A Hidra de Lerna – Combate aos Vícios
Hércules teve de destruir um monstro de nove cabeças que soltavam fogo: oito renasciam quando cortadas e a nona era imortal. O herói decepou as oito cabeças enquanto um amigo as cauterizava com fogo. A nona foi enterrada, mas vigiada eternamente por Hércules. “As cabeças simbolizam os vícios. Lutamos contra eles, mas, como são imortais, se não estivermos atentos, renascem. Além dos vícios físicos, como drogas e álcool, temos de combater os vícios éticos, como a ganância.
– Os Doze Trabalhos de Hércules e a iniciação
– O Leão da Neméia
Mitologia
Conta a lenda que na antiga terra de Argos ocorreu uma seca. Amímona que reinava nessas terras, procurou a ajuda de Netuno. Este recomendou que se batesse numa rocha, e quando isto foi feito, começaram a correr três correntes cristalinas; mas logo uma hidra fez ali a sua morada.
O mestre disse a Hércules: “Para além do Rio Amímona, fica o fétido pântano de Lerna, onde está a hidra, uma praga para as redondezas. Nove cabeças tem esta criatura, e uma delas é imortal. Prepara-te para lutar com essa asquerosa fera e não penses que os meios comuns serão de valia; se uma cabeça for destruída, duas aparecerão em seu lugar.”
Hércules estava ansioso e antes de partir, seu Mestre ainda lhe disse: “Uma palavra de aconselhamentos só posso dar. Nós nos elevamos, nos ajoelhando; conquistamos, nos rendendo; ganhamos, dando. Vai, oh filho de Deus e filho do homem, e conquista.”
Chegando ao estagnado pântano de Lerna, que era um charco que desanimava quem dele se aproximasse e cujo mau cheiro poluía toda a atmosfera em um raio de sete milhas; Hércules teve que fazer uma pausa pois o simples odor por pouco o derrotava. As areias movediças eram uma ameaça e mais uma vez Hércules rapidamente retirou seu pé para não ser sugado para dentro da terra que cedia. Finalmente ele descobriu onde se ocultava a hidra.
Numa caverna de noite perpétua vivia a fera, porém não se mostrava e Hércules inutilmente vigiava. Recorrendo a um estratagema, ele embebeu suas setas em piche ardente e as despejou directamente para o interior da caverna onde habitava a horrenda fera. Uma enorme agitação se seguiu e a hidra com as suas nove e zangadas cabeças emergiu, chicoteando a água e a lama furiosamente. Com três braças de altura, algo tão feio como se tivesse sido feito de todos os piores pensamentos concebidos desde o começo dos tempos. A hidra atacou, procurando envolver os pés de Hércules que saltou e lhe deu um golpe tão severo que logo decepou uma das cabeças, mas mal a horrorosa cabeça tocou o solo, duas cresceram em seu lugar. Repetidamente Hércules atacou o monstro, mas ele ficava cada vez mais forte. Então Hércules lembrou-se das palavras do Mestre: “nós nos levantamos ajoelhando”.
Pondo de lado a sua clava, Hércules se ajoelhou, agarrou a hidra com suas mãos nuas e ergueu-a. Suspensa no ar, a sua força diminuiu. De joelhos, então, ela sustentou a hidra no alto, acima dele, para que o ar purificado e a luz pudessem surtir o seu efeito. O monstro, forte na escuridão e no lodo, logo perdeu a sua força quando os raios do sol e o toque do vento o atingiram. As nove cabeças caíram, mas somente quando elas jaziam sem vida Hércules percebeu a cabeça mística que era imortal. Ele decepou essa cabeça e a enterrou, ainda sibilante, sob uma rocha.
Simbologia
Hércules foi incumbido de doze trabalhos, dentre eles, matar Hidra, o monstro de nove cabeças que trazia pânico à cidade de Lerna. Mas antes de enfrentar o monstro, Hércules recebe uma mensagem de seu mentor: – ” É ajoelhando que nos levantamos; é nos rendendo que conquistamos; é desistindo de algo que o ganhamos”.
Hércules parte em busca do monstro que se esconde numa caverna escura, de noite perpétua, à margem de um pântano de águas estagnadas; e simboliza uma parte de nós que permanece oculta e resiste à iluminação.
