Não são poucos os que procuram o ocultismo em busca de poder. Muitas vezes é um desejo de poder sobre as coisas do mundo: ter mais dinheiro, curar doentes, curvar colheres ou reviver os mortos. Outras vezes, busca-se dominar estados mentais: ter menos ansiedade, mais coragem, menos raiva. Finalmente, há um anseio de controlar também o mundo dos espíritos, buscando o êxtase dos estados alterados de consciência, contato com entidades e a obtenção de poderes psíquicos.
Frequentemente esse desejo desenfreado por poder está mascarado. Por um lado, há pessoas que de forma muito direta e sincera simplesmente declaram que, sim, elas querem ter poder sobre o mundo material e espiritual e não enxergam nenhum mal nisso. Ou, mesmo que houvesse um mal, elas não se envergonhariam de realizar esse mal, principalmente se fosse para ajudar a si mesmas ou a pessoas que amam.
E isso nos leva ao próximo ponto, que é a busca por poder sob a justificativa de ajudar alguém, que muitas vezes toma a forma de “os fins justificam os meios”. Quando alguém declara que está buscando desenvolver poderes psíquicos para curar doentes, a princípio nos parece muito nobre, mas às vezes devemos tomar cuidado para não cair nessa armadilha que preparamos em nossa mente.
É muito mais comum que desejemos o poder pela sede de poder. Quando não queremos admitir isso para nós mesmos, podemos alegar que nosso objetivo é maravilhoso, como ajudar outras pessoas ou o meio ambiente. Queremos tornar o mundo um lugar melhor, queremos tornar os outros melhores, essas pessoas que enxergamos como tão egoístas e corrompidas pelo poder. No entanto, nós não nos olhamos no espelho para notar que, da mesma forma que os outros, buscamos solucionar esse anseio de controlar as pessoas e o mundo fazendo exatamente isso.
De onde vem esse desejo de poder? Da nossa incapacidade de aceitar as coisas como elas são. De forma mais direta, nós não suportamos o fato de não sermos perfeitos. Ninguém é perfeito, o mundo é imperfeito e isso nos causa muito sofrimento. É ilusão pensar que se X ou Y fosse diferente tudo automaticamente se tornaria ótimo. Em vez disso, uma vez que X e Y fossem resolvidos, iríamos encontrar mais defeitos, numa busca sem fim.
Buda resumiu essa situação de forma muito simples: a vida é sofrimento, os desejos causam sofrimento, livre-se dos desejos e livre-se do sofrimento.
Então você pensa: “achei a solução! Vou me desapegar das coisas materiais e me focar apenas no meu desenvolvimento espiritual”. A partir daí, uma nova batalha pelo poder se inicia. Em vez de frear a sua sede por poder, você apenas troca um desejo de poder por outro.
Você passa a se achar muito nobre porque não está mais interessado em obter essas “quinquilharias mundanas” compradas pelo dinheiro. Em vez disso, passa a usar seu tempo para comprar outro tipo de prazer: o êxtase espiritual, sem perceber que aquilo é prazer igual, mas com um nome mais sofisticado.
Na vida, usamos nosso tempo e dinheiro para comprar prazer e fugir da dor, um tipo de jogo sem objetivo aparente, além da mera diversão que teremos até o jogo acabar. O jogo espiritual é bem parecido. Sente-se para meditar para obter prazer ou tranquilidade, seja corporal ou mental. Levante-se da meditação quando houver dor ou desconforto, ou use uma almofada mais macia e uma música mais inspiradora.
Até quando meditamos ou realizamos outra atividade espiritual, o desejo por poder continua. Queremos fazer parar as dores que sentimos, controlar nossos estados mentais e buscar desesperadamente pelos estados alterados de consciência que nos geram prazer. Quando obtemos tais estados alterados, temos a sensação de que somos seres muito elevados, acima de mortais comuns, mas estamos apenas enganando a nós mesmos. Muitas vezes, estamos apenas viciados na sensação incrível que sentimos, como viciados em drogas.
