A Originalidade na Magia do Caos


Por Wanju Duli
“Assim como é em cima, é embaixo, e também no meio”
– P.J. Carroll, “The Octavo”
Quando falamos em Magia do Caos, logo vêm à nossa mente nomes como Austin Osman Spare e Peter J. Carroll; o primeiro, idealizador dos sigilos e do Alfabeto do Desejo, enquanto o segundo ocupou-se de elaborar a IOT, uma Ordem particularmente exótica e ousada, tendo como base sua obra “Liber Null”.

Em Liber Null podemos encontrar excertos como Liber MMM e Liber LUX, que constituem as primeiras propostas desse sistema, com uma série de exercícios. Somos apresentados à Caosfera, o Sigilo do Caos, que seria um espelho de escuridão para comunicação entre os adeptos, segundo as palavras do autor. O termo “Caos” é escolhido, pois vocábulos como “Deus” ou “Tao” estariam condicionados às impressões mentais previamente atribuídas a tais expressões.
Nessa mesma obra, Carroll afirma que os Iluminados de Thanateros são os herdeiros mágicos do Zos Kia Cultus de Spare e da A.’.A.’. de Crowley. Ele inclusive cria um diagrama maluco para provar isso, demonstrando em que medida diferentes tradições mágicas se conectam a IOT.
Contudo, a ideia não era apenas desenvolver uma nova tradição mágica com a junção de diferentes elementos previamente existentes, como podemos ver nos seguintes trechos do autor:
“O intelecto é uma espada, e seu uso é para evitar a identificação com qualquer fenômeno particular encontrado. As mentes mais poderosas agarram-se ao menor número de princípios fixos. A única visão clara é do alto da montanha dos seus egos mortos “.
É um erro considerar qualquer crença mais libertadora que outra. É a possibilidade de mudar que é importante. Cada nova forma de libertação está destinada a eventualmente se tornar outra forma de escravidão para a maioria de seus adeptos. Não há liberdade da dualidade neste plano de existência, mas podemos ao menos aspirar à escolha da dualidade“.
A energia é liberada quando um indivíduo quebra as regras de condicionamento com algum ato glorioso de desobediência ou blasfêmia. Essa energia fortalece o espírito e dá coragem para atos de insurreição“.
A intenção mais profunda de Carroll era desenvolver uma magia que permitisse a mobilidade de sistemas de crenças, utilizando a crença escolhida somente como uma ferramenta para atingir determinado objetivo, dando mais ênfase ao resultado do que ao processo em si. Isso incluiria até uma possibilidade de inversão ou alteração em princípios éticos clássicos, pois, conforme o próprio autor diz, logo você descobrirá que ideias que nos parecem bizarras, loucas, extremas, arbitrárias e sem sentido são tão malucas quanto aquelas que antes julgávamos como razoáveis, sensíveis e humanitárias.
Com o texto “Truque da Mente em Demonologia”, apresentado em Liber Kaos, podemos sentir essa ideia:
Liber Boomerang
Um deus ignorado é um demônio nascido.
Pensa você na hipertrofia de alguns egos à custa de outros?
O que é negado ganha poder, e busca formas estranhas e inesperadas de manifestação.
Negue a morte e outras formas de suicídio irão surgir.
Negue o sexo e formas bizarras de sua expressão irá atormentá-lo.
Negue o amor e sentimentalismos absurdos irão incapacitá-lo.
Negue a agressão, apenas para eventualmente fitar a faca ensanguentada em sua mão trêmula.
Negue medos e desejos honestos apenas para criar neuroses e avareza sem sentido.
Negue o riso e o mundo rirá de você.
Negue a magia apenas para se tornar um robô confuso, inexplicável até para si mesmo
”.
No entanto, isso não significa que os caoístas destroem completamente a noção de moralidade, como nos relembra Phil Hine, em “Condensed Chaos”:
Assim, apesar do glamour, os magos do Caos raramente são completamente amorais. Um dos axiomas básicos da filosofia mágica é que a moralidade cresce de dentro, uma vez que se começa a conhecer a diferença entre o que você aprendeu a acreditar e o que você quer acreditar”.
A ideia é quebrar noções pré-estabelecidas para começar a construir seus próprios castelos de areia nesse terreno fértil; estabelecer os fundamentos de suas ideias acerca da realidade; ou perceber que simplesmente não necessita de algo assim.
Isso nos recorda um pouco das três metamorfoses do espírito de Nietzsche:
Qual é este grande dragão a que o espírito já não quer chamar nem senhor, nem Deus? O nome do grande dragão é ‘Tu deves’. Mas o espírito do leão diz: ‘Eu quero.’
Inicialmente somos um camelo, que carrega o peso dos valores. Devemos nos converter em leão para destruí-los. E, finalmente, nos tornarmos crianças para criar.
Na verdade, irmãos, para jogar o jogo dos criadores é preciso ser uma santa afirmação; o espírito quer agora a sua própria vontade; tendo perdido o mundo, conquista o seu próprio mundo”.
Estamos esquentando? Pois bem. Que pegue fogo! Para começarmos a tentar compreender que é a Magia do Caos, sugiro algumas palavras de meu escritor favorito sobre o tema, o cavalheiro chamado Ramsey Dukes, Lionel Snell, o Rato que Gira, ou seja lá qual foi o codinome que esse senhor resolveu adotar dessa vez. Comecemos com SSOTBME (“Sex Secrets of the Black Magicians Exposed”):
“Magia do Caos é, com efeito, o mais seguro sistema mágico que existe. Paradoxalmente, no entanto, ganhou uma reputação vermelha e quente por ser a mais perigosa, sinistra e insana forma da loucura mágica remanescente”.
