Drogas e Plantas Alucinógenas na Psicoterapia e Xamanismo [parte 1/5]

Para os leitores que acompanham minhas postagens aqui no TdC, sabem que eu sempre gosto de mesclar Ocultismo com Ciência. Quando digo Ocultismo, na verdade quero dizer tudo aquilo que diz respeito à mente e a espiritualidade que é ignorado ou convenientemente colocado de fora no paradigma científico Ocidental. Muitos também sabem que estudo estados alterados de consciência, induzidos por drogas (ou não), rituais e afins, e uma coisa que vejo é que ultimamente muitas pessoas começaram a se interessar pelo Xamanismo (e eu incluso!!!). Tal interesse acaba levando-as a participar de rituais e vivências xamânicas, que incluem artesanato de filtros dos sonhos, confecção de tambores, rodas de conversa de sagrado masculino e feminino, animal de poder e etc.

 

A coisa começa a chamar a atenção quando nestas situações são introduzidas plantas e substâncias de poder, conhecidas também como as medicinas da floresta (ayahuasca, rapé, wachuma, etc). Nem todos estão realmente preparados para realizar tais sessões, e substâncias como a ayahuasca, estão cada vez mais sendo traduzidas e utilizadas em contextos urbanos. Eu mesmo já participei, e ouvi relato de pessoas que participaram, de rituais xamânicos, que, no mínimo, deixaram a desejar. Sendo assim, me proponho nos posts futuros a traduzir um artigo que acredito ser essencial para todos aqueles que se interessam pelos assuntos citados acima, acadêmicos ou não.

O artigo é do psicólogo americano Ralph Metzner e se chama “Hallucinogenic Drugs and Plants in Psychotherapy and Shamanism” publicado em 1998 no Journal of Psychoactive Drugs (Jornal de Drogas Psicoativas). Muitos de vocês podem reconhecê-lo do documentário ‘DMT: A Molécula do Espírito’. Eu recebi autorização do autor para realizar esta tradução e como sei que muitos não estão acostumados com a extensão de um artigo científico, irei dividi-lo em 5 partes, sendo esta a primeira. Dúvidas e sugestões nos comentários.

“Drogas e Plantas Alucinógenas na Psicoterapia e Xamanismo” por Ralph Metzner:

Como uma forma de introduzir uma visão geral do papel de drogas psicoativas nas práticas de tratamento psicológico, uma breve nota pessoal deve ser permitida. Como um psicólogo, eu tenho me envolvido no campo dos estudos da consciência, incluindo estudos alterados induzidos por drogas, plantas e outras formas, por mais de 35 anos. Nos anos 1960’s eu trabalhei na Universidade de Harvard com Timothy Leary e Richard Alpert, pesquisado sobre as possíveis aplicações terapêuticas de drogas psicodélicas, como o LSD e a psilocibina (Leary, Metzner & Alpert 1964). Durante os anos 1970’s o foco do meu trabalho mudou para a exploração de métodos livres de drogas para a transformação da consciência, com o aqueles encontrados em tradições de yoga Orientais e Ocidentais, meditação e alquimia (Metzner, 1971). Eu também estudei intensivamente os novos métodos psicoterápicos, muitos deles derivados do trabalho de pioneiros como Wilhelm Reich, que envolve profundos estados alterados de consciência induzidos por trabalhos corporais e de respiração. Durante os anos 1980’s, eu entrei em contato com o trabalho de Michael Harner (1980, 1973), Joan Halifax (1982), Peter Furst (1976, 1972), Terence e Dennis McKenna (1975) e outros, que estudaram ensinamentos e práticas xamânicas ao redor do mundo. Essas tradições xamânicas envolvem estados não ordinários de consciência induzidos por uma variedade de métodos, que incluem a ingestão de plantas alucinógenas, mas também o toque de tambores, jejum, busca selvagem de visões*, uso de câmaras de suor e outros.

Percebendo que havia tradições atingindo tempos pré-históricos de uso respeitoso de alucinógenos para curas xamânicas e divinações, eu me tornei muito mais interessado nas plantas e cogumelos que têm um histórico de tal uso. Pessoas indígenas são conhecidas por ter um conhecimento profundo de plantas e ervas e seus efeitos no corpo e na mente; eles são muito hábeis em distinguir medicinas prejudiciais de benéficas. Por esta razão as plantas de indução de visão que têm uma tradição de uso xamânico são muito mais prováveis de serem seguras, em contraste às drogas recém-descobertas e sintetizadas, cujo uso pode envolver riscos desconhecidos a longo prazo.

Tornou-se claro para mim, como um resultado destas explorações, que enquanto a psicoterapia Ocidental e o xamanismo indígena podem usar substâncias psicoativas idênticas ou similares para a cura e obtenção de conhecimento (chamado diagnóstico no Ocidente e divinação nas culturas tradicionais), existem profundas diferenças entre eles na visão de mundo adjacentes e suposições acerca da natureza da realidade. Neste artigo eu proponho comparar o uso de psicoativos, assim como as visões de mundo subjacentes, em quatro sistemas de transformação de consciência: (1) psicoterapia dentro do paradigma padrão do Ocidente, (2) rituais xamânicos de cura e adivinhação, (3) cerimônias religiosas tribais sincréticas, e (4) o que eu chamo de rituais terapêuticos-xamânicos híbridos., que representam uma mistura de abordagens indígenas xamânicas com a psicoterapia Ocidental.