Nada melhor do que realizar um feitiço para controlar o mundo ao seu redor. Usar métodos divinatórios para tentar desvendar o futuro é nossa tentativa de controlar o tempo e ter poder sobre ele. Vista-se com um manto negro, trace um círculo mágico no chão e use uma espada para controlar entidades. Domine seus próprios estados mentais para mostrar quem manda.
Afinal, o mundo é um lugar difícil. Eventualmente nos damos conta de que não seremos milionários para dominar o mundo com dinheiro, nem presidentes, nem a Miss Universo, então, que diabos, vamos dominar o mundo espiritual! Lá não é preciso ter uma conta bancária, um carro de luxo e ser famoso no Facebook. E de que servem essas coisas tão pequenas se você pode domar todos os demônios dos grimórios medievais e arrastá-los como cachorrinhos na coleira?
Caso não curta muito essas paradas mais sinistras, vamos nos ater ao básico: obter estados alterados de consciência e nesses estados conquistar alguns poderes psíquicos que te permitam fazer copos levitar e curvar colheres. Afinal, nem você e nem ninguém que você conhece tem mãos para pegar copos. Ainda não inventaram controle remoto para copos. Sendo assim, é um objetivo muito útil pelo qual vale a pena dedicar a vida.
Mas você não é desses. Você é uma pessoa superior, que se dedica a magias de cura e ressurreição dos mortos. Os médicos ainda não inventaram curas para todas as doenças e para a morte, então vale a pena apostar no poder espiritual para complementar o poder científico sobre a natureza, certo? Talvez.
Buda iniciou sua jornada para encontrar uma solução para velhice, doença e morte. Ele conseguiu, mas o que ele encontrou não foi nenhuma pílula que te impede de envelhecer, adoecer e morrer. Ele descobriu que se enxergasse tanto dor e alegria como iguais, e tanto doença e saúde como iguais, não desejando nem um e nem outro, o que acontecia lá fora já não importava tanto. O sofrimento físico continuaria, mas a sua paz mental em relação a essas situações seria muito maior. Ele até mesmo poderia ficar em paz com o fato de que não conseguiria controlar suas sensações mentais todas as vezes. Ele não precisava mais controlar e sim soltar. Apenas observar. Dor é apenas dor. Morte é apenas morte.
Iluminação é apagar. É morrer para seu eu cheio de desejos. Quando você morre para seu ego, não há mais nada para ferir e matar. Você simplesmente não pode mais ser ferido ou morto, porque não há mais nada lá. Você ainda sente a dor física e mental, mas não se identifica com elas. Seus julgamentos em relação a elas são ilusórios. Essas coisas não são mais o centro de seu mundo, sobre as quais se apoia sua esperança de felicidade.
Buda encontrou muitos poderes e êxtases mentais em suas meditações, mas não se apegou a eles. Apenas observou-os e deixou-os passar, como todo o resto, sem tentar domá-los ou fazer deles seu objetivo final.
Jesus realizou muitos milagres, mas não veio a esse mundo para curar os doentes e reviver os mortos, por mais nobre que isso seja. Ele veio para algo ainda mais importante: morrer. Assim como Buda, ele morreu para seu eu.
Em outras palavras, você não veio ao mundo para buscar o prazer e fugir da dor. E nem para ter mais saúde e prolongar sua vida (para assim ter mais tempo para ter prazer). É claro que podemos fazer tudo isso de forma temporária e ninguém deve ser condenado por agir dessa forma. O problema é tornar apenas isso o centro de sua existência e assim cair em desespero. O desespero vem porque quando acreditamos que a vida é apenas tentar escapar da morte, não parece fazer sentido.
Dizer que viemos ao mundo não para ter alegrias, mas para sofrer e morrer, pode soar muito pessimista. É claro que ter alegrias é bom e não é errado, mas nós também estamos aqui para aprender a sofrer e morrer.
