Gustav Holst e “Os Planetas”

Gustav Holst (Cheltenham, 21 de setembro de 1874 – Londres, 25 de maio de 1934) foi um músico brilhante, totalmente dedicado ao ensino e à composição. Nasceu sob o signo de virgem, conheceu novos mundos, abordou suas composições por um ângulo novo e inspirou-se nas mais diversas fontes literárias. Seu grande amor pela música e pela literatura são reflexos do seu mercúrio em libra.

Esta alusão ao mapa astral tem tudo a ver com a vida e a obra do compositor inglês. Ele mesmo era um entusiasta do assunto e chegou a confeccionar diversos mapas para seus amigos. Sua principal obra, Os Planetas, é resultado dos seus estudos místicos e astrológicos.

Influências Musicais

O Crepúsculo dos Deuses, a quarta ópera da tetralogia O anel dos Nibelungos, de Richard Wagner, impressionou os ouvidos de Holst. Mais tarde, sentiu-se elevado ao “reino dos céus” ao ouvir a Missa em Si menor de Johann Sebastian Bach. As influências de Arnold Shoenberg, Stravinsky, Richard Strauss, Debussy, e sua amizade com o compositor Ralph Vaughan Williams, encerram o arco musical dentro do qual Holst se desenvolveu como compositor.

Apesar da sua formação no Royal College of Music, Holst foi um grande autodidata. Evitava sistemas acadêmicos e estruturas musicais pré-concebidas. Não dava tanto crédito aos livros, mas no lema “aprenda fazendo”. Seguiu seu próprio caminho, e como num laboratório alquímico, realizou inúmeras experiências buscando constantemente as notas certas para suas obras.

Espiritualidade

Holst acreditava nas forças supra-humanas, foi muito influenciado pelas religiões orientais, especialmente nas doutrinas do dharma e reencarnação. Trabalhou na composição de diversos hinos para coral e orquestra sob inspiração de um dos escritos religiosos mais antigos do mundo, o Rig Veda. Escrito na linguagem sânscrita, é um verdadeiro compêndio de hinos, rituais e oferendas às divindades.

Como um bom virgiano, era perfeccionista e tinha o dom para dedicar-se em trabalhos cansativos e minuciosos. Portanto, não satisfeito com as traduções do Rig Veda decidiu aprender sânscrito e traduziu as palavras conforme sua interpretação.

Além dos Choral Hymns, compôs uma ópera chamada Sita, inspirada no épico indiano Ramayana, levou sete anos para sua conclusão, sem jamais encená-la! No caso de Holst, esse dom analítico e a capacidade para empenhar-se em grandes trabalhos, coincidem exatamente com as características de quem possui a lua em virgem no mapa astral.

Com base nos evangelhos apócrifos, escreveu The Hymn of Jesus (Parte I, Parte II, Parte III) Com seu rigor habitual, aprendeu o grego para ler os originais. Além do empenho para conservar o espírito do texto original, combinou em sua música o canto gregoriano, ritmos irregulares, harmonia colorida e uma orquestração grandiosa.

A astrologia e “Os Planetas”

Holst teve contato com a astrologia através do livro Art of Synthesis escrito por um astrólogo e teósofo chamado Alan Leo, precursor dentre os ocidentais a combinar astrologia, carma e reencarnação. Cada capítulo deste livro é dedicado a um planeta e sua respectiva descrição astrológica. O título Neptun, the mystic, por exemplo, foi copiado diretamente do livro.

Os planetas” não se trata de uma obra ortodoxa, sua estrutura não obedece aos padrões convencionais. Não é uma sinfonia, nem poema sinfônico, nem fantasia. Mas sim, uma série de perfis sonoros dos planetas. Nas palavras de Holst: “as sete influências do destino e componentes de nosso espírito.

Além das referências astrológicas, esta obra nos remete ao conceito de música das esferas, amplamente pesquisada por Pitágoras, Kepler, Kircher, dentre outros. Visto que Holst dedicou sete anos de sua vida nesta obra, vale a pena dedicar alguns minutos para ouvi-la e compreende-la.