Uma nota sobre a terminologia: eu uso os termos “psicodélicos”, “alucinógenos” e “enteógenos” alternadamente. “Psicodélico”, o termo cunhado por Humphrey Osmond e Aldous Huxley e popularizado por Leary e o grupo de Harvard, significa “mente-manifestando”. “Alucinógeno” é o termo geralmente usado na literatura de pesquisa psiquiátrica para essas substâncias. A maior objeção ao termo alucinógeno é que estas drogas e plantas na verdade não induzem alucinações, no sentido de “percepções ilusórias”. Mas o termo alucinógeno merece ser reabilitado. O significado original do termo Latino alucinare é “vaguear na própria mente” (wander in one’s mind), e viajar ou partir para uma jornada em espaços internos é uma metáfora descritiva bastante apropriada para tais experiências, que são coloquialmente referidas como ‘viagens’ (trips). O termo “enteógeno”, proposto por R. Gordon Wasson e Jonathan Ott, tem a mesma raiz de “entusiasmo”, e significa “liberando ou expressando o divino interior” (Ott, 1995)

Fim da primeira parte.

Se você gosta desses assuntos, sugiro que participe da palestra gratuita sobre os potenciais terapêuticos da Ayahuasca, que acontecerá em São Paulo. Se você REALMENTE gosta desses assuntos, convido-lhe para participar do curso “Psicologia e Xamanismo”.

Ricardo Assarice é Psicólogo, Reikiano, Mestrando em Ciências da Religião, especialista em formação em Teorias e Técnicas Para Cuidados Integrativos e Escritor. Para mais artigos, informações e eventos sobre psicologia e espiritualidade acesse www.antharez.com.br ou envie um e-mail para contato@antharez.com.br

Imagens:

Imagem encontrada na Internet
Ralph Metzner em um foto recente

Bibliografia:

METZNER, Ralph. Hallucinogenic Drugs and Plants in Psychotherapy and Shamanism. Journal of Psychoactive Drugs. Volume 30 (4), October – December. 1998.

Compartilhar:

Facebook
Twitter
Pinterest
LinkedIn

Respostas de 9

  1. Ansioso pela próxima parte! ?

    Estou participando de uma comunidade xamanica que faz uso do Ayahusasca é do Rapé, e essa prática tem me transformado de uma maneira incrível, minha depressão praticamente foi curada, hoje sou uma pessoa com claro propósito de vida e muito mais espiritualizado e empático com as pessoas.

  2. Excelente abordagem!
    É enriquecedor a analise destes pontos de vistas, sobretudo em razão da sociedade, ao meu ver, compreender evolução como uma distanciamento da natureza e destas experiências que são inúmeras vezes mais antigas (tradicionais) do que a própria concepção trazida pela ciência moderna.
    Esperarei ansioso pela continuidade.
    Parabéns.

  3. Muito boa a primeira parte. Espero que as outras esclareçam ainda mais sobre o uso dessas plantas.

  4. Fantástico! Este fim de semana mesmo eu participei de um ritual fortíssimo com a Ayahuasca, é uma experiência muito transformadora. No futuro incluirei o ritual no meu trabalho de despertar da consciência. Até lá faço a minha própria transformação e vou ganhando conhecimento. Estarei na palestra _/|\_

  5. Olá!

    E com relação ao uso medicinal/terapêutico e espiritual da maconha em paralelo ao mesmo uso dessas outras plantas? Pergunto por nunca ter encontrado algo mais substancioso que falasse sobre. Vejo muito sobre as plantas amazônicas e cogumelos, mas sobre a maconha, não.

    O máximo que já ouvi falar, ou li artigos superficiais, foi sobre o uso em tribos africanas, em rituais relacionados a Shiva, na Índia, e o uso de concentrados (haxixe) por sufis para alcançar estados alterados em determinados cultos.

    Ricardo, você conhece alguma leitura sobre para indicar, ou pretende escrever sobre isso para nós neste canal?

  6. Trabalho em uma casa de xamanismo consagrando as medicinas da floresta: ayahuasca rapé sananga kambo e tabaco sagrado.Elas abrem um mundo pra você.se trabalhadas de uma forma seria dentro de uma casa firme com egregora forte a cura pessoal e a espiritualidade se abre de uma forma incrível.quando vc é trabalhador da casa então…vixe. realizamos todo o ancoramento e limpeza energetica do ambiente.acessamos não somente o nosso campo energético como também a dos irmãos que auxiliamos na casa.essas medicinas não só alinham os chacras como também auxiliam no desenvolvimento da mediunidade se em conjunto houver estudo e disciplina. Tudo de bom 🙂

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Social Media

Mais popular

Receba as últimas atualizações

Assine nosso boletim informativo semanal

Sem spam, notificações apenas sobre novos produtos, atualizações.

Categorias

Projeto Mayhem

Postagens relacionadas

Mapa Astral de Pablo Picasso

Pablo Picasso (Málaga, 25 de outubro de 1881 — Mougins, 8 de abril de 1973), foi um pintor, escultor e desenhista espanhol, tendo também desenvolvido

Mapa Astral de Timothy Leary

Timothy Francis Leary, Ph.D. (22 de outubro de 1920 – 31 de maio de 1996), Professor de Harvard, psicólogo, neurocientista, escritor, futurista, libertário, ícone maior

Mapa Astral de Oscar Wilde

Eu não gosto muito de postar vários mapas seguidos, porque o blog não é sobre Astrologia, mas agora em Outubro/Novembro teremos aniversário de vários ocultistas