Texto de Chuang Tzu (*)
Hui Tzu disse a Chuang: Tenho uma grande árvore, Que se
chama «mal-cheirosa». Seu tronco tão torto É tão cheio de
nós
Que ninguém pode dele tirar uma só tábua. Os galhos são tão
retorcidos Que você não consegue cortá-los De modo a que
sejam úteis.
Lá está ela à beira da estrada. Carpinteiro nenhum a olhará.
Eis o seu ensinamento — Grande e inútil.
Respondeu-lhe Chuang Tzu:
Já viu o gato do mato
Agachado, espreitando sua presa, —
Pula assim, e assim,
Para cima e para baixo, e por fim
Cai na armadilha.
Mas o iaque, já viu?
Poderoso qual trovão
Mantém-se com sua força.
Grande?
Claro que sim,
Mas não sabe pegar ratos!
Assim, a sua árvore inútil.
Inútil?
Plante-a então no terreno baldio
Sozinha
E caminhe a esmo, em torno dela,
Descanse à sua sombra;
Nenhum machado ou decreto proclamará o seu fim.
Ninguém jamais a abaterá. Inútil?
Que me importa!
(*) Chuang Tzu foi um grande filósofo taoísta do Séc. IV a.C., os textos aqui publicados são fruto de um grande esforço de compilação e meditação de Thomas Merton, um monge católico do Séc. XX d.C. que estudou os textos de Chuang Tzu em várias fontes, nenhuma delas sendo a original, mas traduções da fonte original. Finalmente, coube a Paulo Alceu Lima traduzir a Merton, do inglês para o português, conforme visto no livro “A Via de Chung Tzu” (Ed. Vozes, esgotado)
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Respostas de 12
Esse foi o texto mais assustador que li.
Obrigado
Me lembrou este aqui: “http://www.deldebbio.com.br/2011/11/18/conto-zen-o-quebrador-de-pedras/”. Excelente come sempre… raph?
@raph – Eu estarei postando textos do Chuang Tzu (e outros filósofos taoistas) nesta coluna enquanto o taoismo.org não volta ao ar (eu já avisei o Marcelo)…
Trecho do poema “O Louco”, de Khalil Gibran:
“(…)
Assim me tornei louco.
E encontrei tanto liberdade como segurança em minha loucura: a liberdade da solidão e a segurança de não ser compreendido, pois aquele que nos compreende escraviza alguma coisa em nós.”
Nada no universo é inútil… nós, em nossa ignorancia, que não achamos um uso útil a nós, por falta de sabedoria… Ela ao menos serve para fazer sombra para descanso de quem passa, para ninho de aves e outras coisas que não reparamos…
OBS:Engraçado pensar que para a árvore, sua dita inutilidade foi sua salvação… imagine se vissem nela utilidade como lenha?kkkkk… desculpem, apesar de ser um texto filosófico, não resisti a piada… mesmo em se tratando de filosofia, um pouco de bom humor não faz mal, né?!
@raph – Na verdade isso que disse é menos piada do que uma excelente reflexão. Quer ver uma outra analogia para isso? Na época das invasões bárbaras ao sul da Europa, as cidades que tinham as edificações mais luxuosas eram o alvo preferencial para invasão e saques, enquanto que outras mais humildes, mas que ainda assim tinham alguma espécie de capacidade de defesa, poderiam ser deixadas de lado por não valer a pena o custo-benefício “sangue vs. pilhagem”. O mesmo vale para morar numa casa mais humilde (mas com cerca/alarme) numa rua cheia de casas mais luxuosas: o assaltante vai preferir assaltar o vizinho, e por aí vai… O sábio sabe que é sábio, e exatamente por isso não faz a menor questão de se vangloriar disso – isso, quando muito, somente lhe trará problemas desnecessários. Claro que isso não tem nada a ver com marketing pessoal e gosto pelo dinheiro, etc.
Lembrei de um texto de Osho que li a muito tempo e falava exatamente do mesmo assunto, inclusive com alusões a Lao Tzu:
http://dc363.4shared.com/doc/FJVtjs7C/preview.html
Trata-se de um ensinamento extremamente sutil. A “inutilidade” da árvore se opõe ao utilitarismo raso da sociedade atual – que despreza a arte e a espiritualidade.