Não costuma ajudar muito nesse aprendizado ser um magista mimado que deseja que o mundo ou seus próprios estados mentais estejam a seus pés a todo o momento.
A Magia do Caos é um tipo de magia experimental que muitas pessoas reduziram a apenas lançar sigilos e servidores para brincar e satisfazer todas as minhas vontades o mais rápido possível como se eu fosse um rei ou uma criança. Não há nada de errado em se divertir de vez em quando, mas permanecer apenas no paradigma “bater punheta para sigilo trazer meu amor de volta” é quase um insulto às vastas possibilidades que o caoísmo oferece.
Que tal tentar o paradigma do morto-vivo: “vou fingir que estou morto essa semana” e tentar passar esse período sem realizar nem mesmo uma única ação para benefício próprio, mas sempre que isso vier à sua mente mudar de atividade ou incluir outra pessoa junto? Ou quem sabe você tenta o paradigma da lesma: “sou uma lesma nojenta e detestável” e passa uma semana sem se orgulhar de si mesmo, apenas diminuindo a si mesmo e falando mal dos próprios atributos? Anote e veja os resultados até a próxima experiência. Em vez de fazer um sigilo que te traga um ganho, faça um que te traga um “sofrimento que te faça crescer espiritualmente”. Alimente um Servidor da Morte, que faça um ferimento profundo no seu ego uma ou duas vezes por dia.
Existem muitas maneiras diferentes de viver, então não queira reduzir seu mundo, sua vida e seus desejos a apenas uma delas, mudando só a embalagem. Quem deseja obter uma maturidade espiritual genuína, e não apenas trocar a busca de poder mundano por desejo de poder espiritual, fará bem em notar que vida e morte não são estados estáticos, mas dinâmicos. Todo ocultista sabe que para renascer primeiro você precisa morrer para seu eu antigo. E isso não é apenas uma metáfora. Para crescer precisamos aceitar e tentar entender alguns dos sofrimentos e pequenas mortes do ego pelas quais passamos ao longo do dia e da vida, em vez de apenas negá-los e tentar se livrar deles.
Aquele que quer apenas continuar a fingir ser o rei do universo, brincando de senhor do mundo, como se fosse todo poderoso e imortal, cedo ou tarde irá descobrir que no fundo era apenas um escravo dos desejos. Ou, como bem colocou Thomas Merton em seu livro “A experiência interior”:
“Quem é escravo de seus próprios desejos necessariamente explora os outros para pagar o tributo ao seu próprio tirano interior”
O que chamamos de “defeitos” do mundo e da natureza que precisam ser imediatamente modificados por magia, muitas vezes são exatamente os instrumentos necessários para nos fazer amadurecer de forma moral e espiritual. Uma vida fora da proteção da nossa bolha pode ser mais dolorosa, mas também é mais real. Quem vive uma vida de plástico, no fundo nunca viveu e por isso não saberá morrer. Somente quem sai do casulo e vive de verdade entenderá que a existência da dor e da morte são tão necessários para uma vida plena quanto a respiração.
E para finalizar, mais um pouco de Thomas Merton, em “A sabedoria do deserto”:
“O abade João orara ao Senhor, que o livrara de todas as paixões, tornando-se assim impassível. Nessa condição, foi até um dos anciãos e disse: ‘Você tem diante de si um homem que está em pleno descanso e livre de todas as tentações’. O ancião disse-lhe: ‘Vá e reze ao Senhor para que lhe envie alguma luta a ser travada dentro de si, porque a alma é amadurecida somente por meio de batalhas’. Então, quando as lutas começaram a aparecer novamente, ele não pediu para que fossem afastadas de si, apenas disse: ‘Senhor, dê-me força para resistir à luta'”.