Quando assumimos a premissa de que “Nada é verdadeiro. Tudo é permitido”, pode ser realmente assustador. Você precisa lidar com sua imaginação e principalmente com um verdadeiro terror: sua liberdade.
“Um magista prático não tem interesse nos problemas filosóficos que atormentam o cientista que pergunta: ‘Tem certeza que foi a sua magia que a curou? Como você sabe que não foi apenas uma coincidência?’ Tal especulação é irrelevante para o Mago. Ele fez o feitiço, ela foi curada. Se fosse uma coincidência, não importa contanto que ele possa trazer tais coincidências “.
Um caoísta está mais preocupado com o resultado prático, as emoções geradas, o chacoalhar de paradigmas, do que em vestir robes, carregar espadas ou enredar-se em paradoxos ontológicos. Para isso, ele realiza uma profunda investigação acerca dos processos mágicos, com a intenção de desvendar os caminhos que o levam a ativar as engrenagens da magia.
Enquanto a magia tradicional possui força pelo peso de seu caráter inveterado, riqueza cerimonial e alto teor filosófico, o poder da Magia do Caos reside em adaptar sistemas conforme o gosto, para que a paixão do magista e sua metamorfose paradigmática inflamem sua vontade e gerem essa carga empírica de transformação.
“Assim, é inútil perguntar a um magista se Deus, anjos ou demônios ‘realmente existem’. Simplesmente ao dizer as palavras você os fez existir! Pergunte novamente se essas entidades abstratas podem produzir qualquer efeito no mundo físico, e eles já produziram – eles fizeram você fazer perguntas “.
Agora, veremos o que Dukes tem a nos dizer em sua obra “BLAST Your Way To Megabuck$ with my SECRET Sex-Power Formula”:
“Nós não podemos acreditar agora na dualidade antiga dos que estão trabalhando para o bem e dos que estão trabalhando para o mal, porque fazer qualquer mudança é invocar a incerteza. A nova dualidade é entre aqueles que desejam manter as coisas como estão, e aqueles que desejam mudá-las”.
“Eu quero ser rico, feliz, sexy, poderoso ….
Ei! Eu descobri essa coisa chamada ‘magia’ que pode torná-lo rico, feliz, sexy, poderoso …
Uau! Estive lendo sobre magia e descobri que é realmente muito simples se tornar rico, feliz, sexy, poderoso … contanto que você faça uma coisa – você deve se tornar perfeito primeiro.
Então, como você sabe quando se tornou perfeito?
Oh merda. Você sabe que é perfeito quando você já não QUER ser rico, feliz, sexy, poderoso …”
E, para finalizar, uma frase de Hugo C. St. J. l’Estrange:
“Quando a humanidade irá crescer fora de seu flerte com a ética cristã, e encarar o fato de que o Grande Princípio Cósmico não é fazer o que é certo e honrado, mas fazer o que é errado com ESTILO”.
Espere, eu disse “finalizar”? Esse é só o começo. Magia do Caos é muito mais do que brincar de utilizar vários estilos de magia previamente existentes e misturar tudo para se revoltar contra a autoridade. Quando você quebra seus conceitos não irá simplesmente preencher o espaço coletando vários pedaços de conceitos aqui e ali, como se estivesse num buffet em self-service, selecionando os pratos que lhe parecem mais saborosos para montar o seu.
Você pode até experimentar os diferentes pratos no começo, para aprender os sabores. Mas em algum momento o caoísta DEVE tornar-se um cozinheiro. Esse é o coração da Magia dos Caos: ser um verdadeiro chef de sistemas do ocultismo. Pois a Magia do Caos não é somente um novo sistema, um destruidor de sistemas ou um agregador deles. Antes, é um “sistema criador de novos sistemas”.
E aqui iremos resgatar alguns excertos do brilhante artigo de Frater Xon, membro da IOT North America, chamado “O Magista Eclético vs. O Magista do Caos”:
Qualquer um pode ler um livro de magia e cuspir de volta o que está contido nele. Memorize gematria e livros de Crowley, e de repente você é um mago Hermético. Leia um livro de xamanismo, compre um tambor, e de repente você é um místico tribal. Dê algum dinheiro para as pessoas certas, memorize alguns cânticos e orações, e de repente você é um Santero. Maldição, vá em frente e leia Spare, desenhe alguns sigilos e puf! Instantaneamente ‘Magista do Caos’!”
Estes são todos truques e ilusões mentais inexpressivos. Mesmo um papagaio pode repetir os sons que ouve sem compreendê-los “.
“O verdadeiro caoísta tem a capacidade de dar à luz coisas novas e incomuns. Eles podem criar novos sistemas, novos métodos e novos rituais fora do que já foi criado. O verdadeiro caoísta é essencialmente um artista “.
“Se você não pode criar algo novo para mim, então eu não estou particularmente interessado em você. Eu não me importo se você memorizou todos os livros de magia do planeta. Eu não me importo se você está sentado em seu templo realizando rituais pré-fabricadas doze horas por dia. Se você não consegue pensar numa única coisa nova para me oferecer, o que há de bom em você? Você é apenas um computador dizendo as mesmas coisas antigas que outras pessoas já disseram antes”.
“Mas, se você pode criar uma única coisa simples de pura criatividade que funciona, mesmo se não é a coisa mais incrível do mundo, isso ainda me impressiona muito mais do que todas as bibliotecas de magia do mundo.