Os Planetas

I. Marte, O Portador da Guerra

As cordas, percutidas com a parte de madeira do arco apresentam o motivo marcial onde a música irrompe em ondas orquestrais com intensidade crescente. Este clima bélico e enérgico da música caracteriza o perfil astrológico de Marte: coragem, poder, pioneirismo e o instinto lutador para enfrentar os desafios com bravura. Se estas energias não forem devidamente controladas seu resultado é desastroso: violência, assassinato e todos os subprodutos do defeito relacionado a Marte, a Ira.

Marte, O Portador da Guerra foi composto no início de 1914, antes do começo da Primeira Guerra Mundial. Seus sons militares soaram como uma premonição do conflito mundial que estava por vir.

II. Venus, O Portador da Paz

Fornece uma espécie de resposta para Marte. Contrasta pela placidez e pelo andamento lento. As harpas, madeiras e a celesta realçam a delicadeza desta obra, que nos passa a sensação de harmonia, equilíbrio e paz.

Alan Leo descreve este contraste entre Marte e Venus da seguinte forma: “Marte é o representante da alma animal no homem e Venus da alma humana, em certo sentido, um é o complemento do outro. Mercúrio o mensageiro alado dos deuses voa entre os dois como memória e é, portanto, a alma espiritual humana.

III. Mercúrio, O Mensageiro Alado

De forma alegre, uma extensa e contínua linha melódica passeia pelos diversos naipes orquestrais transmitindo de instrumento para instrumento a mensagem vinda de outros mundos. Mercúrio, o mensageiro alado dos deuses representa a consciência humana, o intelecto, a aptidão para nos comunicarmos e a nossa busca pelo saber.

IV. Júpiter, O Portador da Jovialidade

Com base numa linha de acompanhamento na região aguda dos violinos, as trompas apresentam o tema enérgico do movimento, é o impulso para a introspecção a nível intelectual, filosófico e religioso, um dos aspectos de Júpiter. Em suma, Júpiter representa a “mente superior” no homem, não como razão pura, mas como sabedoria inata.

V. Saturno, O Portador da Velhice

Começa sombrio, segue com uma marcha nos metais e retorna à serenidade no final. Harpas e flautas estabelecem um padrão de acompanhamento sobre o qual cordas e outros instrumentos de madeira apresentarão breves fragmentos melódicos.

Saturno no horóscopo mostra onde podem ser encontrados os maiores desafios e onde podem ser aprendidas as lições mais difíceis. Segundo alguns biógrafos, Saturno é também a representação do sofrimento de Holst, que devido a sérios problemas na articulação de seu braço, teve que abandonar o piano e o violino.

Alan Leo descreve Saturno como sendo um dos responsáveis por todos os casos de degradação, degenerescência, humilhação e vergonha. Nos aspectos positivos representa a verdadeira humildade, perseverança, sacrifício, entrega e serenidade.

VI. Urano, O Mágico

É um scherzo com uma melodia ágil no fagote que se desenvolve em uma intrincada teia orquestral. O início da música representa o impulso para ser único, para chocar e surpreender. Mais a frente, o som pesado dos metais nos remetem aos acontecimentos repentinos e imprevisíveis. O grandioso tutti representa o que talvez seja a maior influência de Urano: o despertar da consciência.

Em seu livro Art of Synthesis, Alan Leo chama o capítulo sobre Urano de “Uranus, the awakener”. Este, representa a originalidade de pensamento, a independência de espírito, o gênio criador, as avançadas formas de pensamento, a intuição e a capacidade de trazer conhecimento através da consciência desperta adquirida nas esferas internas do ser.

VII. Netuno, O Místico

Aqui Holst explora o pianissimo com enorme habilidade. Harmonias misteriosas e um coral de vozes femininas fazem parecer “música de outro mundo”. Esta obra nos transmite claramente a representação astrológica de netuno: as influências não materiais, os sonhos, o espiritualismo, a teosofia, a dedicação pelo misticismo e a abertura para o divino.

Ele também é o responsável pelo gosto por artes ocultas, habilidades para o mesmerismo, telepatia e sonhos lúcidos. O planeta é muito musical e conduz à composição inspirada em melodias ouvidas em sonhos. Pelo teor, esta obra pode tranquilamente servir como música de fundo para breves meditações.

