A Flauta Mágica e a Kabbalah

Dedicada aos mistérios de Ísis e Osíris, a Flauta Mágica, ópera de Wolfgang Amadeus Mozart, é uma das obras mais ricas em conteúdo iniciático da história da música. Escrita para crianças de 9 a 90 anos, não por acaso o próprio Johann Wolfgang Goethe afirmou: “O grande público encontrará deleite ao assistir o espetáculo, enquanto que, ao mesmo tempo, seu alto significado não escapará aos Iniciados”.

Malkuth: Representado por Papageno, metade homem, metade pássaro, vive numa floresta sob os domínios da Rainha da Noite. Seu trabalho é caçar pássaros e entregá-los às Três Damas em troca de guloseimas. Seu nome deriva de uma palavra grega que significa “engendrar, gerar”, pois o personagem encarna a multiplicidade dos desejos perante a unidade espiritual de Tamino. Uma alusão a Papegeai, papagaio, designação de um grau elementar da Ordem dos Iluminados. Preso ao materialismo, Papageno só pensa em tagarelar, fugir, comer, beber e encontrar sua Papagena.
Yesod: Cobertas com véu preto e armadas com uma azagaia de prata, representando o ato certo no momento certo, as Três Damas são as sacerdotisas da Lua. Residem no templo da Rainha da Noite e simbolizam a purificação do corpo físico, do corpo de desejos e da mente, seus véus pretos referem-se à Ísis Velada . Elas salvam Tamino da serpente e lhe oferecem a flauta mágica, símbolo dos poderes latentes do espírito, da divindade adormecida no homem.
Hod: Os três Gênios, os três seres de luz, os três Reis Magos, os dois Vigilantes e o Guardião da Maçonaria. Estes guiam Tamino, ajudam-no em suas escolhas e atitudes. São crianças, pois representam a pureza do Eu Superior.
Netzach: Pamina representa a natureza espiritual do ser humano, a “musa inspiradora” de Tamino. É com ela que Tamino realiza o Casamento Alquímico. “A imagem é bela e fascinante, como olho algum jamais viu antes… Será amor tal sensação? Sim, amor! Não outra emoção” (Tamino ao ver Pamina pela primeira vez)
Tiferet: De origem nobre, Tamino representa os Iniciados que realizam a Grande Obra, a Magnus Opus. No início da ópera Tamino é perseguido por uma serpente, símbolo dos desejos inferiores, representa a sua sexualidade, sua libido. As três Damas matam a serpente indicando que Tamino alcançou a vitória sobre a natureza inferior.  Disposto a lutar, a enfrentar desafios, a fim de conquistar a fraternidade e o amor, Tamino encarna a via longa da alquimia, semeada de provas.
Geburah: Monostatos, além de traidor e perverso, é um escravo forte e rude. Quem assistiu a ópera com atenção verá em Monostatos a exata representação de alguém que faz o mal uso da energia agressiva de Marte.
Chesed: Os três Sacerdotes são os principais guias de Tamino. São eles que propõem o Isolamento, a Solidão e o Silêncio, cobrem o seu rosto com um capuz e o conduzem a iniciação.
Binah: Representante da força das trevas, a Rainha da Noite manipula sua filha Pamina, para assassinar Sarastro, e posteriormente destruir seu templo.
Hochma: Sarastro governa o templo da Sabedoria. Sábio, humilde e servidor, seu personagem é uma referência clara a Zoroastro.
Kether: Templo do Sol ou Templo da Luz, local sagrado onde ocorrem as iniciações e as transmutações, onde Tamino e Pamina são purificados pelos quatro elementos e realizam o Casamento Alquímico, a Grande Obra.
O Tarot

Vocês já devem ter notado algumas semelhanças entre os personagens da ópera e o tarot. Pois bem, Mozart dividiu a ópera em 22 grandes sessões (incluindo a abertura), cada sessão representa um, dentre os 22 arcanos maiores do Tarot.
O Arcano XXI, O Mundo, mostra uma mulher no centro, rodeada por quatro animais, que simbolizam quatro signos do zodíaco  (aquário, escorpião, touro, leão), ou seja, o Leão (Sarastro), o Anjo (Tamino), a Águia (Papageno), e o Touro (Monostatos).
No Arcano VIII, A Força, contém a mandíbula de um Leão sendo aberta por uma mulher. Algumas de suas características são: virtude, coragem, controle, espírito que domina a matéria, a inteligência que doma a brutalidade. Este Arcano é claramente representado no momento em que as damas dominam a grande serpente.
Alguns biógrafos sustentam a idéia de que na primeira versão, ao invés de uma serpente, Tamino seria perseguido por um Leão. No entanto, faltando 18 dias para estréia, o Imperador Leopoldo II proibiu uma sátira chamada “Biografia do RRRR Leão”, cujo título era uma brincadeira com o nome do próprio imperador. Logo, Mozart e Schikaneder perceberam que iniciar a ópera matando um leão no palco não agradaria muito vossa majestade.