Muito bom!
nao entendi nada…
@raph – Veja o comentário do Daniel acima 🙂
Ok , mas apesar da árvore possuir utilidade ela não é um objeto fechado em si mesmo, ou seja , não tem um propósito definido , pois sua utilidade varia de acordo com a pessoa que irá utilizá-la , seu uso está em função antropológica , ela pode ser inútil para uns e útil para outros , então qual o propósito da árvore ? ela foi criada para um número limitado de indivíduos que virão a utilizá-la ? ou seu propósito é servir a quem puder servir ?
Poxa Lucas, eu ia entrar nessa parte do assunto, mas tinha decido fugir da polemica, porque creio que se trata de uma visão muito pessoal e cuja diversidade é válida e na qual acho não ter certo e errado, mas vai minha opinião, que ia omitir, mas que depois de seu comentário, achei melhor jogar ao vento:
O propósito primervo que vejo em qualquer ser é apenas ser… o resto é moldado de acordo com as conveniencias e relações com o meio e os outros seres… O real propósito da árvore é apenas ser árvore… de resto, cada ser, com o conhecimento que tem, usa o “ser” árvore com o propósito que imaginar ou que sua sabedoria permitir: um pássaro a verá como ninho, um lenhador como madeira, um carpinteiro como uma possível cadeira, alguns fungos como comida… mas creio que para a árvore, bastará “ser” simplesmente árvore… Uma pessoa pode ser útil como pai, irmao, filho, professor, escritor, etc, mas o propósito da pessoa é ser essa individualidade momentanea que ela chama de si mesma… particulamente, vejo qualquer manifestação de um ser no plano físico como um fim em si mesmo. O resto será conveniencia moldada por outros seres para integrar esse ser em seu universo particular, afinal, os fios de uma teia precisam se entrelaçar, interagir…
Claro, posso estar profundamente enganado, mas não acho que chamaram a divindade de “Eu Sou”‘ a toa…as coisas simplesmente são…ihhh…acho que fui confuso…sorry
Não foi nada confuso Daniel 🙂 te entendi e desde já agradeço sua resposta , eu só fico em dúvida em relação a essa momentânea individualidade , que faz sentido , mas penso na possibilidade de que talvez o proposito de um ser seja , ao invés de prender-se a sua individualidade , integrar-se ao todo , acho essa determinação de propósito um tanto quanto aleatória, e apesar de eu ser um pouco Nietzschiano , não acredito que as coisas ”dançem aos pés do acaso”, mas de qualquer forma obrigado pela resposta.
Claro, tbm penso conforme vc disse, mas há um paradoxo aqui: o Todo se fragmenta em partes para poder interagir consigo mesmo, dividido e fragmentado em vários “eus”, pois a visão do Todo pelo Todo é puro Ser. Imagine uma esfera infinita, ou o dito círculo infinito. Não pode haver relação alguma com nada, pois tudo já é… agora imagine os vários pontos que compõem um círculo infinito… em qualquer lugar dele pode se criar um ponto, uma individualidade, que irá interagir com os outros, mas todos são em si manifestações do próprio círculo, certo?! A questão é: na descida pela Arvore da Vida, o espírito é como o círculo que se manifesta como um ponto, ou a divindade se manifesta como indivíduo, para poder interagir com os outros pontos do si mesmo… na subida, é o ponto tentando se expandir para retornar ao círculo… costumo dizer que somos apenas um ponto a observar o círculo infinito, mas que deveríamos ser o círculo vendo de um ponto…o círculo vendo a si como círculo não conta aqui pq é apenas Ser puro, algo como o Nirvana. reconciliar esse paradoxo é algo que procuramos…Estamos como o círculo manifestado no ponto, mas nos vemos e agimos como simples pontos, enquanto deveríamos ser o círculo manifestado vendo de um ponto, o Todo vivenciando uma individualidade… Foi bom comentar com vc. Se achar algo diferente, será um prazer ver pelo seu “ponto” de vista… abraços
P E R F E I T O
Nossa…
Plena segunda, depois de varias horas em reuniao com assuntos do mundo creu…
rsrsrs
Excelente texto.