E aqui finalmente concluímos nossa introdução sobre a Magia do Caos, com muitas citações, refrescos e poderosas frases de efeito, para tentar agradar tanto aos mais tradicionais quanto àqueles que estão cansados do velho cadáver mágico, já tão desgastado e apodrecido. A Magia do Caos é uma vertente incrível e muito viva, que está em polvorosa na atualidade, tanto no cenário nacional quanto internacional, com propostas criativas, inovadoras e extraordinárias.

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Respostas de 42

  1. Parabéns pela sua estreia aqui Wanju!
    Tenho certeza que vai adicionar muito ao TdC , o pessoal tava esperando uma coluna de caos magick faz tempooo.
    Bjs !
    Ps: Também quero ser rico, feliz, sexy e poderoso

  2. Maravilhoso post Wanju! Como já acompanho seu blog, praticamente desde o inicio já conheço bem seu linha de raciocínio. Ótima ideia do MDD de pedir para um autora tão boa escrever sobre magia do Caos aqui no TdC!
    Que venham maravilhosas postagens sobre a louca filosofia dos magistas do caos xD
    Paz e Luz!
    Mika’el

  3. Muito bom!
    Eu sentia que uma coluna de Magia do Caos estava fazendo falta no TdC.
    Algumas vezes comentei sobre essa vertente, que tanto me admira e vai ao encontro de minhas reflexões, em minha própria coluna. Mas não é minha especialidade.
    Sempre fui para a parte filosófica da questão, essa sim a área que me sinto mais a vontade.
    Seja bem vinda!
    Abraço,
    Igor Teo (Artigo 19)

  4. Ideias que eu acho muito parecidas ao que me atraem no livro Mitologia, de Roland Barthes, 1957, ou: como o assunto era tratado pela academia antes dos “memes” do Dawkins.