A Maçonaria
“Conduzi os dois estrangeiros ao templo, onde serão provados. Cobri suas cabeças primeiro, pois devem ser purificados.” Assim, o orador e o segundo sacerdote trazem capuzes, com os quais cobrem as cabeças de Tamino e Papageno.
Se a Virtude e a Justiça espalharem a glória no caminho dos Grandes, então a Terra será um reino celeste e, os mortais, semelhantes aos deuses.”
A esta altura do texto, fica óbvio dizer que Mozart e Schikaneder eram maçons e que a ópera é uma elaborada alegoria dos simbolismos, dos rituais e dos ideais maçônicos.
Três coisas nos chamam a atenção nesta ópera, a música, a história e a recorrência do número três: três gênios, três sacerdotisas, três sacerdotes, três altares, três caminhos, três conselhos, três instrumentos musicais, três casais (Papageno – Papagena, Tamino – Pamina, Sarastro – Rainha da Noite), três templos (Razão, Sabedoria e Natureza), uma alusão a sagrada geometria e aos três graus fundamentais da maçonaria: Aprendiz, Companheiro e Mestre. Além disso, a ópera foi desenvolvida por três pessoas, o compositor Mozart, o libretista Schikaneder e o alquimista Ignaz von Born.
E o número três não para por aí, a tonalidade predominante na ópera é Mi bemol maior (Três bemóis), segundo Jacques Chailey, seria a tonalidade maçônica por excelência. A “sinfonia” de abertura é marcada pelos Três poderosos acordes em tutti, segundo Philippe A. Autexier, nas lojas vienenses do século XVIII, o ritual empregado nessa época continham ritmos característicos para cada Grau.
Não apenas os três graus fundamentais (Rito de São João) são homenageados, mas de maneira sutil e oculta, todos os trinta e três graus do Rito Escocês Antigo e Aceito estão lá. O mais “óbvio” deles é o 18º Grau, o Cavaleiro Rosa-Cruz.
“Ó Ísis e Osíris, que ventura! A luz do Sol ofusca a noite escura. Vida nova esse jovem há de abraçar; logo, a nosso serviço há de estar. Sua alma é pura, o gênio audaz, dignos de nossos ideais.”  (A Flauta Mágica)
O hino acima possui um total de dezoito compassos e abre a 18ª cena do segundo ato. Nesta cena há dezoito sacerdotes em dezoito assentos dispostos em triângulo. Sarastro, o Sumo Sacerdote (ou seja, Venerável Mestre da Loja) aparece pela primeira vez no I Ato, na cena 18. Quando os três gênios superiores aparecem suspensos no palco numa máquina ela está “coberta de rosas”. Além de todas estas “coincidências” o número dezoito é formado por seis vezes três, o número simbólico crucial e básico da ópera.
 

 Coro dos Sacerdotes

“Glória aos iniciados! Da noite, vencedores! A Ísis e Osíris Graças e louvores! A força triunfou, E por prêmio, abençoa O Saber e a Beleza com eterna coroa”

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Respostas de 23

  1. “E exatamente hoje, 27 de Janeiro de 2012 comemoramos seus 256 anos de existência (35 fisicamente + 221 musicalmente)”
    Provavelmente bem mais do que isso, pois sua genialidade musical já havia “despertado” em outras oportunidades, mais antigas… Mozart foi talvez o caso mais clássico de criança prodígio 🙂
    @FDA – Também acredito Raph, pra nascer com as habilidades que ele nasceu e demonstrar isso tão precocemente, só aprendendo em outras vidas…