Respostas de 12
Saber o sentido da vida,que devemos fazer todo um aprendizado para nos tornar seres melhores,mesmo que vc tenha razão,não deveria ser visto apenas como busca de poder.Vc condenou qualquer motivo de querer ser “feliz” sendo que a própria felicidade pode ser vista de muitas formas,por exemplo,muitas pessoas ficam feliz em sofrer só pq isso ajudará alguém que lhes é querido.Sei que o desejo de ajudar deve ser tido como algo indiferente a nossos desejos,automático,o reto pensar.Mas é difícil para quem ta começando.Mesmo que sejam egoístas os motivos de querer fazer o bem,tudo será aprendizado,e a pessoa atenta logo acordará de novo,eu por exemplo continuo estudando não pelos motivos que comecei.A gente acorda a primeira vez da mesmice do dia-a-dia cheio de emoções vagas,completo descontrole das emoções e desejos que nos mesmo não nos esforçamos para conseguir.Depois na magia,a gente passa a acordar quase todo dia para uma coisa diferente,então concluo que independente dos motivos,eles acabam se moldando,assim como o bem e o mal para uma pessoa não é o mesmo para outra,uma pessoa que começa querendo se livrar dos desejos mais “humanos” simplesmente ainda almeja outro desejo que ela tem como maior,mas que talvez somente correspondam a ganancia dela de querer ter o desejo mais “nobre” entre os desejos.
enfim,pode se aprender tanto na alegria quanto na tristeza,e quem busca conquistas que pareçam só agregar a uma pessoa que nenhum desenvolvimento espiritual tem,se caso tenham os olhos abertos,irão aprender também.
@Wanju – Giovane, não irei, de forma alguma, discordar do seu ponto de vista, principalmente quando você o coloca dessa maneira, que imediatamente desperta a simpatia. Para mostrar que eu concordo com suas palavras, irei colocar trechos do que eu mesma escrevi nesse post:
“É claro que podemos fazer tudo isso de forma temporária e ninguém deve ser condenado por agir dessa forma”
“Ter alegrias é bom e não é errado”
Eu mesma sou fã de ser feliz e desejo que cada vez mais pessoas tenham uma vida de maior alegria e menor sofrimento. No entanto, deixar de sofrer para sempre não é uma escolha. Resta-nos buscar algum sentido no sofrimento, para que assim o aceitemos de forma mais natural e estejamos mais capacitados para enfrentá-lo, o que é melhor que a negação.
Ninguém é tão forte para fazer isso logo de cara e isso não é esperado de ninguém. Porém, ser capaz de ver sentido na dor e aceitar uma parte dela é o começo da jornada. O sofrer em si não tem sentido nenhum e é doloroso. Mas o sofrimento com significado pode ser menos terrível.
A magia não é somente uma busca por poder, mas podemos aprender muito através dela. Quando é trabalhada dessa forma, se torna uma busca mais plena para autoconhecimento e crescimento espiritual.
Ótimo artigo! Esse tema do orgulho e do poder espiritual cai como uma luva em muito neófito, grupo do qual eu faço parte. A gente está desgostoso com a vida, começa a estudar alguma vertente esotérica e realiza a transição: a ambição deixa de ser em obter uma Hillux e vai em direção a obter uma viagem astral.
Aliás, já perceberam como que o Neófito em geral tem sede de Viagem Astral? Já conheci muito iniciante no esoterismo que tem uma fixação enorme em fazer viagens astrais. Será que isso não tem a ver justamente com esse ímpeto de dominar o espiritual ao invés do material?
@Wanju – Muito obrigada pelo comentário! Às vezes nós começamos a fazer boas coisas inicialmente por motivos “errados”. Começamos a estudar alguma vertente esotérica achando que estamos buscando o autoconhecimento, quando no início o que nos move é apenas curiosidade, desejo de parar de sofrer ou aumentar nosso poder. Então nós buscamos as mesmas coisas para ajudar uma pessoa, mas isso pode acabar aumentando nosso orgulho ao vermos a nós mesmos como aquele com o poder de ajudar outros seres.