  5. Wanju, a menina de mil e uma utilidades!…como você consegue fazer tanta coisa e com tanta qualidade???
    Só pode ser magia!!!
    Eu te desejo sorte e muita diversão em mais esta empreitada dentro do ocultismointernistico do Brasil, que seus caminhos se abram por ande você passar… E como sempre será uma grande honra acompanhar as suas postagens em mais este portal.
    Paz…

  6. Bem vinda Wanju, com sua Magia de Liberdade…
    Minha magia é meu pensamento… Que responsabilidade! Que potencialidade! Que felicidade…
    Abs
    raph

  7. Se eu quiser construir um carro, mas em vez de juntar as peças feitas de metal, vidro e plástico e usar gasolina como combustível, o fizer usando pedaços de cartolina e sacos de supermercado, o “carro” nao funcionará.
    Se eu quiser construir um computador, mas em vez de usar chips de silício e fios condutores, fizer tudo com lascas de madeira e pedaços de papel, a “máquina”
    nao funcionará.
    No final das contas, o que me parece é que a “magia do caos” é um produto da mentalidade “faça o que quiser que vai dar certo”. Na minha experiencia, todos os “caoístas” que conheci são completamente ignorantes a respeita dos princípios teóricos e práticos da magia tradicional, e mesmo assim em sua ignorância a descartam.
    A consequência disso é um “sistema” mal feito, com uma base teórica sem sentido algum (que pode ser resumida em “faça o que quiser que vai dar certo”) e cujas práticas simplesmente não produzem resultado.
    Gostaria muito de ser refutado com relatos de práticas “caoístas” que produzam resultados de modo consistente e frequente.
    @Wanju – Um carrinho feito de cartolina pode não funcionar para um adulto, mas funcionará muito bem para uma criança que tem imaginação para inventar os universos de suas brincadeiras.
    Eu respeito a magia tradicional e não a acho pior ou melhor que a Magia do Caos. São apenas diferentes, efetivas para indivíduos com inclinações diferenciadas.
    Magia não se reduz apenas a feitiços, mas consiste numa investigação das causas que te levaram a ter os desejos. A Magia do Caos analisa o sistema de crenças do indivíduo, tendo em vista realizar uma alquimia mental. Ao analisar a realidade sob diferentes pontos de vista, se alcançaria uma compreensão mais abrangente do todo.
    Se uma magia te traz felicidade, ela produziu seu resultado.

    1. Ao que me consta o primeiro insight do caoismo é não prender-se demasiadamente aonde quer que seja. Para que um paradoxo se posso ter todos? ou nenhum?
      No entanto para refutar suas insinuações… como desprezar a possibilidade de andar ao meu modo justamente por que me dou a liberdade de ser ao meu modo? Só por que meus estímulos não seguem a liturgia cabalística ou voodoo? para ser um tanto quanto mais sarcástico… Se posso flutuar por meio da magia cerimonial, o que me impede de escrever no ar com meus próprios sinais? O fato de te-los como caóticos torna-os menos magia? Se for por magia, temos a condição de que esta é em suma a intervenção da vontade sobre a realidade, por que minha vontade tem de seguir fluxos já desgastados… por que é mais fácil?
      ah… não seja tolo. Se despreza o caoismo por não ser “cientifico” dentro dos requisitos ocultos… vc despreza a própria magia.
      Se tenho liberdade pra me prender a moldes, tenho a mesma intensidade para livrar-me destes.

    2. Entendo que a questão da “magia do caos” é focar na função e não no objeto. Se eu posso substituir o objeto carro por um pequeno caiaque ou boia como meio de transporte e o objeto computador por um ábaco para as operações mais simples, eu poderia usar exatamente esses materiais que descreveste.

    3. Henrique, você aparentemente não tem nenhuma intimidade com sigilos e servidores, técnicas tipicamente caoistas e que funcionam.
      De qualquer forma, não se trata de “faça o que quiser e vai dar certo”. É mais no sentido de “desde que dê certo, faça o que quiser”.

