosse alterado no local, apesar dos réus terem perguntado já nas primeiras horas do desaparecimento de Aline se deveriam preservar tudo intocado na república. Mas esse era justamente um exemplo do elemento mais incriminador de todos: o interesse dos jovens em desvendar o assassinato e ajudar a polícia só podia ser outra prova gritante de sua culpa. Como o delegado Adauto Corrêa sabia, criminosos sempre tentam agir como inocentes para despistar a polícia. Como o comportamento de Camila, Edson, Maicon e Cassiano denunciava a mais completa inocência, eles só poderiam ser culpados. Todos os quatro, apesar de que o laudo técnico deixava claro que as facadas em Aline tinham sido feitas por uma única pessoa.
A lógica tortuosa, irresponsável e perversa de Adauto Corrêa não avançou sem problemas. Após concluída a investigação, que indiciava os quatro jovens pelo assassinato, o caso chegou às mãos do promotor Edvaldo Pereira Júnior, que reconheceu prontamente a impossibilidade de dar seguimento aquele processo. Baseado em suposições, preconceitos e tentativas descabidas de fazer os fatos se conformarem à teoria (das mais mirabolantes), Pereira Júnior condicionou o seguimento do caso à realização de 17 diligências, que providenciassem alguma prova cabal, ou ao menos aceitável, sobre a culpa dos réus ou a identidade do assassino de Aline. Adauto Corrêa não realizou nenhuma dessas diligências, dando o caso por encerrado. Pereira Júnior tentou recorrer à Secretaria de Segurança Pública para afastar o delegado de seu cargo. Enquanto isso políticos oportunistas aproveitavam o caso para se promover, agitando a opinião pública e alimentando a indignação com boas doses de desinformação e mentiras. Um vereador chamado Bentinho Duarte passou uma lei proibindo o RPG em Ouro Preto. O promotor Fernando Martins iniciou processo contra as editoras Devir Livraria e Daemon tentando proibir a publicação de livros citados na investigação do caso. A mídia convencional se absteve de realizar qualquer trabalho jornalístico digno do nome e, seguindo a linha Fordiana de que se o factoide é melhor que o fato publica-se o factoide, deu ampla publicidade à teoria barroca de Corrêa, ao mesmo tempo que desprezava as hipóteses contraditórias. Apesar de se referirem aos réus como “suspeitos” ao invés de “assassinos”, o esforço de “imparcialidade” dos jornalões nunca atacou diretamente as óbvias irregularidades da investigação do caso nem contestou o caráter delirante da acusação. Enquanto isso, os quatro réus tentavam levar suas vidas, marcados pelo estigma de serem suspeitos de homicídio. Edson foi ameaçado de morte e trancou a faculdade. Maicon e Cassiano permanecerem em Ouro Preto, apesar da constante antagonização e assédio por parte de moradores da cidade. Camila retornou para Guarapari, onde passou a ser hostilizada pela família. Órfã de mãe, ela contou apenas com o apoio do pai durante todo o processo.
Em 2004, após três anos em que o caso esteve parado, ele saiu das mãos de Edvaldo Pereira Júnior e passou para a promotora Luíza Helena Trócilo Fonseca. Diferente de Pereira Júnior, que tinha se recusado a denunciar um processo tão eivado de inconsistências e sandices, Trócilo da Fonseca decidiu dar continuidade ao caso. Em 2005, Camila Dolabella e Edson Poloni foram presos. Quatro anos tinham se passado desde a morte de Aline, e nenhum dos acusados tinha apresentado qualquer atitude desabonadora até então. Edson saiu da cadeia após seis dias, sob efeito de uma liminar, mas Camila passou a maior parte daquele ano na detenção. Foi só quando o caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça que a pena de prisão dos réus foi considerada descabida e lhes foi dado o direito de aguardarem o julgamento me liberdade, apesar das alegações do Ministério Público mineiro de que se tratavam de “contumazes jogadores de RPG, em todas suas modalidades“. Note que, até então, continuavam inexistentes qualquer evidência concreta de responsabilidade dos réus no assassinato de Aline Silveira. Eles estavam sendo presos e acusados por que tinham lido livros.