Acho que todos nós, ou quase todos nós, iniciamos nossa busca espiritual por motivos um pouco egoístas, mas aos poucos isso se transforma conforme aprendemos mais. Uma Viagem Astral, por exemplo, pode aumentar nosso orgulho e desejo de poder, mas se persistimos na nossa busca em vez de interpretar essa prática apenas como uma viagem prazerosa, a Viagem Astral pode se tornar um exercício que permite o crescimento espiritual.
A curiosidade e o prazer podem ser motivações benéficas contanto que enxerguemos a curiosidade apenas como o motor inicial e o prazer não como a recompensa final da jornada.
O que dizer deste texto?
Eu passei muita dor depois do término do meu noivado (e relacionamento).
Depois disso acho que me tornei (quase) insensível…..De fato, são poucas as coisas hoje que podem me causar algum “dano” emocional.
O grande problema é conviver com o vazio, o vazio não causa dor, não causa prazer, o vazio é o vazio.
Viver vazio durante tanto tempo neste mundo (a morte demora para chegar) é difícil….muito difícil.
Um objetivo é necessário, nem que seja ao menos para “passar o tempo”.
@Wanju – O vazio é algo tão profundo e importante que mereceria até um texto próprio. Ele pode começar com um grande sofrimento ou também pode iniciar como tédio e se enraizar até virar um tipo de depressão.
O vazio era algo conhecido pela humanidade desde tempos imemoriais. Os filósofos da Antiguidade já falavam dele. Na Idade Média, o termo para vazio era “acedia”, que não por acaso é o mesmo termo em latim para o pecado capital da preguiça (antigamente era referido por “melancolia”). Isso não é nenhuma coincidência, já que no vazio sentimos uma sensação de indisposição para fazer as coisas, ou até para continuar vivendo.
O vazio também era chamado de aridez espiritual, que São João da Cruz chamou de noite escura da alma. É dito que o grande remédio para essa aridez é a perseverança.
Quando nós fazemos uma ação para receber uma sensação boa em troca, em parte o fazemos pela recompensa. Mas quando realizamos a mesma ação e sentimos aridez espiritual (o vazio) é sinal de maturidade espiritual, porque estamos cumprindo nossa missão não pelo prazer, mas pelo dever e obediência.
O vazio seria um sentimento profundo de estar separado de Deus. A noite escura é a etapa de sofrimento necessária para o amadurecimento: separar-se para depois descobrir o valor da união divina. Por isso Deus se esconderia intencionalmente, para passarmos por essa noite e reencontrá-lo.
A noite escura da alma, vc n chora , tenta e não consegue, é estranho como se tornasse um ser sem sentimentos, n ama, n odeia.Como o estivador que ganha umas moedas pra levar pessoas num barco para o outro lado do rio.N sei como sair disso, estou buscando respostas.Acho que a gente só descobre que é de fato, quando estiver no alcance do que busca.Seja poder material ou espiritual.
@Wanju – De acordo com o budismo, quando nos esvaziamos de nós mesmos, de tudo que pode ser chamado de “eu” não resta mais nada, pois não há eu que sente tristeza, alegria ou vazio, tudo é igual quando não nos identificamos com os fenômenos. Não seria indiferença e sim aceitação. Já conforme o cristianismo, quando nos esvaziamos de nós mesmos deixamos espaço para Cristo habitar em nós. “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim” disse São Paulo. A experiência da noite escura é uma experiência de morte, de ausência de nós mesmos e vazio absoluto. Não conseguimos sentir nada porque uma lança foi fincada no coração.
É preciso morrer para renascer e a noite escura da alma representa um avanço espiritual. É a preparação da morte do ego. Quando continuamos apegados a nosso eu externo e antigo, é doloroso suportar a noite escura. Para passar por ela, é preciso aceitar a morte. Isso significa aceitar morrer para nossos sentimentos antigos de apego ao mundo material e mental.
Na noite dos sentidos ainda estamos muito apegados às sensações corporais. A noite escura da alma é um apego forte às sensações mentais, o desejo de sentir sensações agradáveis e evitar as desagradáveis.
