Por Alexandre Amorim de Sousa
O Brasil é um país de vícios. Aqui, se algo dá certo, por mais errado que seja, atrai. E não é diferente na política. Mas muitos sequer sabem a definição do cargo que pretendem assumir
Repórter: “Senhor candidato, caso seja eleito, quais serão suas propostas?”
Candidato: “Eu vou mandar construir pelos menos dez escolas e outras 30 creches. E vou contratar especialistas para todas elas”.
Repórter: “Mas o senhor sabe, obviamente, que vereadores não ´mandam´ construir, não é? Eles votam projetos e encaminham para que o Executivo autorize”.
Candidato: “Como é?”
Repórter: “O senhor sabe o que um vereador faz, candidato?”
Candidato: “Claro, ele… Ele… Vota projetos e encaminha para ao Executivo”.
O diálogo acima, triste de se ler, é real. É uma transcrição básica de uma conversa que uma de nossas repórteres teve com um dos mais de 400 candidatos ao Legislativo que temos em Mogi das Cruzes. Não cabe aqui nomear o Fulano, pois não queremos ser acusados de perseguição. Mas a verdade é que a qualidade dos candidatos da cidade está sofrível.
Vivenciando o dia a dia da campanha eleitoral, não raramente a nossa equipe se embate com algum candidato que sabe tanto de política quanto sabe de física quântica. Um deles, ao ser questionado qual era a plataforma de sua campanha, estendeu um “santinho” à nossa repórter e arrematou: “Está tudo aí!”. Pasmem. No verso do santinho, havia três propostas compostas de uma única frase curta cada uma. O repórter, não satisfeito e já com toques de provocação, quis se aprofundar. E pasmem – de novo: ouviu o candidato dissertar o decoreba do santinho, com nem uma palavra a mais ou a menos.
Há quem possa pensar que tal situação é espólio de Tiririca, com o execrável mote “você sabe o que faz um deputado? Nem eu!”. Mas não é. Isso é herança antiga, que vem dos tempos do ressurgimento da democracia, logo depois da reabertura democrática com Tancredo Neves.
O Brasil é país de vícios políticos. Aqui, se algo dá certo, por mais errado que seja, atrai muitos. Não é diferente na política. Quantas vezes você, leitor, não ouviu alguém dizer: “estou cansado de trabalhar. Vou virar político”. O que é piada para alguns, para outros, é realidade. Aquele candidato a vereador que citamos no início deste texto, sem dúvida, pensa assim. Ele não sabe a que vem um vereador, mas tenha certeza, sabe o salário que tal vereador ganha, e pior, deve estar de olhos abertos, arfando como um cão diante de suculento bife (que ele sabe ser grande demais para ele, mas que ainda assim deseja ardentemente), pensando nas falcatruas que poderá armar depois de eleito.
Longe deste jornal generalizar essa acusação. Mas sabemos que, assim como temos os bons e honestos representantes, temos também (talvez em número equivalente ou superior), aqueles que buscam a eleição por motivos torpes e individualistas. Tais políticos existem em todo o mundo. Em alguns países do Oriente Médio, quando apanhados, são chicoteados ou aprisionados por décadas. No Japão, desmascarados, têm a dignidade de se suicidar, pois não suportam arcar com a vergonha diante dos familiares e eleitores. Aqui, no Brasil, onde a nobreza está quase extinta, eles renunciam e voltam depois de longas férias, bronzeados, aproveitando a péssima memória do brasileiro, sem qualquer pudor ou sentimento de culpa, mas com olhos bem abertos, atentos a qualquer oportunidade de aumentar seus rendimentos.
Portanto, fica o conselho: questione seu candidato. Vivemos em uma cidade que nem é tão grande assim, portanto, que permite tal diálogo. Se ele fugir de você, se der respostas evasivas, desconfie. Sorrisos, bonecos gigantes, promessas grandiosas, são, antes de tudo, a máscara que encobre a incompetência de quem sequer sabe a definição básica de política.”
Matéria publicada em 04/08/12
Respostas de 8
A incapacidade política de alguns candidatos é execrável, mas não exclui, apenas acentua, a mais execrável ainda incapacidade de escolha e decisão da massa eleitoral. É um ciclo vicioso sem fim.
Matéria magnífica! Certas pessoas simplesmente não entendem que conhecer as propostas dos candidatos bem como seu passado é obrigação de todo eleitor (não entenda por proposta apenas as apresentadas no “santinho”, por favor).
No dia em que for necessária uma formação técnica em gestão pública para se candidatar a um cargo público esse país começa a mudar.
É claro que o próximo pensamento é: Vão comprar o diploma e tudo continua na mesma.
Bom, quem disse que tinha resposta pra tudo! =P
A culpa é nossa. A responsabilidade pela existência de candidatos assim é nossa. Cabe ao eleitor educar a sim mesmo para fazer as escolhas certas.
Duas atitudes mudariam esse cenário.
Primeiro, a Lei da Ficha Limpa tem de funcionar mesmo, de verdade. Nenhum candidato que tenha sido condenado pelo menor delito que seja, pode ter sua candidatura aprovada.
Segundo, os candidatos devem ter um mínimo de escolaridade e/ou passar por um curso de Gestão Pública, como sugerido pelo Moscavich.
Enquanto o povo não muda, algum remédio tem de surgir para a corrupção.
Na verdade, ignorância não é corrupção.
A solução é justamente passar pelo caminho que estamos passando. É sangrar e sofrer, até que a maioria esteja cansada do velho processo, e desejosa de mudar.
Enquanto o catador de lixo e o homem mais rico do país não tiverem grandes preocupações, ambos, com quem faz o que no país, não teremos uma democracia funcional.
Um dia um politico da minha cidade disse:
Se tiver que fazer algo ruim faça de uma vez, pois o povo esquece.
Se tiver que fazer algo bom faça aos poucos, pois o povo também esquece.
Essa história foi contada por um professor que foi militante de esquerda na época da ditadura, em Santos/sp
@MDD – É de Maquiavel. Continua atual.
O melhor texto publicado aqui, bom pelo menos um dos mais lúcidos e menos de 10 comentários… o pessoal realmente não acredita mais em política, é cada um por si e deus por todos.