O caso permaneceu fora da mídia por alguns anos. Enquanto os réus tocavam a vida, a promotoria construía o caso e se preparava para o julgamento. Em 2006 a promotora Luíza Helena Trócilo Fonseca encontrou tempo para mandar apreender todas as edições de número 09 da revista Observatório Social, que denunciava na capa o uso de trabalho infantil nas mineradoras de Ouro Preto. A promotora se preocupava que as fotos expunham as pobres crianças, e afetavam negativamente a boa imagem da região… Mas, enfim. Em 2008 foi decidido que o caso de Aline Silveira seria levado à júri popular. Em 3 de julho de 2009, Camila Dolabella, Edson Poloni Lobo de Aguiar, Cassiano Inácio Gracia e Maicon Fernandes foram finalmente julgados pela acusação de homicídio qualificado. Na falta de prova contundente contra eles, a acusação optou por lançar novo ineditismo jurídico no direito brasileiro, ao sustentar que “o álibi dos réus era fraco”. Ou seja, não cabia à promotoria provar que eles tinham matado Aline Silveira. Eram os quatro estudantes que deveriam mostrar que não tinham cometido assassinato, ou serem presos. Contra eles pesavam diversas evidências “incriminadoras”: seus gostos musicais, cinematográficos, o jeito como se vestiam e seus hobbies. Em 5 de julho de 2009, o júri os declarou inocentes.
Não se tratou aqui apenas da óbvia falta de qualquer prova contra eles. O decisão final dos sete jurados foi de que, efetivamente, os quatro réus “não concorreram, de qualquer forma, para prática do crime”. Os jovens que tinham passado quase uma década sendo coagidos, assediados, ameaçados, difamados e perseguidos não eram os assassinos de Aline Silveira Soares.
Teorias sobre o que realmente aconteceu não faltam, e já circulavam desde os primeiros dias do caso. A mais verossímel é de que Aline teria se envolvido com uma negociação de drogas, durante a Festa dos Doze, e, sem dinheiro, teria concordado em manter relações sexuais como pagamento. Não há indícios de violência sexual em seu corpo, o que demonstra a consensualidade do ato, comprovado pela perícia necrológica. Como a primeira facada em Aline foi em suas costas, tudo indica de que ela foi atraiçoada pelo seu parceiro de negócios. Este permanece solto e impune.
Os interesses escusos, a ignorância e o preconceito é que são os verdadeiros criminosos no caso de Ouro Preto. Foram eles que permitiram que por uma década quatro jovens inocentes fossem perseguidos injustamente, sendo até mesmo privados de liberdade e forçados a fazer inúmeros e pesados sacrifícios pessoais. Foram eles que deram ao verdadeiro assassino de Aline Silveira, um homem brutal e cruel, um passe livre para permanecer à solta. Em uma sanha cega e irresponsável de achar um culpado a justiça de Ouro Preto falhou miseravelmente, e duas vezes: não puniu o culpado e vitimou mais inocentes. Esse tipo de atitude, ignorando procedimentos básicos do processo legal, atropelando direitos civis e apelando para o ódio e a intolerância como elementos de incriminação, não é compatível com o Estado de Direito. Eu não contei essa história aqui hoje para inocentar Camila, Edson, Cassiano e Máicon. Coube ao tribunal do júri fazer isso. Mas para tomar a atitude digna e necessária de todo cidadão: exigir a imediata investigação e punição dos responsáveis pelo caso do assassinato de Aline Silveira Soares. Sua irresponsabilidade e malícia, sua truculência e abuso de poder não podem, nem devem ser perdoadas, nem as sérias acusações de acobertamento dos verdadeiros responsáveis devem ser relevadas. Isso não pode ser permitido.
Os inocentes estão, enfim, livres. É mais que hora de punir os culpados.
Por Felipe de Amorim
Respostas de 19
Foda isso. Deprimente como uma mente embotada de preconceitos pode ficar tão “clara”. Tanto que até ofusca..
Mas Marcelo, Você poderia dizer quais os volumes que tentaram proibir a publicação nas Editoras?
Sobre o Fato, acha que pode ter sido talvez alguma prática magistica séria(que eu duvido, mas enfim..)?
Enriquecedor pro blog esse texto
Vlw
esse caso foi um dos mais escrotos que já vi…. e pior, queimou o filme do RPG no Brasil inteiro… dava raiva ver a cara de satisfação dos crentes do meu bairro com quem diz: “nao avisamos?”
Mais um caso dentre os 90%+ casos de assassinato que NÃO são resolvidos no Brasil. A única diferença deste é que colocaram a culpa nos livros de RPG… O pior é que a maioria ainda acha que os jogadores tinham culpa, mesmo os que gostam de RPG devem achar ainda hoje que eram “jogadores loucos” ou algo do gênero.
Obrigado por compartilhar o texto, o que arrefece o desejo de justiça imediata para os envolvidos ( assassino e as ‘otoridades du braziu’ ) é saber que eles atrairão semelhantes que praticarão as mesmas coisas ou piores com eles…
É realmente triste ver como a ignorância humana é capaz de se manifestar.
Isso tudo somado ao sofrimento de muitos inocentes pela impunidade dos reais culpados, e isso inclui a ma fé dos que guiaram as ‘investigações’.
Acusar qualquer rockeiro que se vista de preto e jogue RPG de satanistas, e pior ainda, de assassinos é a pior infâmia, enquanto os de terno continuam roubando e matando e ninguém faz nada.