    4. E quem colocaria asas em um carro? Quem o teletransportaria? Quem fária um hibrido de carro e barco? Quem faria um carro sem rodas? Conhecer a causa e o efeito de tudo que conhecemos e cria-las para um novo propósito é o puro caos. Criar carros de todas as formas para depois descobrir que bicicleta é muito mais divertida.
      Conhecer e lidar com todas as “ferramentas” existentes não é fácil. Você só vence um paradigma se o conhecer profundamente, você só altera algo se conhecer profundamente suas bases.

    5. Da mesma forma como dogmas impediam a manifestação da Vontade Pura a obedecer paradigmas, a Wanju habilmente tentou explicar que estes paradigmas continuam a existir, porém agora os paradigmas que obedecem a Vontade Pura de praticantes da Magia do Caos. Dogmáticos buscam seus dogmas, enquanto pragmáticos os usam. Assim como focamos uma crença para cada ritual, que pode ser a mesma de antes ou não, alcançamos nossas metas, pelo pragmatismo que é única semelhança a todos praticantes da Magia do Caos. Quem pratica Magia do Caos e não busca seu sucesso está brincando… rs*. Justamente porque estas peças de madeira podem nos servir como um novo computador. Quer aprender a usá-lo?

    6. Concordo. Por uma única razão: Eu fiz a minha primeira individuação, segundo a linha caótica, com 25 anos. Arrisquei. Atravessei o ritual de passagem do Eremita por causa disso… Não me sinto arrependido, pelo menos de Malkuth a Hod viajei. Estudei arcanos, racionalizei a sombra, conheci o meu selvagem – aquele arquétipo peludo – dediquei tempo, conheci amigos, Carl Gustav Jung, Fernando Pessoa, Friedrich Nietzsche, Aleister Crowley, Marcel Proust, Liev Tolstoi, Bordalo Pinheiro, Denis Diderot, Freud, Albert Pike… e mais dezenas e dezenas… Foi tanta a luz que quase me cegou. Derrubei a moral, criei ética, descobri os sentidos. Ah! Fui mesmo Louco aos olhos de quem me via… Ultrapassei a fímbria do precipício. Tive sorte, não fui preso nem morri de corpo – o que para um caótico é não morrer porque não existe o algo mais – é absurdo segundo Camus, não é científico, não existem manifestações sobrenaturais. E eu questionei mesmo: O que é um sentimento? O que é um pensamento? Respondi a muitas perguntas que eu próprio levantei. Até Édipo Rei foi víctima da minha sede. Recriei-me:
      “Porque deslembra quem então era eu?
      Porque não há nenhuma semelhança
      Entre quem sou e fui?
      A criança que fui vive ou morreu?
      Sou outro? Veio um outro em mim viver?
      A vida, que em mim flui, em que é que flui?
      Houve em mim várias almas sucessivas
      Ou sou um só inconsciente ser?”
      Cheguei ao fim do percurso e encontrei o NADA. No entanto, senti calma durante um tempo, a tempestade de arrasar o Ego é grande e existe sempre a bonança. Hoje, com 29 anos, estou a pensar seguir outro caminho, sinto-me um neófito. Será a árvore da vida apenas uma matriz de como compreender cabalmente o ser humano? Ou estarei eu errado e existirá algo mais? Com esta idade deduzo que P. J. Carroll caiu na mesma armadilha que ele acusou outros de terem caído, no EGO. Dizer que outros caem nele é ter noção de superioridade e julgar-se ileso de tal erro é paradoxal. A coisa mais difícil é estar sozinho… E é tão frustrante ter algo em mim – que desconheço- mas me faz sentir ungido e ao mesmo tempo ter nocão carnal que nem poeira sou. Choronzon é a linha do Caos, depois do abismo não existe Coroa. Não será arrogância de minha parte descartar tantos magos ancestrais que dedicaram a sua vida à Opus Magna e tão cedo dizer que o limite ilimitado é o NADA? Os caóticos são teóricos, já por isso eu digo que a iluminação deles estagna em HOD. A partir daí só existe a prática, e para ser um Ipssissimus, ser UNO, palavras como glamour, loucura e falsidade não podem fazer parte do vocabulário.
      «Uma sensação de alívio percorre-me… Vagueei como um louco até à fímbria do precipício. Atiçaram-me para que o excedesse, o medo perseguiu-me até ao limite. O fim é apenas o inicio, o começo de sentir sem medo. Agora descanso, o vento estimula-me os sentidos e o som que me rodeia acorda-me solenemente de um profundo sono para um simples virar de página. Com um sorriso calmo, nunca pensei que o meu pensamento ultrapassasse a borda.
      Eu, que julguei estar somente errado…»
      Tem de existir algo mais! Quem sou eu senão um réprobo para acreditar em tão pouco? A carne é roupa… O Ego pertence à carne. A que pertenço Eu?