    1. E já temos um gênio musical reencarnado: Sungha Jung. A capacidade que esse garoto tem em sua pouca idade é incrível, imagina as obras que ele poderá compor daqui a algumas décadas.
      Fabio, seus textos são muito bons, sempre nos trazendo conteúdo de qualidade.
      Um abraço!
      @FDA – Já li e ouvi algo sobre o Sungha Jung e realmente possui um talento fantástico, tem também o Shane Thomas, o Jay Greenberg que com apenas 12 anos já escreveu cinco sinfonias completas (Leia sobre ele aqui: http://palcoprincipal.sapo.pt/noticias/Noticia/novo_mozart_/000156, está meio desatualizado mas acho que você vai achar no mínimo interessante), acho que os gênios da música estão reencarnando na molecada. Obrigado pelos elogios Igor, só me esforço em manter a mesma qualidade (e confesso que não é fácil) de todos os colunistas que escrevem por aqui.
      Abraços!

  2. Muito obrigado Fabio Almeida pela sua dedicacao no preparo deste post. Este post eh uma verdadeira aula, que contribui muito para com os meus estudos iniciais sobre Kabbalah. Continuado sucesso!

  3. Cara, posso estar viajando mas tem um guitarrista chamado Guthrie Govan que com três anos também já demonstrava conhecimento musical. Hoje em dia ele tem uns quarenta e acredito que seja um dos que melhor estejam contribuindo para o desenvolvimento da guitarra e da música por extensão. Para mim é um gênio ( porém bem longe de mozart ainda, hehe).
    Mas é uma baita “coincidência” essas crianças prodígio se tornarem ótimos musicos não?

  4. Da onde é a ultima imagem do post?
    @FDA – É de uma montagem da ópera realizada na Argentina em 2010, não assisti esta versão e não sei se filmaram, mas me parece bem adequada. Um dos maiores pecados cometidos hoje é que muitas encenações “modernas” ignoram o caráter iniciático da ópera e simplesmente não seguem as especificações deixadas por escrito no libreto, traindo o pensamento de Mozart.
    O cenário, as roupas e até os mínimos detalhes, são de grande importância para a correta interpretação de todo o conteúdo ocultista contido na obra. Confesso que ainda não encontrei uma montagem “filmada” que siga à risca as especificações originais do libreto. Há montagens espetaculares, mas que fogem totalmente do ideal Mozartiano.

  5. Muito bom o texto… já tinha notado algumas coisas do tipo mas por não ser iniciado talvez pegado tudo.
    Quanto as obras de Wagner teria algo nesse sentido tambem?
    @FDA – Já pensei em escrever sobre as óperas de Wagner, mas depois que eu descobri o texto “Mistérios das Grandes Óperas” de Max Heindel achei que, talvez, não tenha nada mais a ser escrito… Penso em fazer um resumo, separando cada ópera em uma série de posts (4) ou fazer uma abordagem kabbalística delas. O texto do Heindel pode ser lido na íntegra AQUI

  6. cara, e quanto à adapatação que o diretor Ingmar Bergman realizou, o que voce acha?
    parabens pelo texto!
    @FDA – A versão do Bergman é muito bacana, e até recomendo pra quem nunca assistiu (é a versão mais fácil de encontrar nas videolocadoras). Mas ainda deixa a desejar quanto as especificações do libreto.

  7. Acabei de descobrir que uma das bandas de metal mais famosas de todos os tempos é ocultista explicitamente !!
    Iron Maiden !
    Leia as letras de Wildest Dream e Revelations deles !
    Que isso estou chocado !
    Sempre escutei falar que eles eram do mal e satanistas ! Hahahahaha Tristes dogmatismos !
    @FDA – Se você gosta de Iron, vai gostar deste post AQUI

  8. Não sabia dessas especificações de figurino e cenário. Mas sinceramente, até as produções mais tematicamente frouxas não conseguem ofuscar o conteúdo iniciático. Pra quem é excepcionalmente ignorante, Sr. Mozart soletrou no libreto =P
    Mas em questão de fidelidade às instruções estéticas, o que você acha da produção de 2003 de David McVicar no Covent Garden?

  9. Oww! Muito bom o texto! Parabens!
    Eu so espero o dia em que vamos ter a honra de um post sobre o Cravo bem Temperado do grande Mestre entre outras maravilhas!

  10. Uma pergunta…
    Como conseguiriamos relacionar a kabbalah com personagens que acabam sofrendo, ou sendo punidos. Como Don Giovanni, da magnifica opera do mesmo mestre?

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