Luxuria, medo de perder o stigma do poder e suas vertentes é uma das mais tristes formas de cegueira. Pérolas aos porcos como dizem, poder a quem não tem como usar para o bem comum, sua real função.
A unica forma de ação usando poder é pelo bem do povo, unica e exclusivamente.
Qualquer outra forma de manifestação é maléfica, e deve ser punida. Uma pena que nosso país ainda seja governado por monstros desse naipe. O povo deve ser ensinado a melhor escolher seus governantes.
Texto excelente! Felipe, você é um ótimo escritor! o texto tem uma ótima condução e foi muito bem argumentado.
Fiquei curioso: quais eram os livros de RPG envolvidos no caso?
Vejo isso como mais que um caso de incompetência. Vejo como injustiça. Gostaria um dia de acreditar , que no Brasil , e em outros lugares, a justição não falha. Não é o que estamos percebendo nesses últimos tempos. Quem poderia levar adiante a condição de reabertura do caso?
Como diria o Boris Casoi: Isso é uma vergonha.
É triste saber que casos como esse acontecem no Brasil, onde inocentes são acusados e ate presos injustamente para que poder acobertar os erros de quem estar, de certa forma, no poder e com isso acaba deixando o verdeiros culpado livre para cometer mais crimes.
Um país que gosta de autoproclamar “emergente” ainda tem muito o que fazer, não é so ter um IDH alto ou ter os cofres cheios de dinheiro que pode se chamar um país de desenvolvido, todos os seus sistemas tem que funcionar bem, a saúde, educação e a justiça se um desses não estar como deveria os nossos governantes tem a obrigação de “concertar”.
Ninguem pode recuperar o que esses jovens passaram durante tanto tempo ate que fosse realmente mostrada a verdade, se a justiça fosse realmente justiça coisas como essa nunca iria acontecer.
Torço e faço o que posso para poder melhorar o país onde vivo e que tanto amo, mas é dificil quando sabemos de casos como esse seguir em frente peço a Deus que nos ajude, para que um dia possamos olhar para historias como essas e poder disser que é passado e como tudo mudou, mas ate lá ainda temos muito o que fazer.
“O promotor Fernando Martins iniciou processo contra as editoras Devir Livraria e Daemon”
Ate a Daemon foi processada no meio dessa coisa toda.
Virou carta na manga da midia relacionar certos crimes com satanismo, não deveria ter um criterio mais rigido dizendo tal e tal coisa é um ritual satanico e se não tem esses elementos então não ha ligação ? ta ai nosso grande estado laico
Coisas do Brasil. Condenam primeiro, perguntam depois, entretanto, a “condenação social” sempre prevalece. É mais fácil condenar que procurar se informar. Isso com relação a qualquer coisa que se difere um pouco da linha de “normalidade”. Qualquer diferente é sempre um bode expiatório.
Todas as vezes que leio sobre esse caso, o sentimento de revolta só faz crescer, de como o oportunismo, preconceito e sensacionalismo destruíram a vida de quatro jovens. É quase um caso da Escola Base mas de proporções mais trágicas.
Tem um detalhe factual que o texto não mencionou: o assassinato ocorreu em época de Festa das Doze – data em que as repúblicas de Ouro Preto se organizam para a promoção de festas, como o nome sugere, e da ampla ingestão de álcool e drogas generalizada. Ou seja: uma época propícia para o crime, não?
Sem contar a investigação malfeita, a prova técnica existente DESPREZADA, a total falta de coerência das acusações (não falo mais porque não vi os autos e sempre acho perigoso falar de um processo sem consultá-lo, mas pelo que vazou na mídia, é o que dá pra inferir). E claro, de várias pessoas que precisavam de um caso bombástico para cobrir seus próprios crimes, e da mídia que precisa vender sangue. O que seria mais interessante: um crime de violência sexual qualquer ou um ritual satânico provocado por livros misteriosos dessa coisa imoral chamada RPG?
Hoje, lendo esse texto, me caiu a ficha para os dois azares dos acusados. O primeiro e mais óbvio, estarem no lugar errado na hora errada. O segundo, serem pobres. Certamente não puderam contratar grandes criminalistas para defendê-los, ou usarem de recursos para montarem um cenário digno do CSI (como os bem apossados Nardoni puderam fazer), pois caso o tivessem feito, esse processo não iria para frente. Tiveram sorte de saírem livres na passionalidade fabricada do júri.
A vida desses quatro jovens, tudo o que eles sofreram, não pode ser devolvido (eu bem que gostaria que eles ingressassem com um bom processo de danos morais contra o Estado, apesar de que isso demoraria alguns séculos para sair) e o verdadeiro assassino está solto e impune.