Epílogo

Holst utilizou-se da música tanto para o seu trabalho profano como para a construção da “grande obra”. Ao mesmo tempo em que compunha melodias “mundanas” para manter-se financeiramente estável, dedicava-se a trabalhos chamados “sérios”, sem qualquer sentimento de incoerência. O único inconveniente é que a maioria de suas obras ficaram ofuscadas devido ao grande sucesso de Os Planetas.

Em maio de 1933, Holst foi internado às pressas devido a uma hemorragia causada por uma úlcera no duodeno. Outro dado curioso é que fisicamente o signo de virgem, possui relações com o aparelho digestivo e há quem diga que os intestinos são o ponto fraco físico dos virgianos. Coincidência ou não, logo após uma cirurgia a fim de erradicar a úlcera no duodeno, Holst não resistiu e deixou este mundo no dia 25 de maio de 1934 aos 59 anos.

Curiosidades

Marte, O Portador da Guerra é amplamente utilizado no cinema, principalmente em filmes que envolvem grandes batalhas. Além disso, é a maior referência musical para os compositores “hollywoodianos” em suas obras bélicas.

Em 2006, a banda inglesa Iron Maiden utilizou a música de Marte para abertura dos seus shows na turnê A Matter of Life and Death.

O tema central de Júpiter tornou-se um hino patriótico inglês.

O ritmo brincalhão de Urano é muito semelhante ao da obra O aprendiz de Feiticeiro de Paul Dukas, do qual Holst certamente recebeu influências.

Referências

Holst Biography, Ian Lace.
Astrologia, Wikipedia de Ocultismo
Art of Synthesis, Alan Leo.
Música Clássica, John Burrows.
Grandes Compositores, João M. Coelho.

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Respostas de 17

  1. “Com base nos evangelhos apócrifos, escreveu The Hymn of Jesus (Parte I, Parte II, Parte III) Com seu rigor habitual, aprendeu o grego para ler os originais. Além do empenho para conservar o espírito do texto original, combinou em sua música o canto gregoriano, ritmos irregulares, harmonia colorida e uma orquestração grandiosa.”

    Que legal, muita coisa para ouvir nesse post… A melhor coisa da música clássica é que, por ser antiga e ter direito autoral livre, ninguém fica retirando os vídeos do YouTube de tempos em tempos 🙂

    Abs!
    raph

  2. Legal! Conhecia “Os Planetas”, mas nada sobre o compositor!
    Vou procurar outras múscicas dele para apreciar, não sabia das outras músicas e suas respectivas temáticas.

  3. É impressão minha ou “Os Planetas” é usado frequentemente por Spielberg?
    @FDA – Não só os compositores que trabalham pro Spielberg, mas grande parte dos compositores de Hollywood como John Williams, James Newton Howard, Hans Zimmer, Howard Shore, foram influenciados pelas obras de Holst, Mahler, Bruckner, dentre outros compositores do período romântico tardio.

  4. Gostei muito deste post. Como amante da música clássica fiquei surpreso em ver este texto aqui no TdC. Parabéns Fábio. Apesar de já ter ouvido Gustav Holst, não conhecia sua biografia. Corrigirei o mais rápido possível esta falha minha.

  5. Eu sempre quis maiores suportes sobre a relação entre música clássica e ocultismo. Gosto muito da idéia dessa coluna, pois influencia os leitores a procurarem músicas clássicas e usarem em suas práticas mágicas (falo por mim tbm XD)
    Parabens ^^

  6. 93!

    Excelente texto!
    Essas músicas se tornam deveras úteis para rituais magistickos nos quais envolvam invocação/evocação referentes aos planetas. Devia ser incluido como “apêndice sonoro do 777”, hehehe, parabéns pelo post!

    93,93/93

  7. Muito Bom! Sou ouvinte assíduo de Música Erudita há anos e nunca tinha ouvido falar de Gustav Holst (fico até um tanto envergonhado por isso…). Vou procurar a obra dele agora mesmo…

    Esta coleção (poderíamos chamar de suíte?) é de fato perfeita, e como muitos disseram aqui, pode ser uma mão na roda para atividades magísticas. É transcendental mesmo sem esforço do ouvinte!

