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O Senhor dos Exércitos
As Cruzadas não se prestaram a “combater infiéis” somente na Terra Santa. No caminho até lá, houve algumas outras batalhas da Igreja dentro da própria Europa. Bem, “batalha” talvez não seja a melhor definição, e sim “massacre”.
Em 1209 a cidade de Béziers era habitada por cerca de 60 mil pessoas, e dentre elas havia muitos seguidores do catarismo, uma vertente mística do cristianismo que desagradava a Igreja. O problema é que nem todos dentro dos seus muros eram cátaros, o que gerou um questionamento muito pertinente de um dos comandantes do exército francês ao representante do Papa, quando eles se preparavam para invadir a cidade com uma força militar vastamente superior. O comandante perguntou: “Mas senhor, nesta cidade encontram-se vivendo em paz cristãos, judeus, árabes e cátaros. Como vamos saber quais são os inimigos?”. E o representante assim o respondeu: “Matem todos; Deus escolherá os seus!”. Béziers foi dizimada, mas não se sabe se Deus conseguiu encontrar os seus…
A ideia da “guerra do Bem contra o Mal” é poderosa e sedutora, e por isso mesmo sempre agradou aos Imperadores, Reis e Papas. De todas as ilusões que se interpõe a verdade inconveniente de que, como muitos já devem saber, todas as guerras do mundo se dão quase que unicamente pelo desejo da conquista de territórios e riquezas, a lenda do Bem contra o Mal é a mais simples de se compreender, e a mais capaz de arrebatar uma grande massa de ignorantes. Nesse tipo de guerra não há dor na consciência em dizimar inocentes, nem mesmo em estuprar mulheres e crianças, pois fica pré-estabelecido que elas são como demônios sem alma, fruto de um suposto exército comandando pelo Mal.
No entanto, talvez até mesmo uma criança já seja capaz de se questionar: “Ora, mas se Deus criou a todos nós, como ele pode ser o Senhor de um único exército?”. Acredito que a resposta seja óbvia, e este meme é uma tentativa de trazer essa reflexão à tona.
Buda, e Budai…
Uma curiosidade: na imagem cima não temos o Buda Sidarta Gautama, mas Budai, uma divindade chinesa que é costumeiramente confundida com Sidarta. Obviamente que o Buda Gautama provavelmente nunca foi muito “gordinho”, até mesmo porque chegou a praticar jejuns extremos, e após atingir a iluminação, aos 35 anos, passou os próximos 45 anos de sua vida viajando pelos arredores do Nepal.
A vida de Buda se parece muito mais com a vida de um místico andarilho, como Jesus de Nazaré, que viajou a pé pelos arredores de sua cidade natal, ensinando a todos com quem cruzava. A diferença é que Buda não é conhecido por realizar milagres, como ressuscitar mortos, curar leprosos ou transformar água em vinho. Em todo caso, os ensinamentos de Buda foram tão impactantes quanto os de Jesus, o que é atestado pelo fato de terem igualmente sobrevivido por mais de dois mil anos, sem terem sido esquecidos.
No entanto, não é difícil encontrar pessoas que, por total desconhecimento da história de vida de Sidarta, creem piamente que ele passou a vida toda meditando ao lado de uma árvore, e não ajudou ninguém. O fato de sua imagem ser costumeiramente confundida com a imagem de Budai talvez ainda ajude a perpetuar essa lenda do “monge gordinho que nunca saiu do lugar”.
Tal visão, é óbvio, não poderia estar mais distante da realidade. Desde o momento em que atingiu a iluminação, é dito que o Buda passou o restante de seus dias tentando auxiliar aos demais a atingir esse mesmo grau de consciência da realidade, e de desapego para com tudo o que existe somente no fluxo do tempo.
Se há um lugar em que Sidarta passou boa parte da vida, não foi na sombra de uma árvore, mas na própria eternidade.
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Crédito das imagens: Raph/Google Image Search
O Textos para Reflexão é um blog que fala sobre espiritualidade, filosofia, ciência e religião. Da autoria de Rafael Arrais (raph.com.br). Também faz parte do Projeto Mayhem.
Ad infinitum
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Uma resposta
Bonito desfecho: “Se há um lugar em que Sidarta passou boa parte da vida, não foi na sombra de uma árvore, mas na própria eternidade.”
Seguirei lendo, parabéns pela iniciativa.
@raph: Obrigado 🙂