Representa o nosso interior ruim, nossas paixões e defeitos, ambições e vícios, o que existe de ruim dentro do nosso mundo interior. Enquanto a hidra, que representa esse monstro interior, não for dominada, enquanto nossas vaidades, futilidades e ostentações não forem dominadas, as cabeças continuam crescendo cada vez mais.
Hércules chega ao covil da Hidra e atira flechas flamejantes ao esconderijo do monstro. Indignada, Hidra emerge do seu covil com ímpeto vingativo – da mesma forma, também nos sentimos assim quando situações nos obrigam a confrontar a besta que existe em nós ou a besta que existe nas pessoas à nossa volta.
Hércules tenta esmagar as cabeças de Hidra mas cada vez que corta uma cabeça outras surgem – da mesma forma quando tentamos destruir nossas emoções bestiais, elas continuam aparecendo. Finalmente Hércules se lembra da mensagem de seu mentor: “é se ajoelhando que nos levantamos”.
Hércules se ajoelha no pântano e levanta o monstro á luz do dia e ela perde seu poder. Então ele corta-lhe as cabeças que não renascem mais. Porém nada disso acontece, senão enfrentarmos o lado bestial que vive em todos nós.
Caminho de Iniciação
A segunda tarefa encomendada à Hércules foi matar a Hidra de Lerna, o monstro simbólico de origem imortal dotado de nove cabeças ameaçadoras que voltavam a nascer logo após serem decepadas. A Hidra polifacética representa a mente e seus defeitos psicológicos. Quando o Iniciado que subir à Morada dos Arcanjos – o Plano Mental Superior – primeiro deve descer aos infernos de Mercúrio.
Como diz o mito, sempre que Hércules cortava uma das cabeças da Hidra, ela voltava a brotar, tornando a tarefa impossível. Assim como Arjuna é auxiliado por Krishna, também Hércules é auxiliado por Iolau (IAO, IEÚ ou JEÚ) – o qual aconselha Hérculesa queimar as cabeças após cortá-las para não renascerem. Isso quer dizer que não basta compreender um defeito; é preciso ir além e capturar o profundo significado do mesmo; do contrário, eles voltam a renascer.
Os defeitos psicológicos eliminados nos infernos da Lua, o Astral Inferior, certamente possuem ramificações nos mais diversos níveis mentais. Eliminar as cabeças da Hidra da Mente é possível quando, após decepá-las forem cauterizadas com o fogo da alquimia sexual. Portanto, compreendido um defeito, deve-se durante o ato alquímico suplicar à Divina Mãe para Ela elimina-lo até suas raízes mais profundas. Goethe, nesses momentos exclamava:
“Virgem pura no mais belo sentido
Mãe digna de veneração
Rainha eleita por nós
de condição igual aos Deuses”.
Anelando morrer em si mesmo, durantes as Bodas Alquímicas, o iniciado alemão exclamava:
“Flechas transpassai-me;
lanças, submetei-me;
maçãs, feri-me.
Tudo desapareça,
desvaneça-se tudo.
Brilhe a estrela perene,
foco do eterno amor.”
Biblioteca de Antroposofia.
Respostas de 15
Belíssimo Texto! Ansioso pelo próximo, ha tempos sinto falta de uma serie com essa por aqui. Parabéns pelo trabalho, sucesso é a única possibilidade!
Olá!
As causas dos nossos vícios tem a ver c nosso signo lunar?
Liiiiiiiiiindxu *-*
Valeu a pena tudo que já li aqui sobre símbolos.
Fiquei extasiado ao ler. É como se uma luz deslumbrante brilhassem a medida que fui lendo.
Muito bonito
Usar um contexto fantasioso para falar sobre o cotidiano é uma das coisas que acho mais belas da arte humana. Seja ela mitologia, religião, folclore ou literatura de fantasia. Exagerando um pouco, chega a dar uma dor no peito quando alguém pega a bíblia e com base nela teima que, por exemplo, o mundo só tem três mil anos de existência ou quando, por outro lado, alguém diz ser ridículo uma cobra falar. Acho que está faltando no povo imaginação. Só isso para explicar essa incapacidade em enxergar algo que não seja ao pé da letra.