    Como experiência pessoal, a minha música favorita para me “conectar às esferas celestiais” sempre foi o Requiem em Ré menor de Mozart. É uma música que não me canso de ouvir nunca, e já cheguei várias vezes a ouvi-la inteira diariamente. Como não sentir a suprema Misericórdia ao ouvir o Agnus Dei, o grande Pesar do Lacrimosa, a Justiça divina do Dies Irae e a Glória celestial do Sanctus? São poderosas harmonias que direcionam muito bem a nossa Vontade, e esse grande trabalho de Holst continua algo de extrema importância na música, que é a conexão com o Divino.

    Valeu!

  8. Bom dia Sr. Fabio Almeida
    Estou muito feliz de poder ler uma coluna sobre musica aqui noTdC. Eu te parabenizo por ela!
    Gostaria de saber se o sr. pretende escrever sobre Johann Sebastian Bach e Frederic Chopin? Eu adoro as obras desses compositores e seria bacana poder descobrir mais sobre os aspectos mais Misticos dessas maravilhas, como fizestes com os Planetas do Gustav Holst.

    @FDA – Com certeza, Bach e Chopin já estão na lista!

  9. Eu notei que ele não fez nenhuma música para Plutão, vc sabe o por que disso?
    @FDA – Porque Plutão ainda não tinha sido descoberto. Mais tarde, um compositor chamado Colin Matthews resolveu incluir Plutão na suíte, mas nem todos gostaram da idéia…

  10. Estava assistindo ao show do Rolling Stones em comemoração aos 50 anos de carreira e lendo os diversos textos publicados no site. Lembrei-me de algo: é verdade que o Bolero de Ravel está diretamente relacionado ao sexo e ao orgasmo? Outra dúvida: posso parecer louca, mas uma noite sonhei que me diziam que o Flautista de Hammelin realmente existiu e que não é apenas uma música. Como músico, você saberia dizer? Procurei mas não achei nada a respeito. Por fim, só tenho a dizer que adoro esse site, e que gostei demais de ler algo tão profundo sobre Bach, e que pretendo conhecer Gustav Holst ainda pela manhã kkkkkkkk – viva a internet! E viva os Stones, porque de rock também se vive, não é? kkkkk Abraços. Desculpe postar duas vezes o comentário, é que esqueci de colocar o endereço de email atual e de marcar as notificações.

  11. Texto fantástico, de cair queixo e dropar mandíbulas mesmo! Holst é fantástico, conheci ele pela influência que tem sob o Tony Iommi do Black Sabbath. Gostaria de pedir, se possível, algumas análises desse tipo em músicas de rock e do metal em geral. Em especial, a música “The Conjuring” do Megadeth, consegue nos elucidar um pouco a respeito? Obrigado.

  12. E Holst foi a grande inspiração para a Marcha Imperial principalmente o planeta Marte e só por isso já merece meu respeito
    @FDA – Legal que tenha percebido isso…

  13. Oi, Fabio! Adorei o texto e a iniciativa de postar as músicas para conferirmos essa bela obra, porém, quero ser um pouco chato aqui:

    “Em maio de 1933, Holst foi internado às pressas devido a uma hemorragia causada por uma úlcera no duodeno. Outro dado curioso é que fisicamente o signo de virgem, possui relações com o aparelho digestivo e há quem diga que os intestinos são o ponto fraco físico dos virgianos”

    Sobre o intestino ser o ponto fraco DOS VIRGINIANOS, na realidade, o intestino é o ponto fraco DO SIGNO de Virgem. O que aconteceu com o Gustav Holst pode ter sido coincidência, a menos que ele tivesse uma Lua (que rege a digestão) na Casa 6 (a dos problemas de saúde) ou na Casa 8 (morte), por exemplo. Aí, o Sol em Virgem seria uma indicação mais secundária. Na verdade, o signo solar pode ser interpretado até como o contrário: uma vez que o Sol é o princípio de vitalidade, a parte do corpo regida pelo signo onde está nosso Sol pode ser justamente o ponto onde o Chi flui melhor.

    Grande abraço!

    @FDA – Obrigado pelas informações Ian. Acho que faltou clareza no que escrevi, mas minha intenção era transmitir exatamente o que você disse “pode ter sido coincidência” ou não, apenas uma hipótese. Vou acrescentar isso quando reescrevê-lo, abraços.

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