Para sair dela devemos aceitá-la. Devemos dizer a nós mesmos: “eu aceito sentir uma sensação de vazio para o resto da vida se isso me trouxer a verdade/Deus/crescimento espiritual”. Normalmente quando a enfrentamos, a noite passa. Quando tentamos fugir dela, como do sofrimento, ela eventualmente continua a nos perseguir e nos reencontrará.
Alguns místicos possuem noites escuras muito longas, enquanto as de outros são curtas. O correto é pensar: “não importa se minha noite é curta ou longa. Aceito o que for necessário” e assim damos o próximo passo.
Quando nos apegamos ao prazer de estados alterados de consciência eles inicialmente nos servem de consolação para substituir prazeres materiais. Mas quando perdemos a ambos, vem a noite. Se aceitarmos perder todo tipo de prazer, virá o amanhecer, exatamente porque nesse momento é indiferente a nós ser dia ou noite, contanto que possamos cumprir nossa missão nesse mundo.
@Wanju, nunca me senti vazio de tudo , não consigo imaginar tal estado.
Mas me sinto “vazio de prazer”, e cheio de tristeza, Vazio de poder, e cheio de impotência.
Objetivamente, estou doente há 37 anos – mentalmente doente.
Um dos efeitos colaterais dos medicamentos é- no meu caso – a disfunção erétil e a dificuldade para ejacular.
Quando estou com sede e bebo um copo de água gelada,, sinto prazer – mas esse prazer é infinitamente menor que o prazer de penetrar numa mulher e deixar meu líquido dentro dela – faz alguns anos que isso aconteceu da última vez.
Obter um pouco de poder , para me sentir menos “vazio de prazer” e menos “cheio de sofrimento” – é um dever que tenho comigo mesmo? Ou uma forma de alimentar o desejo de poder?
Alef plus Met
@Wanju – De acordo com o budismo, produzir karma bom é melhor do que produzir karma ruim, mas no final das contas tudo é karma. E onde há combustível há chama. Sendo assim, a etapa final da jornada seria não alimentar o desejo de poder.
Na visão cristã, o orgulho é o maior dos pecados (o pecado de Lúcifer) que dá origem e alimenta todos os outros. No fundo, tudo que nos faz sofrer se origina de desejar dar continuidade ao “eu” e fazê-lo aparecer mais e mais. Quando queremos prazer, estamos desejando que nosso eu cresça.
Já na Magia do Caos, é possível escolher variados paradigmas e testar os resultados. Num paradigma em que se deseja a alegria e o poder, será buscado que eles sejam alimentados. Pode ser positivo no começo, mas também é bom observar os efeitos a longo prazo. Caso se escolha um paradigma em que se busque humildade, menos poder e a diminuição do ego, o caminho a percorrer é outro.
Agradeço pela resposta, Wanju!!!
@Wanju – De nada! 🙂
E qual é o problema de buscarmos uma maneira de controlar a nossa ira se ela machuca aos demais?
Devemos amar, ao próximo como a nós mesmos, e é normal querermos confortar aqueles que amamos.
@Wanju – Meu argumento central no post é que muitas vezes temos intenções ocultas, como desejo de poder, por trás de muitos atos que fazemos, mesmo por trás de atos bons. Eu não disse que é ruim fazer coisas boas como controlar a ira e ajudar os outros. Eu apenas disse que é ainda melhor fazer a ação positiva com a intenção correta. Obviamente, não possuir nem a ação e nem a intenção é ainda pior.
Meu texto foi escrito tendo em vista pessoas que talvez já realizem coisas boas, mas desejam aprofundar ainda mais sua espiritualidade. Tudo começa com o ensino básico de moralidade: “Não machuque os outros, seja gentil com seu vizinho, etc”. Depois de já fazer essas coisas, quem quer partir para o segundo passo necessariamente deverá adotar um ponto de vista mais rigoroso. Tanto que é dito que os maiores santos são exatamente aqueles que se consideram os maiores pecadores. Eles enxergam a falha deles até mesmo nos detalhes.