Não tem o que dizer mais.
PQP. Esse é o tipo de coisa que me deixa p… da vida. Não é à toa que a polícia brasileira esclarece um número ridículo – deixa eu repetir, RIDÍCULO – de crimes. Só nos casos de homicídio, mais de 90% permanecem insolúveis! É o cúmulo da ignorância e incompetência. Pense bem, se você fosse um empresário e seus funcionários apresentassem a taxa de sucesso que a polícia brasileira apresenta, você acharia normal e se conformaria?
Um dos maiores erros de pessoas no ramo do Direito – e nisso os delegados se incluem – é querer fazer suposições, querer “acreditar na ‘intuição'”, “no próprio taco” em detrimento dos fatos, do direito, da persuasão racional.
Eles acabam se contaminando com suas próprias crenças limitantes, superstições e preconceitos.
Sem falar que alguns adoram a exposição que isso dá na mídia. Algum lembra do caso da Escola Base?
Ainda bem que as pessoas escolhidas do juri estavam um pouco lúcidas.
Do jeito que esse post foi contato me lembrei daquele livro/filme chamado “O Pagador de Promessas”, no sentindo de que enquanto um está sofrendo há vários deliberadamente procurando se beneficiar do caso, que é marcado por intolerância, falta de diálogo, etc.
Lendo sobre o caso, a gente tenta procurar no texto o que é pior.
A Justiça brasileira é uma vergonha, sustentada por poucos profissionais honestos e de respeito.
Os políticos dos outros dois Poderes se mantém porque os juízes, os verdadeiros governantes do país desde que ele foi descoberto, permitem estas barbaridades medievais.
Muito triste.
Sinceramente, eu era praticamente uma criança, mas já jogava. Lembro bem de tudo isso, das reações das pessoas, das hostilidades, discriminações mesmo. Ainda mais numa época onde a mídia hegemônica era a única até pra quem não a aceitava.
Depois disso, meus grupos (que eram dois) começaram a jogar meio escondido. Alterávamos os livros, colocando por dentro de outros, rolando dados fora de vista, deixando fichas presas em cadernos… Nem quando o pirralho teve aquela epilepsia com Pokémon, que quiseram proibir, houve tanta repercussão. Foi o mal de começar a ser divulgado de maneira negativa, fora do tempo. É como Duke Nukem, por exemplo, que hoje não causa tanto impacto como antes.
Mas é isso mesmo. O RPG me fez ser uma pessoa que não raciocina bem, ter gostos iguais ao gado, ASSASSINO principalmente, e claro, estudar essa coisa deplorável aos bons costumes que é o ocultismo.
A mentalidade de todos envolvidos em promover a justiça no Brasil, seja neste ou em qlq caso, é corrompida por valores distorcidos e arcaicos. É revoltante ver que em poucos momentos da história foi possível ver pessoas sensatas no comando do povo, mto pelo contrário, a ignorância e a perversão prevalecem e julgamentos de moral são feitos baseados nas fantasias psicóticas que o povo, desprovido de capacidade crítica, engole como se fosse a verdade absoluta. A verdade é que é mto fácil e prazeroso culpar esse jovens apreciadores de uma cultura alternativa, aposto como o delegado regozija-se na sua cadeira, feliz por ter fodido a vida “desses satanistas”.
Eu me lembro até da reportagem da globo na época mostrando a capa do livro Vampiro: A Máscara.
Esse caso tem que ser reaberto imediatamente, esse assassino não pode continuar a solta na sociedade vivendo como se nada tivesse acontecido. Esse assassino tem que ser encontrado e confessar esse crime brutal porque um monstro desses não pode viver em sociedade, e também os irresponsáveis que foram negligentes com o caso também tem que pagar. Só de pensar que no meu dia a dia eu posso (sem saber) me deparar com um assassino desses já me dá calafrio, quando li essa matéria meu estômago embrulhou e tive náuseas e até chorei de constatar tanta impunidade, injustiça, preconceito, discriminação, ignorância, incompetência, burrice, imparcialidade e alienação. Na época eu estudava em Ouro Preto e também morava em uma República e presenciei tudo o que ocorreu, conheci os acusados Maicon e Cassiano e só de olhar para eles sem precisar de conhecer já dava para saber que eles não tinham nada haver com o caso. Mas como a maioria dos estudantes vivia alienada dos acontecimentos só queria saber de festa e rock (como a maioria dos estudantes) e não dava nem notícia do que se passava ou se dava mantinha uma postura indiferente. Eu acho que os estudantes daquela época deveriam ter se juntado, fazer uma manifestação sei lá fazer alguma coisa mas a maioria foi conivente. Poderia ter acontecido com qualquer um, de ser acusado injustamente até eu mesmo, para servir de bode expiatório é só estar na hora errada e no local errado!!!