  8. Bem vinda mesmo Wanju! Perfeito, é o que tenho a dizer. Fazia tempo que não me deparava com algo tão bom e estimulante.
    A magia do Caos sempre me fascinou e agora mais do que antes me delicio com as possibilidades desta.
    “Quando a humanidade irá crescer fora de seu flerte com a ética cristã, e encarar o fato de que o Grande Princípio Cósmico não é fazer o que é certo e honrado, mas fazer o que é errado com ESTILO.”
    Perfeito!
    Abraço e seja bem vinda!

  9. Certa vez, uma praticante de magia do caos, pertencente a uma ordem caoísta que não vou citar, disse que a orientaram a fazer a seguinte prática: urinar em um balde, defecar, colocar junto um pouco de seu sangue e deixar por uma semana num local escuro, após isto passar esta linda mistura em todo seu corpo…..
    Perguntei a ela se sabia o que estava fazendo, qual o objetivo desta prática, e disse que não…simplesmente que era para despertar energias do lado negro de si mesma…
    Bem, pra bom entendedor de magia, o que disse basta…Qualquer cidadão que conhecesse a fulana saberia que não tem a mínima estrutura para brincar com caos e muito menos demônios….

    1. Lauro
      Caos não tem absolutamente nada a ver com demônios. A não ser que a pessoa resolva trabalhar com esse paradigma, o que é tão possível quanto trabalhar com os deuses nórdicos, por exemplo.

      1. Demônio é apenas uma palavra que está ligada com a imaginação particular de uma pessoa. Não existe fora da mente da pessoa que criou o conceito. Na verdade, nem o conceito verbal, nem o clichê mental existem fora de quem os criou. Mas, existe ainda uma egrégora ligada a quem criou as imagens.Para mim, o demônio é um cocô de cachorro.

  10. Muito bom.
    Trata-se da responsabilidade humana máxima. A desprogramação e contrução “por projetos”.
    A Magia do Caos precisa ser melhor compreendida. Acredito que a maioria dos grandes magistas utilizaram conceitos e colocaram em prática muitos “fundamentos” do que hoje costoumou-se chamar Magia do Caos. Portanto, se alguém não sabe, é uma tarefa espinhosa tentar explicar.
    Boa sorte.

  11. Estava sentindo falta da Magia do Chaos!!!!
    Realmente é minha forma de magia favorita!
    E ao contrario do que foi dito, Magia do Caos tem base sim e muita!
    E (para MIM) funciona muito bem! 80% dos meus sigilos deram certo, tive varios servidores que funcionaram… coincidência? Pode ser !! Desde que haja mais coincidências a meu favor…
    E.. Salve Éris!!!
    FNORD