No Antigo Testamento é dito “Não adulterarás”. No Novo Testamento Jesus diz: “Eu, porém, vos digo que qualquer um que olhar para uma mulher com intenção impura, em seu coração, já cometeu adultério com ela”. É uma ética mais difícil de seguir, mas mais profunda.
Wanju, lindo post.
ser escravo ou senhor? caminho do meio é melhor?
ou um e outro alternadamente…..Não importa, você abordou o Budismo e não dá para
ignorar essa jóia de conhecimento do Oriente bem como a Yoga e sem isso até as pérolas do Ocidente (incluindo a Magia Ocidental, a Magia do Caos, Kaballah, ensinamentos de Yeshoua, Kardec, Umbanda, Ciência e !) perderiam um tanto de brilho na visão do conjunto . se alguém escolhe ser FDP, tem que ser respeitado desde que não gravite na órbita de quem não escolheu essa estrada. O Universo -ou Multiverso- é infinito, tem espaço para todos, mas a Vontade é determinante mesmo quando quero esvaziar a mente e encarar esse vazio. Cada um de nós faz o seu caminho, (a estrada de cada um:karma) religiões, filosofias, conhecimento, tudo serve ao propósito, agora nada impede seguir o caminho do 8 (caminho óctuplo) e ser um Ser que gosta de ser o que é e a partir daí vamos descascando as camadas de ignorância que nos envolve (buscando expressões mais sutis, inteligentes e emocionais menos neanderthal) e casar a Vontade com a Verdade mesmo sendo partes de um Todo e mesmo talvez para há anos-luz quando nosso Eu estiver no Todo sem ser mais Eu.
felicidades (é bom né.)
@Wanju – Muito obrigada! E ótima reflexão! ;D
Muito bom!
Tenho passado por uns perrengues na vida que não fosse ter conhecido Eliphas Levi e Nietzsche eu já estaria largando mão de todos os meus deveres em busca da MINHA “felicidade” (que ingenuidade).
Aprendi que a felicidade vem do equilíbrio entre direitos e deveres, momentos de esforço e ócio, de alegria e tristeza.
Quão incauto eu fui um dia em pensar que eu não deveria sofrer por ninguém. No fim eu sofri minha própria miséria. É muito menos penoso sofrer por outro. Pelo menos é motivador.
Tem uma música que diz bem sobre isso. Sobre a vida não ser esse mar de rosas (não é nem nunca será, deal with it!).
“Se o que você quer em sua vida é só paz
Muitas doçuras, seu nome em cartaz
E fica arretado se o açúcar demora
E você chora, cê reza, cê pede… implora…
Enquanto eu provo sempre o vinagre e o vinho
Eu quero é ter tentação no caminho
Pois o homem é o exercício que faz
Eu sei… sei que o mais puro gosto do mel
É apenas defeito do fel
E que a guerra é produto da paz”
Pode-se dizer, então, que o caminho da mão esquerda é apenas uma busca pelo tal poder espiritual?
O poder é o sol pelo qual as emoções humanas orbitam, o bem é só uma forma de fazer o bem a si mesmo indiretamente por meio da compreensão do sistema social. o amor é uma posse, a inveja é querer posse, a raiva é reivindicar poder, a tristeza é lamentar não ter tido poder pra controlar o fato.
Até a ignição dentro de mim pra fazer esse comentário aqui envolve abstratamente uma auto afirmação de poder.
texto magnífico, parabéns
eu vejo a morte como o ponto onde o oroboros morde a própria cauda. Toda iniciação é uma morte seguida de ressureição, a morte é o grande iniciador, morrer é a grande iniciação. Somos como uma fênix constantemente morrendo e ressucitando das cinzas do nosso eu anterior. Pelo fogo a natureza se reintegra integralmente