Todos os mitos antigos tem relação com alquimia, mas agora fiquei pensando bastante aqui ao ler essa série de posts – que é muito boa. FMA Brotherhood tem alguma pegada assim também? Fiquei pensando como Lust morreu com fogo, Envy após declarar sua inveja….
Ótima série de textos, estou gostando muito
DD, você pretende retomar sua série de colunas sobre História/Ocultismo que você tinha no S&H? Gostava muito delas.
Abraços
Olá Del Debbio,
Obrigada pelo belo texto, gosto da literatura por isso, quanto mais vezes você lê um texto, aprendemos algo de outro ângulo, algo novo, vemos o que talvez não enxergávamos, e assim vai…afinal não somos mais o mesmo quando começamos,quando estamos no um terço, muito menos no meio ou então quando terminamos de ler um texto ou livro. E muito menos seremos quando relermos… E isso é fantástico.
Esse texto respondeu também a uma pergunta que tinha lhe feito.
Bom, não vou dizer que continue assim, mas que simplesmente apenas continue transformando-se e evoluindo nesse seu maravilhoso caminho.
Abraço! : )
O signo de cancer esta relacionada a essa historia, nao? Qual a simbologia dele?
Olá, Bruno, tudo bem?
A relação com o signo de Câncer (que vem do latim “cancer”, de “caranguejo”) é sim presente neste trabalho de Hércules. A deusa Hera envia um caranguejo para ajudar a besta em seu combate ao herói, mas Hércules a derrota também (“esmagando-a”) e ela se torna a constelação de Câncer (da mesma forma que a constelação de Leão na derrota do Leão de Neméia).
Espero ter ajudado. Abraço!
Marcelo,
as 09 regiões da deusa do submundo nordica Hel, tem alguma relação com os 09 circulos do inferno de Dante?
Aproveitando a temática dessa série, deixo uma idéia para uma próxima série: a manifestação de Vishnu através da Árvore das Vidas.
Vishnu (sustentação) juntamente com Brahma (criação) e Shiva (destruição) compõe a trindade do Hinduísmo ao mesmo tempo em que cada um representa um dos pilares da Árvore: Vishnu o pilar do equilíbrio, Shiva o pilar da severidade e Brahma o da criação.
Segundo reza a lenda Vishnu tem 10 manifestações através de avatares ou encarnações, desde o peixe Matsya até Krishna.
Não vi diferença do primeiro trabalho. Parece a mesma parada de trabalho com a sombra e talz…
“Portanto, compreendido um defeito, deve-se durante o ato alquímico suplicar à Divina Mãe para Ela elimina-lo até suas raízes mais profundas”
Então é só pedir/suplicar? Isto nunca me entrou à cabeça…
HOLOGRAMA DO INFINITO
Mesmo que esteja a sair por tuas mãos o significado das coisas sem os véus que as escondem, guarda-te sob o manto dos que dormem e em silêncio livra-te do casulo que lhe prende as asas.
Aceita e vive o presente do tempo sem se perderes no passado nem no futuro, e em silêncio, guarda-te antes que percebam em seus lábios o sorriso de quem caminha sobre a ponte dos opostos.
Sim, guarda-te de todo mal e segue livre feito uma flecha ao vento que sabe que o alvo para o arqueiro é a sua meta, mas que o seu objetivo enquanto seta é a sua trajetória rasgando tempo e espaço em total liberdade.
Sim, guarda-te livre e indecifrável como uma fênix que renascendo em meio às cinzas das ilusões, alça seu vôo nas asas da quimera e entrega-se a liberdade dos que se criam dentro do incriado que tudo é e sustenta.
Sim, guarda-te livre em tua música e dela faz tua panacéia, uma ode aos caprichos dos deuses dessa odisséia para não cair nas tramas de seus hologramas: Sem beijos, sem cortejos e sem grana.
Por fim ao entenderes que o silêncio é ouro, guarda-te livre sob os votos dessa jura e deixa à vida os mistérios de ser o espelho do criador e da criatura existindo em sua sina de transcender a imagem refletida.
Marcos Novatto
Não me esqueço da conexão que o Sr. Marcelo faz entre Hércules e Alcides. Sua visão e conhecimento a respeito das diversas Mitologias é um deleite para nós leitores.
Obrigado pelo conhecimento, sempre compartilhado…