  12. Em primeiro lugar gostei bastante do texto e ele parece ter sido feito de boa fé,isso ligado ao fato de ser uma mulher a escrever sobre esse assunto me assusta de uma maneira muito boa ^ ^.Acompanho esse blog desde seu inicio e aprendi a julgar os colunistas mais pela segurança dos comentários do que o próprio texto em si.Com relação a resposta da criadora do texto para o Henrique Monteiro,foi sem duvida muito interessante,um nível bem diferente dos demais.
    Vou fazer uma pequena especulação.
    Se na magia do caos aspirante dessa versão também deve cultivar a consciência, vontade,imaginação e reflexão,e uma disciplina(toda disciplina é rígida em si) de quebra de paradigma,Bem não vejo muita diferença desse sistema para o hermético em si.Já que acredito na minha ignorância com relação a esse assunto que também seja necessário bastante tempo e dedicação para conseguir algum nível na realização de desejos utilizando esse método.Isso tudo me lembra aberturas de xadrez.Para quem não conhece as teorias de abertura do xadrez, elas poderiam ser dividas em 2 grupos,um grupo que preza o domínio do centro com os peões e outro busca vigiar as casas centrais com peças a distância.Algumas aberturas e defesas são chamadas de “irregulares” pois seus conceitos são demasiado abstratos.Ex:A máxima “um forte centro de peões asfixia o adversário” é encarada na abertura irregular de maneira inversa:um forte centro de peões deve ser fixado,bombardeado em sua base e alicerces e todo avanço gera aberturas internas.Bem provavelmente ninguém entendeu muito me expressei mal com relação a esse assunto,mas resumindo,interessantemente os jogadores que se aventuram nas aberturas irregulares ou Hipermodernas e conseguem resultados sólidos interessantemente são aqueles que outrora eram os mais conservadores,e por isso tornaram seu sistema próprio tão aberto e amplo que centro de peões e peças o vigiando, são só conceitos que eles manipulam somente afim de conseguir vantagens para o meio jogo.
    Gostaria de fazer só mais uma analogia.Essa divergência entre magia do caos,thelema e magia mais conservadora,também se assemelha muito na discussão referente a arte clássica,arte moderna,e a arte contemporânea.Na arte moderna via-se artista buscando algo novo mas com um forte estudo teórico e pratico sobre o antigo(negar o passado,fazia surgir coisas novas) ,já na segunda,observava uma serie de artistas colhendo os frutos do modernismo,mas somente usando a parte menos importante(a negação tornou-se o novo).A abertura dos ideais na arte foi tamanha que os artistas simplesmente não buscavam mais o passado e a arte agora é tudo que se faz com fins artísticos.Os “teóricos” desse assunto dizem que a arte de hoje vive e transita pelos caminhos de todas as épocas sem preconceito,mas eu como estudante percebo somente a busca pelos caminhos tortos,sem base nos antigos idéias afim de tornar-lhe interessante(ela se tornou tão bizarra que nem da mais para colocar entre o belo e o feio, abstrato e mimético).Lhe obrigam a saber tanto sobre as obras que ela acaba não sendo nadas só idéias sem fundamentos de um Rei sem duvida alguma “nu”,mas que por algum motivo sobrevive(e por um motivo mais bizarro ninguém grita com força que ele esta nu).
    Resumido(pergunto para a autora wanju):Na magia do caos os resultados são realmente mais rápidos?Ou também é necessário ter um talento inato para ser bom nela?
    Mais uma vez grato pelo rico texto.

  13. Muito interessante, realmente reforça aquilo de “tal sistema serve pra tal pessoa” afinal ela desenvolveu aquilo e dai muitos outros seguem e discutem que esse ou aquele é o melhor sistema, esquecendo a que casa pessoa é única.
    Mas isso pra mim não diminui os exercícios feitos no sistema hermético por exemplo, pelo contrario, trabalhar com imaginação e visualização, concentração de qualquer forma é ótimo, seja esses exercícios, jogar RPG, meditar.. afinal vai estar se desenvolvendo, mas se agarrar a um sistema como se só com sua “adaga” consagrada e outros aparatos você vai conseguir fazer a “mágika” sempre achei muito incongruente e limitado.
    (lógico que estou sendo simplista aqui, afinal um aparato mágico esta carregado desta ou daquela vontade, assim como os rituais e etc. servem para desligar/ocupar o lado lógico do cérebro. Mas ter que usar disso não deixa de ser uma limitação e se “Agarrar” a um sistema vai impedir a criação de algo seu).

  14. Wanju Duli;
    Seria possivel alguma bibliografia que você recomende sobre o assunto?
    O texto diz algo sobre livros, memorização deles e toda a pitada ironica, porem acredito que ter uma base e depois procurar um caminho, um novo conceito, uma desconstrução de velhos argumentos, etc, é preciso de um certo modo.
    Parabens!
    E seja Bem Vinda

  15. Olá Wanju,
    Artigo excelente.
    Gostaria de sugerir um tópico para você.
    Como Bruxa, foi meio que natural ler Spare e entendê-lo sob a ótica bruxa, feiticeira… contudo, esta ótica destoa daquela dada pelo Grant (que apresentou e escreveu sobre Spare de uma ótica Thelêmica), ou a do Peter, que tomou o impulso em Spare para criar seu próprio sistema. É raro encontrar bruxos que sequer se lembram do legado de Spare, e da mesma forma, magistas de todas as vertentes parecem ignorar o fato de que Spare era, de fato, um feiticeiro.
    Então minha sugestão seria escrever um pouco sobre quem era, de fato, Spare, e onde Caos e Bruxaria se encontram e se despedem (além de compartilharem algumas vezes o mesmíssimo legado).
    Um abraço!

  16. Por isso acho o ateísmo medíocre. O ateísmo também é uma forma de libertação. Resta o niilismo ou o magismo, diferentes formas de ver a transformação sobre um prisma diferente.

  17. “A sigilação é uma técnica usada na Magia do Caos, baseia-se no fato de que, se você conseguir atingir seu subconsciente com um desejo, ele se manifestará de modo positivo, ou seja, se realizará. Para enganar o subconsciente.” (fonte: Wikipedia) enganar o subconsciente. Então eu poderia fazer um sigilo para ajudar a desenvolver a projeção astral e clarevidência?

    1. Você pode fazer sigilos para tudo. Pode fazer um sigilo para conseguir uma pizza com tomates secos, ou para visitar o planeta Nibiru em corpo astral.

  18. Mas esse tipo e magia não é altamente subjetiva (seus significados, carga emocional…), e portanto só tendo efeito com/sobre seu criador?
    @Wanju – Faz mais de três anos que escrevi esse texto. Vou reler para verificar o que eu disse aqui.
    OK, eu reli. Pois então, dizer que os efeitos da magia são predominantemente psicológicos significa seguir o chamado “modelo psicológico” da magia e essa interpretação é correta somente dentro desse modelo. No “modelo dos espíritos”, por exemplo, os espíritos são entidades diferentes e separadas da mente do magista e ele tem poder de realizar mudanças fora de si e de sua mente. Dependendo do paradigma adotado existem vantagens e desvantagens. Uma vantagem do modelo psicológico é aumentar sua crença na magia. Uma vantagem do modelo dos espíritos é que te dá mais mobilidade para afetar o mundo material.

    1. Entendo, mas eu quis dizer que: como uma magia nova, baseada nos paradigmas e sistemas criados por um magista do caos, podem ser usadas por outras pessoas, que não fazem ideia (jamais totalmente) do seu total significado/sensação, uma vez que aquilo tudo faz um sentido totalmente diferente e especial apenas para o criador? Não é meio sem sentido outras pessoas usarem? Como poderia funcionar se as pessoas disporiam de muito menos conteúdo para entender aquilo? (tentando responder: acho que isso só seria zica se a magia fosse muito floreada né… Em casos mais de boa a coisa é simples e facilmente transmitida em seu conteúdo total, tipo fotamecus, sigilos…)
      @Wanju – Ah, agora entendi sua pergunta. É exatamente o que você falou: em geral sistemas criados pelo próprio magista, embora em tese funcionem melhor para ele, pois é como uma roupa criada sob medida, podem funcionar para pessoas que tenham “tamanhos de roupa parecido” (nesse caso, gostos semelhantes, visões parecidas da magia, etc). Porém, mesmo se para alguém não sirva a tal roupa, sempre dá pra dar uma costurada e pode caber mesmo assim (adaptar detalhes do sistema). Ou usar como modelo para outro magista costurar uma roupa parecida. A ideia do caoísmo é cada um criar seus próprios sistemas, mas é sempre mágico uns se inspirarem com as ideias dos outros, testarem os sistemas novos ou mesmo usarem um sistema criado por todos de um grupo.

  19. Olá Wanju
    Sou um novato interessado amplamente na Magia do Caos
    Li seu texto e é exatamente o que penso: se a casualidade nos ajudou e usamos as coisas certas e devidas, qual o problemas de usa-la
    PS: o link que recomenda para a leitura está restrito, tem como desbloquear?

  20. Não sei quase nada sobre mdc mas me parece interessante mais pela estética e estilo que por razões práticas (curiosamente parece ser essa a vantagem clamada pelos autores). Você acha que o surgimento desse gênero de magia pode ter surgido em resposta ao excessivo poder normalmente conferidos a gurus e aos cultos de personalidade que permeiam esse contexto iniciatico?

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